Por Rita Lopes
NC/Urbi et Orbi

João Ramos, administrador do Balneário Termal, está confiante no futuro da infra-estrutura

A terapia através da água voltou a ser possível em Manteigas. Após cerca de dois anos de encerramento ao público, o Balneário Termal do INATEL - Instituto Nacional para Aproveitamento dos Tempos Livres de Trabalhadores, reabriu as suas portas a quem procura substituir os medicamentos químicos pela mais natural fonte de vida: a água.
Situadas na freguesia de São Pedro, vila e concelho de Manteigas, distrito da Guarda, as centenárias Termas Caldas e Fonte Santa estão em pleno funcionamento desde o dia 21 de Maio. "Uma paragem obrigatória", diz João Ramos, administrador da instância, "para a realização de uma remodelação de fundo em todo o complexo e para a instalação de novos e modernos equipamentos".
A funcionar sob a tutela do INATEL desde 1991, o complexo termal, que, segundo o administrador, tem tido uma ocupação a cem por cento, começou a acusar sintomas de velhice. Com equipamentos já ultrapassados e inaptos para responder às exigências das novas tecnologias e mentalidades, a necessidade de inovação era premente. Convicto de que foi uma pausa necessária, João Ramos, responsável pelo espaço há cerca de dois anos, relembra o cenário: "Toda a estrutura estava a ganhar uma imagem de hospital que era obrigatório retirar. É o que estamos a procurar fazer, também para evitar contaminações e atrair população, sobretudo a mais jovem".
Assim, os trabalhos, cujo investimento ascendeu a 100 mil contos, incidiram, sobretudo, na remodelação de toda a rede de adução e acumulação de águas e na aquisição de equipamentos. Mas, "a tubagem foi o grande investimento", sublinha Ramos, desde a captação à acumulação e distribuição. "Havia um depósito muito antigo e degradado que podia levar à contaminação", recorda. "Por isso, acrescenta, como são águas por si agressivas, optou-se por depósitos em inox, que têm dado provas de serem um bom método".
Além dos três depósitos que vieram substituir os antigos, construídos em cimento, foram, ainda, modificados os tubos que fazem a distribuição do líquido. "Alterou-se toda a rede de adução. Ou seja, o percurso desde os furos aos balneários", diz o administrador. E acrescenta: "Era necessário fazer chegar a água correcta e genuinamente aos terminais das diferentes valências, sem ter que passar por contactos com agentes externos".

Equipamentos e espaços modernos

Fixado na ideia de que as termas não são uma unidade hospitalar, João Ramos pretende continuar o investimento noutros sectores. Equipamentos técnicos avançados e salas mais arejadas e "simpáticas" são as próximas prioridades. "Mesmo com o balneário em funcionamento podemos fazer algumas obras que ainda escasseiam. Vamos continuar com a remodelação sobretudo na substituição das banheiras, das cabinas e das piscinas", afirma, convicto, o responsável.
Para tal, já foram iniciadas algumas alterações nesses campos. A sala das vias respiratórias, considerada como Sala de ORL (Otorrinolaringologia) sofreu a maior intervenção. Todos os equipamentos foram adquiridos, uma vez que "é uma sala sensível e muito vulnerável a contaminações". "Era um espaço muito envelhecido que tornava o tratamento menosprezado", relembra Ramos.
Duas banheiras de hidromassagem normal, no valor aproximado de três mil contos cada, e uma computadorizada vieram, ainda, substituir as que já contavam alguns anos. "Agora", diz o administrador, "temos quatro banheiras de hidromassagem, nove normais e uma que permite localizar os tratamentos". Outra novidade são as casas de banho para deficientes motores. "Não tínhamos nenhuma para este tipo de utentes e mesmo as outras eram reduzidas no espaço e insuficientes no número". O ginásio, a sauna e a fisioterapia foram outras áreas intervencionadas. A piscina é, no momento, o único equipamento que não está à disposição do público, mas João Ramos garante a abertura até ao final do ano.

Indicações respiratórias e reumáticas

Considerada quimicamente como mineral, natural, sulfúrea, bicarbonatada, sódica e fluoretada, a água, que "nasce" à temperatura de 48 graus centígrados, é utilizada, medicinalmente, para três indicações terapêuticas: aparelho respiratório, reumáticas e musculo-esqueléticas. Várias são as salas e variados, também, os tratamentos que cada utente pode fazer, consoante a sua patologia e indicação médica.
Assim, na Sala de ORL são tratadas as patologias relacionadas com o aparelho respiratório superior: sinusites, rinites, laringites, traquítes, faringites e amigdalites recidivantes. O espaço permite a realização de inalações (nasal e bocal), irrigações nasais, pulverizações e gargejos. Na parte da pneumologia, o tratamento inside, sobretudo, na asma brônquica, bronquite crónica, enfisema e bronquiectasias. Para tal, recorre-se aos aerossóis simples, inalações bocais, irrigações, duches e fisioterapia.
A parte reumática e músculo-esquelética é, também, uma terapia muito aconselhada pelos médicos aos utentes do Balneário Termal de Manteigas. Espodilodiscartrose vertebral, artroses (mãos e pés), coxartroses, gomartroses, nevralgias e sequelas de traumatismos e de cirurgias ortopédicas são algumas das patologias que encontram tratamento na instância serrana. Banho de imersão, duche (jacto, leque e escocês), banho de vapor, de Vichy e de hidromassagem são os mais utilizados para esta indicação terapêutica. Contudo, podem ser acompanhados por tratamentos complementares: massagem, ginástica vertebral, tracção cervical, calor húmido, ultra-sons, infravermelhos, correntes galvânicas e ondas curtas.
Mas, a gama de terapias não acaba aqui. Relacionadas com a crenoterapia, elas variam entre o aerossol termal e ultra-sónico, banho de imersão, bertholec à coluna, bolha de ar, duche de agulheta, escocês, subaquático e de Vichy, hidrocolator, hidromassagem, nebulização colectiva, piscina e pulverização. No que respeita à fisioterapia e ginásio, os tratamentos incidem na electroterapia, estufa, ginásio e massagens geral e parcial.
O tempo de cura e o preço de cada processo também varia consoante a patologia. No mínimo 14 e no máximo 20 sessões são o indicado pelos profissionais da saúde para obter resultados. Embora o tempo de cura não seja previsível, João Ramos revela que conhece "casos de pessoas que vêm quase sem caminhar, fazem as 14 sessões e saem daqui a andar". "E não é milagre, é o próprio tratamento e características da água", acrescenta. Quanto ao preço, o administrador adianta que varia entre os 30 e os 50 mil escudos. Todavia, para quem desejar fazer apenas uma sessão ou um tipo de tratamento, ficam alguns exemplos: aerossol termal, 400 escudos, banho de imersão, 500; bolha de ar, 550; hidromassagem, 850 e duche de Vichy, mil escudos.






  Autocarros vão quebrar isolamento

Vindas em grupo ou individualmente de todos os pontos do País, as pessoas que se deslocam ao Balneário Termal do INATEL de Manteigas procuram mais que um tratamento físico. A paisagem, o silêncio e a simpatia dos funcionários da casa e dos habitantes da vila, são outros aspectos que convidam os utentes para uns dias de descanso na encosta da Serra da Estrela.
Embora, segundo João Ramos, a maioria ds visitantes sejam da região, os programas de Saúde e Termalismo Sénior organizados pelo INATEL, também trazem muita gente. "Há uma interligação entre as delegações nacionais que encaminham os grupos para todas as partes do País". Contudo, a escolha das termas para tratamento ou prevenção também é feita por pessoas que individualmente, e depois de aconselhamento médico, se deslocam ao balneário para fazerem sessões terapêuticas normais ou especiais. Este factor é determinado pelos profissionais de saúde que, diariamente, das 8 às 10 horas, se encontram na instância para consultar e acompanhar os utentes. António Jorge Santos Silva, director clínico, explica que "as pessoas quando chegam trazem um relatório do seu médico de família que deve indicar qual a doença, cuidados a ter e contra-indicações". "Depois", continua, "são assistidos por mim ou pelo meu colega. Fazemos o diagnóstico e indicamos os tipos de terapias e o número de sessões".
Assim, para quem procura substituir os medicamentos pela água minero-medicinal, as técnicas são aplicadas em função da patologia. "Indicamos o número de banhos, massagens e duches, de acordo com o estado pessoal. Ninguém pode começar sem nos consultar", refere o médico. Uma necessidade que se prende com eventuais alerações de comportamento inerentes ao próprio tratamento.

Prevenção atrai juventude

A ideia de que as termas são uma unidade de cura quase hospitalar está, segundo os técnicos da instância, a sair de uso. "As praias estão a dar lugar a estes espaços que, mais que curativos, são preventivos e relaxantes", diz Santos Silva. Daí, o facto de haver uma grande procura por parte dos jovens que, segundo João Ramos, "vêm individualmente e experimentam um pouco de todos os tratamentos".
Contudo, apesar da procura juvenil, a maior parte dos utentes continuam a ser os idosos que se deslocam em grupo e ficam hospedados no Centro de Férias do INATEL. Situado no mesmo complexo, o edifício oferece cerca de 65 quartos aos sócios do instituto, viagens culturais à região e noites etnográficas, incluidas nos 15 dias de estadia. Para tal, Conceição Pinto, animadora cultural do INATEL, e responsável pela parte lúdica, dispõe de algumas regras. "Tenho que estar com o grupo sempre que eles precisarem e organizar várias actividades para confraternizarem e ficarem a conhecer um pouco da região". Noites de casino, bailes e cantares são algumas actividades que incluem a programa do INATEL, válidos para todos os centros de férias e hotéis.
Os utentes do complexo de Manteigas mostram-se satisfeitos com o serviço e com o acolhimento. Mário Ferreira, de Lisboa, diz que já não é a primeira vez que vem para esta instância termal, recomendado pelo seu médico. "Foi o otorrino que me aconselhou a vir para estas ou para as de Entre-os-Rios. Mas, como aprecio muito o contacto com a natureza e com o ar puro da serra, decido-me por estas".
António dos Reis, veio de mais perto, também enviado pelo seu médico de família. De Pero Viseu, concelho do Fundão, trouxe um joelho "cheio de reumático", com a esperança de que a cura se encontra nas águas de Manteigas. "Não escolhi o local por ser mais perto da minha terra, mas porque dizem que estas termas são melhores, tanto o médico como o povo".
Por seu turno, Maria Lucília Lobo, de Aveiro, que veio por iniciativa própria, sublinha "o encanto da paisagem e a simpatia do pessoal", mas aponta alguns aspectos negativos. "Sinto-me um bocado isolada, não há transportes daqui para a vila, se quiser comprar alguma coisa", afirma, ao mesmo tempo que aponta o dedo à Câmara Municipal. "Acho que a autarquia devia disponibilizar algum meio de nos deslocarmos. Devia haver mais cuidado com o turismo", diz, entristecida.
A ideia já tinha sido posta em causa numa reunião do executivo. Segundo António Fraga, vereador, "já trouxemos para a mesa essa situação, mas como as termas estiveram fechadas, passou-se e agora é a altura ideal para a pormos em prática". José Quaresma Pinheiro, vice-presidente da autarquia, afina pelo mesmo diapasão e dá garantias da ligação "dentro de pouco tempo". "Vamos verificar, já na próxima semana, a hipótese de utilizar um dos autocarros da Câmara, ou contratar um da Rodoviária". Duas idas para as Termas e duas vindas para a vila é o "ideal", diz o autarca, que considera "um bem para a terra e para a mobilização das nossas gentes".




  "Terapia pela água é um sector promissor"

Inseridas na Região Hidrotermal de Montanha, dada a situação geográfica na maior serra e vale galciar portugueses, as Caldas e Fonte Santa dispõem de características próprias que permitem a sua utilização a vários níveis. Captado em três furos a uma profunidade aproximada de 60 metros, o aquífero é significativamente profundo e instalado numa das maiores falhas do País que abrange Unhais da Serra, Manteigas e Vilariça. A descrição é de Pissarra Cavaleiro, director técnico das Termas e docente do departamento de Engenharia Civil da Universidade da Beira Interior (UBI).
Nascida por artezianismo, ou seja, pela sua própria força, a água, que é captada à temperatura de 48 graus centígrados, "tem características excelentes para fins minero-medicinais, mas também para efeitos geotérmicos", diz o responsável. Uma mais valia daquele aquífero é o facto de não necessitar de bombas submersíveis para ser capatado, como a maioria das termas. "É uma qualidade excelente, porque evita consumos de energia e contacto com corpos estranhos nos furos", explica Cavaleiro.
A avaliação é feita depois de um enorme trabalho de análise e estudo do recurso e suas características. Para tal, contribuem, além de técnicos da UBI, algumas instituições públicas credenciadas. As análises fisico-químicas são asseguradas pelo Instituto Superior Técnico de Lisboa, as bactereológicas são feitas pela Administração Regional de Saúde da Guarda e as chamadas específicas são realizadas em Coimbra. A periodicidade da análise é semanal, durante o período de funcionamento, e mensal nos períodos considerados mortos.

Técnico a tempo inteiro
O acompanhamento fisico-químico não é suficiente para uma instância termal que, por exemplo, em 1998, último ano aberta ao público, recebeu perto de duas mil pessoas. A presença quase diária do director técnico é "imprescindível para uma gestão cuidada da água", diz Pissarra Cavaleiro. Zelar pelo recurso, orientando-o para uma gestão racional, para evitar a exploração excessiva de caudais, avaliar os parâmetros físicos e químicos da água (acidez, condutividade e temperatura) e estudar as suas mais valias são algumas das funções do responsável.
Mas as suas responsabilidades vão mais longe. A definição dos perímetros de protecção e dos planos de exploração do recurso também são da sua competência. "Está estipulado por lei que um aquífero tem zonas de protecção imediata, intermédia e afastada, determinadas em função das características geológicas e hidrogeológicas locais", explica. "A de Manteigas é bastante grande e há regras que têm que ser cumpridas para evitar eventuais contaminações". Pissarra Cavaleiro está satisfeito com o facto de estas termas "serem das únicas do País que têm o perímetro de protecção definido e aprovado em Diário da República". Quanto aos planos de exploração, "compete-me definir quais os caudais mais adequados para o bom funcionamento do recurso hidrogeológico, de forma a evitar plumas de contaminação na infra-estrutura que é uma mais valia para Manteigas". "Com estas características", diz Cavaleiro, "são termas que têm a mão de Deus para aparecerem num sítios destes".
Dadas as "excelentes características" do recurso, os planos de exploração vão-se alargando à medida que o homem dá asas à imaginação. Além da actual utilização minero-medicinal e terapêutica, o director técnico adianta dois projectos que estão na manga para exploração do aquífero. O primeiro é a construção de uma piscina ao ar livre com água mineral, à semelhança de outros paises. O segundo é o aproveitamento em termos de geotermia, nomeadamente para aquecimento central do próprio balneário e do Centro de Férias, que se encontra no mesmo complexo. Este projecto, que ainda não está em curso, junta-se a uma carta de vulnerabilidade do aquífero que está, também, a ser feito pelo técnico. "Estamos empenhados neste sector das termas sulfúreas, porque é muito promissor", afirma Pissarra Cavaleiro. E continua: "A praia já teve a sua moda. Hoje temos técnicas que nos permitem salvaguardar as capacidades genuínas da água e evitar contaminações artificiais nestes espaços".