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Opinião       



 

 
José Geraldes*
 

Salvemos a língua portuguesa

Já se sabia que os estudantes vinham mal preparados do ensino secundário para o superior. Vários estudos comprovaram, sem ambiguidades, as anomalias do sistema. E até se escreveu que o ensino secundário era um verdadeiro caos.
Muitas causas, de vária ordem, contribuiram para que o ensino secundário se degradasse. Causas que ainda não foram eliminadas.
O relatório da CAE (Comissão de Avaliação Externa), vindo a público, na semana passada, sobre as licenciaturas de Psicologia, Ciências da Educação, Línguas e Literaturas Modernas, Línguas e Literaturas Clássicas, Linguística e Humanidades, em várias universidades, tiram todas as dúvidas a quem porventura, ainda acreditasse no bom funcionamento do secundário. A CAE não faz análises a brincar nem por mera diversão. Os estudos são exaustivos. Só quem esteja de má intenção, não dá crédito aos seus relatórios de credibilidade assegurada.
O caso mais dramático estudado diz respeito às Humanidades. Segundo a CAE, os estudantes de Línguas, Literaturas e Linguística confessam não terem bases de gramática "suficientes". A formação ao nível da língua portuguesa, é reconhecida "deficiente".
A CAE enfatiza que a preparação dos alunos "não é suficiente no domínio do léxico, da sintaxe e da morfologia". E nem "no que respeita aos mecanismos e dispositivos da textualização".
Tal diagnóstico explica os erros de escrita que vemos em jornais e revistas, em relatórios de licenciados e até doutorados, em comunicações de juízes e magistrados de vários graus, advogados e médicos. Isto em pessoas de cursos superiores. E que dizer de possuidores de diplomas intermédios? Uma calamidade! E a observação está longe de ser demagógica.
A experiência mostra que, para além das matemáticas, no ensino superior, as normas da escrita, desde a construção da frase à pontuação, passando pela concordância e pela ortografia constituem um sem-número de dificuldades.
Os dados publicados sobre a iliteracia, nas várias classes sociais, em Portugal, são eloquentes quanto à simples interpretação de um formulário administrativo. E em relação ao sentido das mensagens dos textos mesmo de índole jornalística. A prática da interpretação dos textos revela-se altamente negativa. Vai ser necessária uma geração para alterar a situação actual.
Um elemento referido pela CAE incide sobre a cultura geral dos estudantes. São apontadas carências nesta área. Mas quem contacta diariamente com o problema, verifica de imediato, que se trata de uma deficiência estrutural e catastrófica. E que, por razões múltiplas, levará tempo a ser corrigida.
Quantos alunos lêem, na prática, os livros recomendados pelos docentes e que constam da bibliografia fundamental? E quantos passam ao menos os olhos pelas fotocópias de textos básicos?
A CAE, na conclusão final, admite que o facto de os alunos estarem mal preparados deriva de "um problema nacional que atravessa todo o ensino". "E que se trata de um problema sério que não deve ser escamoteado" e merecer a "atenção do governo".
Que soluções para os males apontados? A CAE preconiza a criação de "disciplinas propedêuticas", no primeiro ano das universidades. Objectivo: orientar os alunos na organização do trabalho intelectual. E que os docentes do ensino superior incutam hábitos de leitura.
Mas não acreditamos que não haja docentes a incitar a leitura aos alunos. Os hábitos do secundário é que são tão deficientes que os estudantes perderam o gosto da leitura: e sem gosto pela leitura, não há investigação que valha.
O latim é recomendado, como disciplina obrigatória no secundário. Quem sabe latim, sabe português. A língua portuguesa é originária do latim. Urbano Tavares Rodrigues lá tinha as suas razões quando disse que os melhores alunos da Faculdade de Letras, eram ex-seminaristas ou padres. A razão é óbvia: os anos do latim nos seminários. No mundo da globalização, a língua portuguesa surge como identificação do povo que somos. O aprofundamento do seu estudo é preparar o futuro do País. A sua perenidade e a diversidade que representam as nossas tradições e as nossas gentes.

*NC / Urbi et Orbi

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