Jorge Bacelar

 

 

 

 


Teoria da Conspiração

Estas polémicas entre os verdadeiros&únicos&legítimos amigos da Mui Nobre Covillan e os outros, os órriveis&perversos inimigos da dita já começam a fazer parte integrante do folclore e do colorido da paróquia! Meus senhores, se ainda não repararam, o mundo já não termina no muro do vosso quintal nem, para os de vistas mais largas, deixou de terminar no alto da serra da estrela: ampliou-se ligeiramente, graças às estradas e aos vários meios de comunicação que foram entrando nas nossas vidinhas. É verdade, mesmo esse télélé que trazeis preso na cintura das calças tem responsabilidades na transformação das quintinhas, dos feudos, onde cada um era rei(zinho) e senhor. A coisa democratizou-se. E veio gente de fora, alguns doidos - incluo-me neles - decidiram sair da Cidade Grande e viver e trabalhar aqui, na paisagem.
Antes não era assim: respeitavam-se as Autoridades, o Clero, os Senhores Industriais. Agora, depois da pouca-vergonha da abrilada, e então, a partir dos anos 80, da instalação e expansão da Universidade aqui na Covilhã, pfuuuu! é que deixou mesmo de haver respeito. Esses doutorecos de meia-tigela a dar palpites sobre a Sagrada e Inefável Terra Mater! Nem sequer são de cá (ou se são, passaram tempo demais em Lisboa ou em Coimbra, e voltaram cheios de veneno subversivo, com a mania que sabem tudo, que Lá é que se fazem coisas, Lá é que há projectos e progresso) e vêm escrever nos jornais contra nós, esses agentes quinta-colunistas da Guarda e de Castelo Branco. O sonho deles é esvaziar esta terra de genuínos Filhos-da-Covilhã, e meter os patronos deles nos lugares importantes. Mas estamos alerta! Se pensam que podem vir para cá ditar leis, bem podem fazer a mala e voltar para onde vieram! A reacção não passará!
A crítica ao que se faz (e ao que não se faz) não é necessariamente perversa e pretensiosa, senhoritos. Muitas vezes é mazinha, venenosa até, mas pode constituir o estímulo ('chicotada psicológica' em futebolês) que faz os autarcas e demais responsáveis pelo andamento das coisas da terra mexer o rabo e - muito importante! - fazer os subalternos largar o boletim do totoloto, o record, a maria e o tricot, e fazê-los a eles mexer o rabo. E a polémica também é produtiva: como já escrevi noutra ocasião, é estimulante e pode mesmo constituir-se como um salutar exercício de ginástica cerebral. O que é necessário é apresentar argumentos e contra-argumentos válidos e fundamentados, e evitar cair na vulgar trica de comadres, em que o menor gesto ou esgar é interpretado como um óbvio sinal da hedionda conspiração em curso. Alguém se levantou e saiu da assembleia municipal? Tá-se mêm'aver que está comprado pelos de Castelo Branco! Aquele migrante escreve a defender que a Universidade é importante para a Covilhã? Que a leve para a terra dele, que nós ficamos bem com os lanifícios, muitóbrigado!
Senhoritos, senhoritos! Que é isto? Polémica? Melhor do que isso temos no BigBrother com um pobre de espírito a conversar com as galinhas... ou aqueloutro tontinho a denunciar a influência dos lobbies da droga, dos gays e da comunicação social na gestão do país... Por favor, não se arranja melhor do que isso? Enquanto se mantiver o horizonte emparedado no quintal privativo, continuaremos a estar 'nas berças', no 'interior desertificado e esquecido'; enquanto estes bairrismos ridículos, estas manifestações de paranóia (um dia destes, somos invadidos...) se mantiverem, nunca chegaremos a lado nenhum. Mas talvez seja esse, no fundo, o vosso secreto desejo, senhoritos. Que tudo fique na mesma.

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