Não é fácil reflectir, pensar e muito menos escrever sobre um livro como "Flowers in the Attic". Li este livro pela primeira (e única) vez há cerca de 10 anos, com uma percepção ainda adolescente e imaturidade que hoje não possuo. E não deixa de ser igualmente interessante rever um livro cuja estória já praticamente não recordava. Só esse facto (reler um livro) oferece-nos uma série de sensações (não de "dejá-vu") como se de facto fosse a primeira leitura.
"Flowers in the attic" (O título em português parece-me pouco adequado, ainda que se perceba porquê...) é um livro denso de emoções, denso pelo espaço onde a estória se desenrola (um quarto e um sótão), denso pelo horizonte temporal em que teve lugar e, mais denso ainda, pelo facto de relatar uma experiência vivida pela própria autora. "Flowers in the attic" é um livro basicamente acerca do valor da liberdade, dos sentimentos e da própria vida.
Virginia Andrews narra, transmite e extrapola para o leitor, sem preconceitos, tudo o que ela e seus irmãos viveram, durante 3 anos e meio, num quarto e num sótão fechados, isolados do mundo.
Logo depois da morte de seu pai (meio-tio da sua própria mãe), são levados para a mansão dos seus avós maternos. A mãe, sem dinheiro, tenta recuperar a confiança dos seus pais, um velho moribundo e uma mulher empedernida de sentimentos, escondendo os seus filhos num quarto isolado da mansão com o consentimento da mãe, uma fanática religiosa.
É-lhes então prometido que só ficarão ali até o avô morrer (o que seria para muito breve), findo esse tempo poderiam usar e gozar de uma imensa fortuna, bem como de uma muito ansiada liberdade. Contudo, a mãe, a pouco e pouco, vai-se afastando dos seus filhos: os adolescentes, Chris e Cathy, e os dois gémeos pequenos, Corry e Carrie.
É durante este tempo de isolamento que os dois irmãos mais velhos se transformam, desavisadamente, nos verdadeiros pais dos dois mais pequenos, construindo para estes um jardim de papel no sótão. É também durante esse tempo que Cathy (Virginia Andrews) e seu irmão Christopher crescem. Começam a descobrir os seus próprios corpos, a sua sexualidade reprimida, sem que possam partilhá-lo com terceiros.
Virginia Andrews assume mesmo o incesto cometido. Pode dizer-se que tal, dado o contexto, só pode gerar, e gera, compaixão em quem lê este livro.
Aqui, porque assim o é, o incesto é, merecida e compreensivelmente, levado à categoria de verdadeiro amor, sem maldade, culpa ou vergonha.
Virginia Andrews, na sua escrita, deixa transparente todo o seu ódio a quem, em nome da ganância e da cobiça, a privou da liberdade, roubando um dos irmãos mais novos da própria vida e lhe fez descobrir e a seu irmão o que é ser mulher e homem da forma mais errada.
É difícil, se não mesmo impossível, para quem lê este livro não se identificar com aqueles prisioneiros. Imaginando estar também preso naquele espaço que ao longo do livro se vai tornando tão familiarmente próximo quanto exíguo. Como se nós próprios fôssemos os prisioneiros. Quem o lê é assolado pela raiva e ódio que ela própria, a autora, sente, mas também pelo amor que tem aos irmãos e pela coragem que possui.
"Flowers in the attic" é um livro real, honesto, assustadoramente maravilhoso e comprometedor para os destinatários directos das duras palavras da autora. Andrews dedica-o à sua mãe.
Não é um livro sentimentalista, mas um livro de sentidos puros. Amor e ódio, verdade e mentira dádiva e ganância. A essência do bem e do mal amorais. Tão simples quanto isso.

Por Luís Silva