Por Ana Maria Fonseca e Mariana Morais


José Goulão

"Acredito que há um processo de limpeza étnica na Palestina para a sua ocupação total por parte de Israel", é assim que o jornalista José Goulão olha para o conflito Israelo-árabe. Durante a sua recente visita à Covilhã, falou sobre "Os mistérios dos negócios estrangeiros", a convite da Juventude Comunista Portuguesa.
Em 1982, José Goulão esteve na guerra do Líbano. Foi nessa altura que começou a interessar-se pelas questões do Médio Oriente, dada a "riqueza e quantidade de acontecimentos daquele mundo diferente". A partir dai, o seu objectivo foi tentar descobri-lo e entendê-lo. "É como um novelo, puxa-se por uma ponta e nunca mais acaba".
Para o jornalista, a resolução do conflito passa por negociações equilibradas e "respeito pela existência do estado de Israel e do Estado palestiniano, em que os cidadãos possam exercer os seus direitos plenamente".
Recusa a possibilidade de um estado mais poderoso aniquilar uma população sob ocupação, "isso seria regressar algumas décadas atrás e mesmo assim o próprio Hitler não conseguiu liquidar os judeus", compara e continua, "O que Sharon quer é a criação duma espécie de "guetto" com uma população cercada por barreiras de arame, condicionada por zonas chamadas de segurança para dividir as cidades, as aldeias, os campos de refugiados e criar dificuldades de comunicação entre as comunidades palestinianas". Um estado ingovernável, sem forças armadas e cercado por redes e cercas electrificadas.
José Goulão apela a uma mobilização internacional semelhante à que aconteceu por Timor. "Os governos, desde os EUA à União Europeia, falam muito e agem pouco", considera.


"A extrema-direita israelita pretende que Israel governe toda a Palestina"



Cinco milhões fora da Palestina

Dos 7 milhões de palestinianos existentes no mundo, 5 milhões não vivem na Palestina. Muitos deles já nasceram, desde 1948, fora da Palestina mas "não deixam de ter como referência histórica a sua terra e a terra onde nasceram os seus antepassados".
O principal objectivo de Israel é, na opinião de José Goulão, a criação do grande Israel, através da ocupação dos territórios autónomos da Palestina. Para isso, "tudo faz para enfraquecer Arafat e encontrar na sociedade palestiniana colaboracionistas que a troco de qualquer coisa lhe entreguem a resistência".
Israel procura convencer a opinião pública internacional que, "de Arafat até ao Hamas e à Jhiad islâmica todos são terroristas e assim se confunde a resistência legítima contra a ocupação, com terrorismo contra civis", defende. "A extrema direita israelita pretende que Israel governe toda a Palestina". Como um dos meios para alcançar esse objectivo, "como já foi dito por mais de um ministro israelita, os serviços secretos de Israel reforçaram o Hamas, dando -lhe meios para dividir a resistência palestiniana, e criar um confronto permanente com o exército. Introduziram armas num movimento que, até então, era de resistência cívica usando pedras, paus, armas rudimentares, e que se baseava essencialmente em manifestações e levantamentos populares e não num confronto armado".
Bastou Sharon sair, libertarem Arafat do cativeiro em Ramallah e, imediatamente há dois atentados terroristas em Israel, matando civis e dando todos os argumentos a Sharon para este dizer "é impossível negociar com estes terroristas".

"Gaza é um barril de pólvora"

Num território com aproximadamente 320 Km2, pouco maior que o Montijo, vivem duas comunidades opostas. Num terço desta área, cerca de 10 mil pessoas habitam boas casas com jardins. do outro lado, existe a maior densidade populacional do mundo. Um milhão de palestinianos em 220 Km2. "Aqui vegeta-se, sem água, sem luz e sem emprego, é o nível mais baixo da condição humana", lamenta.
Apesar desta situação limite, José Goulão acredita que mais tarde ou mais cedo, com o agravar da situação, haverá no estado de Israel "uma contestação profunda". Quando se perceber que a política de Sharon não serve os interesses do estado de Israel, nem a sua segurança. "De certa forma, Israel está a ser vítima do seu Primeiro Ministro, porque embora ele afirme que o que faz é em nome da segurança de Israel, nunca a sua população se sentiu tão insegura", afirma, e continua, "vive-se um clima de paranóia com a segurança, que torna insuportável a vida dos próprios israelitas. O cidadão comum anda armado por todo o lado".
A época em que Isaac Rabin estava no poder e negociava a paz com Yasser Arafat, "foi aquela em que os israelitas se sentiram mais seguros". As pessoas poderão comparar estas situações e "pela sua própria sobrevivência e tranquilidade, acabarão por optar", acredita.