António Fidalgo

Renovar as universidades europeias


Um artigo recente de The Economist traça um panorama desolador das universidades inglesas. Começa logo por dizer que é deprimente uma visita feita hoje a Oxford e a Cambridge. Os docentes ganham mal e os novos edifícios são feios, maus e com deficiente manutenção. E ainda assim, as duas velhas e prestigiadas universidades destacam-se claramente, pela positiva, no mundo académico britânico em que o subfinanciamento crónico, a admissão quase indiscriminada de alunos mal preparados, a inflação de graus, causam e expressam a miséria do ensino superior.
Mas na Europa continental, e ainda segundo a revista inglesa, a situação das universidades não é melhor. São referidos casos concretos na Alemanha, França, Itália e Espanha, que mostram ao quanto chegou a degradação das universidades. A massificação do ensino universitário nas últimas décadas fez-se à custa da qualidade.
O fraco desempenho das universidades europeias torna-se manifesto quando comparadas com as universidades americanas de topo. Os melhores professores e os melhores alunos atravessam o Atlântico para encontrarem nos Estados Unidos as condições com que aqui só podem sonhar. Basta dizer que a Universidade de Harvard tem disponível para investir o dobro do que têm todas as universidades inglesas em conjunto. Os prémios Nobel que os professores de universidades americanas arrebatam ano após ano, na física, na química, na medicina, na economia, são fruto de uma cultura de exigência e excelência na investigação científica muito acima da europeia.
O quadro negro traçado pelo The Economist é tão real que levou alguns governos europeus a reagir. Numa decisão parlamentar difícil a Inglaterra deliberou quase triplicar as propinas para cerca de 4.400 euros por ano. A Governo alemão anunciou a semana passada que um júri internacional iria escolher 5 universidades para serem financiadas de modo a converterem-se em universidades de topo a nível mundial.
A burocracia, o subfinanciamento e o igualitarismo que prevalecem nas universidades europeias não combinam com a agilidade, a autonomia e a riqueza que hoje uma universidade tem necessariamente de ter para competir num mundo global. Uma universidade tem de atrair os melhores para ser a melhor. A isto não há volta a dar. E para o fazer tem de ter os meios indispensáveis, sejam financeiros e legais. A competição é, em tempos de Internet, à escala mundial.
As universidades portuguesas não são referidas no artigo do The Economist. É claro que a situação não é melhor que a das congéneres europeias. Mas as universidades portuguesas podem e devem entrar na liça, na batalha da excelência. Um passo importante foi dado com a Lei do Financiamento de Pedro Lynce. Mas não chega de modo algum. As universidades portuguesas têm também de se agilizar juridicamente e verem a sua autonomia reforçada. Têm de competir entre si, primeiro, e, em segundo, têm obrigatoriamente que se internacionalizar. É bom que haja portugueses a doutorarem-se no estrangeiro, mas é igualmente importante que estudantes estrangeiros venham estudar para Portugal.
Não se compreende que tendo tanta capacidade desaproveitada, sobretudo nas áreas das ciências exactas e das engenharias, as universidades portuguesas não possam captar alunos brasileiros para estudarem em Portugal, pois que não lhes podem exigir propinas mais altas que aos nacionais – e essas, apesar do aumento, não cobrem de modo algum os custos reais dos estudos.
Quanto aos cursos de pós-graduação, de mestrado e de doutoramento, deve-se investir no mundo lusófono e ibérico. Há muitos estudantes em cursos de doutoramento em Espanha, mas devem-se contar pelos dedos das mãos os doutorandos espanhóis em universidades portuguesas. Porquê ter uma estrada de um sentido só, e não investir seriamente na pós-graduação em Portugal e competir no espaço ibérico pelos melhores professores e alunos?
O ensino universitário é por natureza caro, porque exige investigação científica por parte dos docentes e uma relação próxima de professores e estudantes, que exclui o ensino massificado. O insucesso escolar em disciplinas críticas de matemática e de física seria resolvido com turmas verdadeiramente tutoriais, onde os docentes pudessem acompanhar pessoalmente cada aluno. Com turmas de centenas de alunos, em que os estudantes são anónimos e que por sua vez desconhecem o nome do professor, é impossível ter um ensino de qualidade. Poupa-se na contratação de professores, mas paga-se caro no insucesso escolar e na desistência de muitos estudantes a meio do curso.
Nenhum estudante deverá ficar de fora da universidade por razões económicas - e é isso que muito bem estipula o modelo social europeu -, mas isso não pode de algum modo significar que o estudo universitário é grátis. O que é bom paga-se, diz o povo, e com razão. Seja o pagador o Estado ou os estudantes ou então Estado e estudantes em conjunto.