Actor mergulhado na escuridão, à procura de algo que não encontra
Teatro da Rainha apresenta “Krapp”
Adeus ao amor

A peça “Krapp”, de Samuel Beckett, foi apresentada pela Companhia de Teatro da Rainha, no anfiteatro do complexo da Escola Secundária do Fundão, no passado dia 11, por volta das 21:30. O espectáculo em questão inclui-se no Festival de Teatro da Covilhã.


Por Maria João Canadas


“Krapp” é o nome que a companhia de teatro profissional proveniente das Caldas da Rainha, deu à peça “A última bobina”, escrita em 1956 por Samuel Beckett. O texto conta uma vertente autobiográfica dos presentes. A representação da Companhia de Teatro da Rainha não defraudou as expectativas dos presentes.
A encenação esteve a cargo de Fernando Mora Ramos, enquanto que a interpretação contou com a participação de Victor Santos.
A adesão do público foi quase nula, facto que desiludiu bastante o actor Victor Santos, que refere que o público “faz sempre falta, é necessário ter um enquadramento, e não tendo público é como ter bobo sem corte”. Apesar de tal facto, “o espectáculo correu razoavelmente bem “, conclui o actor.
A peça fala de um homem completamente solitário de nome Krapp, que se encontra no clímax da sua vida, mais concretamente na casa dos 60 anos, e tem como hábito todos os aniversários gravar uma bobina com o balanço de cada ano. No entanto, todas as bobinas são idênticas, menos a “bobina 5 da caixa 3”, como é referido na peça, que descreve a paixão da sua vida, Bianca, a mulher de “olhos grandiosos” e “como fendas”.
“Krapp”, a personagem da peça de Beckett, “separa o trigo do joio”, ouvindo apenas a bobina referente à sua grande paixão, de forma incansável, procurando a felicidade. Prefere estar na escuridão porque, desta forma, encontra-se acompanhado pelos fantasmas.

Escolha de nome propositada

O nome “Krapp”, para a personagem, é carregado de simbolismo, como o actor Victor Santos explica: “é um crápula que vive num buraco. Krapp soa tal como a palavra Inglesa Crap, que significa “sujidade”, “porcaria”, “inútil”, exactamente como a personagem é apresentada: O homem detrito, pois encontra-se no limite do ser.
Este facto revela uma característica comum das peças da autoria de Bekcett, que é a revelação da condição humana no sentido do absurdo, transmitida nos seus valores, nas suas crenças sem esperança, que qualquer coisa de bom aconteça.
O cenário e a iluminação baseiam-se na simplicidade: Uma sala com um candeeiro central que apenas ilumina Krapp, mergulhado na escuridão.
Da parte da assistência a satisfação foi positiva. Marta Correia comenta: “A peça é completamente diferente, pois revela muita intensidade na personagem”. A sua irmã, Catarina Correia acrescenta que “o espectáculo se baseia na insatisfação das passagens da vida, a tristeza e a melancolia”.
Questionando um espectador, Nuno Leão, sobre a mensagem da peça, este retira que “a peça retrata a vida, a fugacidade dos instantes da vida, que pretendem ser eternos, e por isso, temos que aproveitar cada momento efémero que a vida nos presenteia.
“Krapp” é uma impossibilidade do amor, do adeus ao amor, em que está em questão “a eleição de um instante entre os biliões de instantes que compõem a existência”, como refere a Companhia de Teatro da Rainha.