António Fidalgo

Em Agosto a distância


Vivemos em tempos de proximidade. Estradas, carros e aviões tornam perto o que dantes era longe. Mas nada encurta as distâncias como os meios electrónicos de comunicação. Rádio, televisão e telefone fazem do mundo um espaço que, percorrido à velocidade da luz, torna tudo próximo. Vemos e ouvimos tão rapidamente o que se passa na China como o que se passa nas cidades vizinhas.
O telemóvel então coloca tudo ao alcance de uma chamada. Familiares, amigos, conhecidos, estão sempre na proximidade de uma conversa por telemóvel. Parece que por todos os meios se tentam derrubar as distâncias. Com a proximidade dos meios de comunicação parece estarmos simultaneamente em todos os lados, em casa, no trabalho, com os familiares.
Em Agosto será, porém, época indicada para fazer o elogio da distância. As férias, o sair para outros locais, dão azo a que pensemos na distância como um bem indispensável. Quem vive atarefado na azáfama de emprego, na lufa-lufa da vida quotidiana, de casa para o trabalho, do trabalho para casa, saberá apreciar o afastamento de tudo isso que as férias proporcionam. É preciso ganhar a distância, saber distanciar-se das coisas, e relativizá-las na devida proporção. Quantas vezes aquilo que na proximidade nos parecia de uma importância extrema se revela de estatura menor logo que o tempo ou espaço nos permitem ganhar a distância necessária para o olhar na dimensão real.
As férias são uma época privilegiada de distanciação. De longe, de fora, podemos olhar as coisas e os acontecimentos com maior desapego, com mais neutralidade, e assim ser mais objectivos e imparciais. Ora se o que caracteriza o homem é a distância, o saber criar um intervalo entre si e o que faz, e mesmo entre si e si mesmo, numa atitude de reflexão, então há que cultivar essa distância, o saber estar entre as coisas e não lhes pertencer, o manter sempre a sua independência. É que a liberdade não será mais do que a distância entre si e as suas circunstâncias.
Em Agosto a distância é a possibilidade de desligar, de cortar amarras, de exercitar a liberdade.