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Reportagem de aluna da UBI traz técnicos à Covilhã
Brasil descoberto na Sede do PCP

POR IVONE FERREIRA
        E MARIANA RAFAEL


Uma reportagem de uma aluna da UBI, feita a título académico, descobriu o Brasil escondido na Casa das Morgadas, actual sede do PCP, na Covilhã. A entrevista a Jorge Patrão, presidente da Região de Turismo da Serra da Estrela, valeu a promessa da recuperação das pinturas dos finais do século XVI, até agora esquecidas por parte das autoridades competentes. Agora, passado um mês, chega a resposta ao pedido. Os técnicos do Instituto Português de Conservação e Restauro vêm ainda este mês observar os painéis.

No número 48 da Rua Alexandre Herculano, existe um tesouro. Painéis pintados em madeira, atribuídos a um autor anónimo dos finais do século XVI/ princípios do século XVII, representam os quatro continentes. Esta obra, exemplar quase único no nosso País, encontra-se em estado de acentuada degradação e necessita, urgentemente, de obras de restauro.
Vista a braços com a realização de uma reportagem para uma das cadeiras do 3 º ano da licenciatura de Ciências da Comunicação, uma aluna do curso escolheu, como tema para este trabalho, a recuperação das pinturas. A entrevista a Jorge Patrão, presidente da RTSE fê-lo tomar consciência da importância destes painéis, bem como a necessidade de uma intervenção urgente.

Um tesouro na Casa das Morgadas

Bem perto de nós, numa rua estreita, um mundo desconhecido espera-nos. Um palacete quinhentista, classificado como Imóvel de Valor Concelhio, aguarda a nossa visita. Por detrás de uma porta fechada, encontra-se uma das obras mais significativas do património histórico da Covilhã.
Numa sala grande, um tecto majestoso, em forma de caixotão, acolhe-nos. No centro vêem-se quatro painéis pintados em madeira. Representados neles, figuras femininas alusivas a quatro continentes: Europa, Ásia, África e América. Junto de cada uma delas, sinais de gente e das suas actividades.
Os oito painéis em volta desenvolvem os temas principais. Árvores, rios, aves raras, transportam-nos para paisagens exóticas. Um mundo conhecido mistura-se com os novo espaços acabados de descobrir.
Num dos painéis acerca do Brasil, vê-se uma caravela ancorada num "porto seguro". No painel seguinte, um papagaio, empoleirado numa árvore, parece dar-nos as boas vindas. Perdido no arvoredo, um castelo lembra o encontro de civilizações que os descobrimentos proporcionaram. Apesar dos maus tratos sofridos, estas pinturas, escurecidas pelo tempo, são um convite ao sonho e à imaginação.
Para Elisa Pinheiro, directora do Museu de Lanifícios da Universidade da Beira Interior, os painéis da Casa das Morgadas são um exemplar raro na pintura da época. "Estas pinturas abordam um tema profano, raro no universo religioso daqueles tempos. Os elementos da vida vegetal e animal dos novos continentes, mostram uma abertura ao humanismo ".
Salienta esta historiadora, membro do Centro de Estudos e Protecção do Património : "O tema das descobertas, a exuberância dos elementos da flora e da fauna, os papagaios, transmitem-nos o conhecimento das novas realidades". No que se refere ao estilo, "a pintura contém traços de naturalismo e, sobretudo, marcas simbólicas". Já quanto à forma, Elisa Pinheiro reconhece: "A organização do espaço é interessante. Os quatro painéis dão o mote e são o fecho. Depois, há o desenvolvimento nos painéis laterais".

Caminhos para a recuperação

São precisamente estes os painéis que se encontram em pior estado. Infiltrações de água e um bem intencionado, mas desastrado, envernizamento com óleo e linhaça danificaram as pinturas.
No entanto, as técnicas já existentes, tais como a utilização de raios X, permitem tornar o restauro possível.
Na passada quarta-feira, o representante dos actuais proprietários é informado da provável chegada, ainda durante o mês de Junho, de dois técnicos do Instituto Português de Conservação e Restauro para analisarem o estado das pinturas e decidirem o caminho a seguir para a sua recuperação.
Armando Morais, responsável pela Comissão Concelhia da Covilhã do PCP, declara: "Desde 1975, data da sua instalação neste edifício, o Partido Comunista preocupa-se com o estado das pinturas. O prédio é muito antigo. O telhado era de telha portuguesa, chamada de "canudo", e chovia lá dentro. Fizeram-se várias diligências para resolver o problema. Sabemos que o prédio é de interesse concelhio. Conhecemos a riqueza do seu património e o interesse de o preservar. Por diversas vezes pedimos apoio à Câmara Municipal. Esta respondeu serem as obras da responsabilidade do senhorio". E sublinha o representante do PCP : "Alguns anos depois fizemos obras. Foi colocado um telhado novo e nunca mais choveu sobre as pinturas. Aguardamos, agora, que os painéis sejam reparados para abrir a sala ao público, comprometendo-nos a receber os visitantes condignamente."
Os visitantes que já tiveram oportunidade de observar as pinturas ficam encantados com a sua beleza: "É uma obra demasiado bela para estar neste estado. É preciso fazer alguma coisa, rapidamente, para as recuperar. Saio desta sala mais enriquecida. Sinto vontade de cá voltar e de trazer os amigos" desabafa Purificação Pacheco de 41 anos e funcionária pública.
É a prova de que o património histórico da Covilhã é mais vasto e significativo do que se pensa. Com esta viagem pelo mundo exótico das pinturas da Casa das Morgadas, fica o convite feito. Os tesouros da Covilhã estão à nossa espera. Partamos à sua descoberta.

Recuperação este ano

Neste ano 2000, as comemorações do achamento do Brasil fazem correr muita tinta. Não fora o trabalho realizado por esta aluna da UBI, o Brasil escondido na Covilhã continuaria por descobrir. Não faziam falta caravelas nem marinheiros, apenas os técnicos do Instituto Português de Conservação e Restauro. Só eles podiam salvar uma das jóias do património histórico da Covilhã.
Em Maio último, Jorge Patrão declarou : "Temos como objectivo conseguir a recuperação das pinturas ainda este ano" , prometendo contactar o IPPAR, o Ministério da Cultura e todas as entidades que for necessário. E acrescentou que "as obras incluem, também, o arranjo da sala onde se encontram os painéis, a sua correcta iluminação. Vamos também elaborar a informação necessária para fornecer aos visitantes. Tudo isto porque pensamos ser importante a inclusão do turismo cultural na Rota dos Descobrimentos".
O telefonema feito pelo presidente da RTSE, na passada quarta-feira, ao representante do PCP pode indicar a realização, em breve, da promessa feita.

 

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