José Geraldes

 


Ver, observar e votar

Muitos portugueses já terão formulado a sua opção de voto. Outros estarão indecisos. Outros ainda só tomarão a decisão final no momento de votar. Sabe-se, por análises fundamentadas, que a volatilidade dos votos é uma realidade. Porque há eleitores que se decidem à última hora. Daí a hipótese de falhanço das sondagens.
O voto é uma decisão em consciência. Mas, para os cristãos, o voto depende dos programas partidários que não estejam em contradição com os valores que defendem. A este propósito, a Conferência Episcopal Portuguesa publicou uma Nota que, sem pôr em causa a opção partidária de cada cidadão e com base na doutrina emanada do Vaticano II, apela a um "justo discernimento no exercício da sua liberdade democrática".
O facto destas eleições ocorrerem na interrupção de uma legislatura e em situação de crise internacional por causa dos acontecimentos do 11 de Setembro exige uma reflexão mais profunda na escolha a fazer. Lê-se na Nota: "No momento que atravessamos, é necessário um clarividente discernimento político. Trata-se de saber ler e analisar o realismo das situações e dos problemas, consciencializar o projecto de sociedade que acalentamos, verificar, entre as soluções encontradas e propostas até agora, aquelas que vale a pena continuar e aquelas que exigem uma mudança de rumo".
Uma pergunta se impõe decorrente desta citação: que projecto de sociedade desejam os eleitores cristãos? O discernimento crítico está na lógica da resposta, seja na análise do que deve ser mudado, seja na aceitação do que se julga manter. As linhas mestras deste discernimento baseiam-se em critérios que pautam a visão do ser cristão no mundo.
A Nota, partindo da norma de que em política não há soluções perfeitas, aponta uma série de pontos de referência. Assim, são de ter em conta, em primeiro lugar, o respeito pela religião e pela liberdade de consciência e de culto. A seguir, o carácter sagrado de toda a vida humana, desde a concepção até à morte natural. Em terceiro lugar, a promoção de igualdade de oportunidades, sem discriminação de classe, sexo ou etnia e com uma atenção aos mais pobres e desfavorecidos.
Mas há outros factores a considerar. Os cristãos não podem aceitar uma visão estatizante da educação. Às famílias deve ser reconhecido o direito inalienável, conforme a Declaração dos Direitos do Homem, de escolherem o projecto educativo que desejarem para os seus filhos. Ora, deduz-se daqui que o apoio ao ensino não estatal é indispensável. E, evidentemente, em pé de igualdade com o ensino oficial.
A dignidade da pessoa humana implica que a economia esteja ao serviço do bem comum. Marcada pelo humanismo. E não pelo materialismo.
Na procura de uma "economia saudável", a luta contra a corrupção inscreve-se numa atitude ética inquestionável. Quem tiver a coragem de levar por diante o combate contra todas as formas de corrupção, um verdadeiro flagelo no País, merece o voto dos cristãos.
Na campanha eleitoral haverá muitas promessas. Mas não será difícil distinguir quem pela honestidade e coerência, vai ter em conta os critérios referidos. Importa estar atento, em tolerância democrática, para votar de consciência bem formada e não ao sabor de humores momentâneos. O que não se pode aprovar é ser indiferente a estas eleições. Tal atitude equivale a uma demissão imperdoável para a construção do Portugal que desejamos.