Tiago Sequeira

Engenheiros precisam-se


Numa altura em que a economia portuguesa cresce cada vez menos e se atrasa face aos países mais ricos da União Europeia, contrariando o que seria natural dado o seu estado de atraso tecnológico em relação aos líderes europeus e mundiais, é necessário (re)pensar o modelo de desenvolvimento português. De todas as razões que podem estar por detrás do abrandamento da economia portuguesa, apresento aqui três.

A primeira prende-se com o tão falado despesismo governamental. De facto, a Economia ensina-nos que os agentes económicos (famílias e empresas) retraem (ou pelo menos não alteram) o consumo e o investimento quando se apercebem que o Estado está a aumentar muito as suas despesas correntes. Isto acontece porque agentes mais ou menos racionais sabem que mais despesa corrente do governo hoje se traduz em mais impostos amanhã. Precavendo-se contra este aumento, o consumo e o investimento privados decrescem, fazendo baixar a taxa de crescimento da economia: é como estar a lançar recursos ao mar!

A segunda razão é mais estrutural e prende-se com algumas opções feitas por Portugal em meados da década de 80, quando a integração europeia beneficiou o País com os chamados fundos estruturais, e mantidas até ao presente. Enquanto outros países (Irlanda e países nórdicos) tão periféricos como Portugal se preocupavam em incentivar o investimento directo estrangeiro em altas tecnologias, apostando na formação de quadros técnicos orientados para a produção de bens intensivos em tecnologia, Portugal mantinha uma preocupação dominante na construção de estradas e outras obras públicas, incentivando o desenvolvimento de um sector de construção civil com enorme peso na produção - apenas 3% das exportações portuguesas eram, em 1992, produtos de alta tecnologia (a taxa mais baixa da Europa) contra 28% da Irlanda (a taxa mais elevada). A evidência empírica sugere que é a produção de bens transaccionáveis que mais contribui para o aumento da produtividade dos factores produtivos e portanto para o crescimento económico. A teoria do crescimento económico bem como a evidência histórica ensinam-nos que as actividades de investigação e desenvolvimento (I&D), através do aumento da quantidade ou da variedade dos produtos produzidos, são as que mais contribuem para o crescimento económico de um país. Ora, sabe-se que o sector da construção é maioritariamente produtor de bens não-transaccionáveis e que a indústria portuguesa continua a ser muito pouco intensiva em I&D. A acrescer a isto, a abolição de barreiras ao comércio com os nossos principais parceiros comerciais e a melhoria das acessibilidades ao nosso País fazem com que seja cada vez mais barato chegar com os produtos estrangeiros a Portugal do que produzi-los internamente, o que tem levado alguns economistas a apontar fenómenos de deslocalização industrial para outros países.

A terceira razão, também ligada com a anterior, é uma composição de Capital Humano cada vez mais enviesada para áreas não técnicas. Alguns artigos científicos têm apresentado evidências que uma economia em que a proporção de engenheiros (no total de licenciados pelas universidades) é elevada tem tendência a crescer mais que uma economia com uma proporção maior de advogados e humanistas, por exemplo. A questão é que também em Portugal cada vez mais pessoas optam por licenciaturas em áreas das ciências sociais, humanas e comportamentais e cada vez menos optam por áreas mais técnicas. Se são as actividades de I&D as que mais contribuem para o crescimento económico e são engenheiros os profissionais mais ligados à I&D é razoável argumentar que uma economia que não privilegie a formação destes profissionais não pode ambicionar crescer a taxas muito elevadas.

Muitos outros factores podem ser apontados para o abrandamento da economia portuguesa, quer ligados à conjuntura nacional ou internacional, quer ligados a condicionantes estruturais da economia portuguesa, pois, parafraseando o Nobel da Economia Robert Lucas, referindo-se aos factores e condicionantes do crescimento económico, "Once one starts to think about them, it is hard to think about anything else".