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Editorial        



 
António Fidalgo

O infeliz mercado dos cursos universitários

A primeira fase de colocação dos candidatos ao ensino superior, publicada em 21 de Setembro, indica quais os cursos das Universidades e Politécnicos públicos, os respectivos números de vagas, quantos os alunos colocados e a nota do último colocado. Aí se vê quais os cursos mais cobiçados (as medicinas, claro) e os menos cobiçados (em regra geral, as engenharias), e de entre os cursos idênticos quais os mais e os menos procurados. E é óbvio que aqui as escolas do litoral, sobretudo as dos grandes centros Lisboa e Porto, levam a palma às universidades do interior. Os estudantes preferem as cidades para fazerem vida universitária.
Que há um desfasamento na procura e na oferta é inquestionável. Onde há procura (medicina), não há oferta, e onde há oferta (engenharias) não há procura. Será que as leis do mercado não funcionam? O que é estranho, à primeira vista, é que, dependendo o financiamento das universidades do número de alunos, estas não ajustem a oferta à procura, isto é, criem os cursos procurados ou aumentem o respectivo número de vagas e, simultaneamente, diminuam as vagas nos cursos sem procura. Numa situação perfeita de mercado seria isso que deveria acontecer. O problema é que, por mais que as universidades, queiram adaptar-se aos desejos dos alunos, não é possível aqui aplicar sem mais as leis do mercado.
E não há um mercado livre porque há desde logo uma entidade que põe e dispõe por cima das universidades e dos candidatos e condiciona o mercado à partida e à chegada: O Estado ou, mais concretamente, o Ministério da Educação. É o Estado que cria, ou não, Faculdades de Medicina, é o Estado que permite as universidades criarem, ou não, certas licenciaturas consoante o interesse da nação, é o Estado que é o responsável pela formação escolar dos candidados aos ensino superior e é o Estado o empregador de uma boa fatia dos licenciados, sejam médicos, juízes ou professores. Enfim, é o Estado que paga e quem paga manda. Ora é aqui que entram as contradições, em nada conformes ao espírito do mercado. O Estado fomenta os cursos de engenharia no ensino superior, mas é o Estado o primeiro responsável pela deficientíssima formação em física e matemática dos alunos nos ensinos básico e secundário. E por fim o Estado admite como funcionários licenciados apenas pelo critério das classificações finais, sem ter em atenção a qualidade dos cursos tirados. Toda a gente sabe que um estudante de Letras na Universidade de Coimbra nunca obterá as classificações que obteria em certas Escolas Superiores de Educação e que, portanto, nunca poderá entrar em pé de igualdade com os alunos destas nos concursos nacionais para professores.
Há certamente tentativas das escolas para ajustarem a oferta à procura, mas isso é de algum modo um trabalho de Sísifo. Um corpo docente qualificado demora dezenas de anos a formar e as modas dos cursos mudam muito mais rapidamente.
O financiamento actual das universidades obriga-as a entrar um mercado que é por demais imperfeito e para o qual não estão preparadas, como se comprova pelo desfasamento entre oferta e procura. Não pode haver mercado quando quem procura não compra verdadeiramente. Pagassem os alunos os seus estudos e tudo seria muito diferente.
Além do mais, outras questões se abrem neste campo e que abordaremos em próximos artigos.

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