MOSTACHOS

Edmundo Cordeiro

Como dizia Jorge de Sena, num PAÍS DE MOSTACHOS, ser mostacho e meio? Não, que cada um já é dois ou mais. Todo o MOSTACHO gosta de meter a ponta dele onde não é chamado. A que se deve isso? À família! Como o mostacho só percebe o que a inteligência dele compreende, acha que, tu cá, tu lá, tudo cabe na fórmula da FAMILIARIZAÇÃO, não dispensando pois nunca o CÁ PARA MIM, TÁS A VER, É ASSIM… E vai logo uma DICA à CONSIDERAÇÃO dos mostachos, cheia de adjectivos, que é forma própria de BIGODES exercerem "o seu pensamento".

Isto define o BIGODE ESPIRITUAL.

Mas também o outro, firme como um piassaba ABARROADO, continua sendo o elemento principal da FLORA e da FAUNA portuguesas.

Os espanhóis, por exemplo, há muito que deitaram o foleiro LANUDO ao lixo, e a partir daí a sua LIGA PROFISSIONAL DE FUTEBOL tornou-se no que todos sabemos, mantendo eles apesar de tudo o símbolo, impecavelmente ornado, no CARRILHO do seu primeiro-ministro.

Ora, porquê - porquê? Porque parece ser a BIGODEIRA imune ao tempo? Há muito que venho defendendo a necessidade de uma fenomenologia do bigode aleatório e mal cuidado. Muito do RÂNCIDO e, mesmo assim, do PREZ e da "VITALIDADE" da "sociedade" portuguesa se perceberia por aí.

Mantém-se pois intacto o sentido da expressão DAR UM BIGODE. Não é fácil resistir ao que ainda é umas vezes PRECIOSO e outras INDISPENSÁVEL. É que pode dar um bigode não só quem efectivamente tem o COLEIRO ao alcance do lábio superior, mas também qualquer um que, deitando mão ao saco da IDENTIDADE NACIONAL, de SÃO PEDRO DE RIO SECO a ODIÁXERE, de SOUTELINHO DA RAIA à PRAIA DAS MAÇÃS, de MARANHOS DA BEIRA a ATOUGUIA DA BALEIA, não tem necessidade de BIGODEAR muito para ACOFIAR esse verdadeiro DAIMON lusitano.

Mas enfim… Pior que isto, há toda uma série de mostachos menos materialmente piassaba, quer dizer, verdadeiras ALMAS DE MOSTACHO. Não tenhamos dúvidas, tratam-se de mostachos com verdadeira influência sobre toda a flora e fauna de mostachos mais visíveis. Criaturas destas reconhecem-se normalmente pela forma lapidar como expelem os seus dotes, seja por intermédio da descrição dos seus prazeres - EU CÁ SEI VIVER A VIDA! Ou EU CÁ "APRECIO" O QUE É BOM, BELO, MODERNO, etc.! -, seja pelo exercício que fazem do seu ódio particular - esse ódio inerente ao ASCETA e ao moralista do fétiche e do ressentimento particulares, sempre particulares, tão bem descritos por Nietzsche -, e não por serem efectivamente portadoras do BUÇO. Já ESPINOSA dizia que não devemos ter PIEDADE para com estes mostachos.

(Convidados: Jorge de Sena, Nietzsche e Espinosa.)

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