A ausência de rampas em edifícios públicos dificulta a vida a quem tem de se mover em cadeira de rodas
Deficientes apresentam queixas
Barreiras arquitectónicas continuam
a dificultar a mobilidade


O Governo deu sete anos para que os obstáculos encontrados pelas pessoas com dificuldades de locomoção fossem eliminados, mas o objectivo não foi cumprido. A Associação Portuguesa de Deficientes sublinha que agora quem se sinta prejudicado pode processar o Estado.


Ana Ribeiro Rodrigues
NC / Urbi et Orbi


O prazo para que todos os edifícios abertos ao público tenham acessos para pessoas com dificuldades de locomoção terminou na passada semana, e, segundo Luís Eugénio, presidente da delegação regional da Associação Portuguesa de Deficientes (APD) de Castelo Branco, "está praticamente tudo na mesma".
O decreto-lei 123/97 estipulou um prazo de sete anos para que as barreiras arquitectónicas fossem eliminadas nos edifícios públicos, mas os cidadãos com mobilidade condicionada continuam a deparar-se com as mesmas dificuldades. Com a agravante, sublinha Luís Eugénio, de o número de pessoas nessa situação ter aumentado bastante nos últimos anos. A ausência de rampas, ou com piso e inclinação aceitáveis, os degraus, a falta de elevadores ou elevadores estreitos, passeios altos, casas de banho por adaptar ou as caixas multibanco e os telefones públicos demasiado altos são alguns dos obstáculos com que as pessoas com problemas de mobilidade se continuam a deparar no seu dia-a-dia. E que as privam de alguns dos seus direitos.
Luís Eugénio realça que se algumas pessoas ou entidades estão sensibilizadas, isso não acontece na maioria dos casos, e justifica a leitura que faz do actual cenário com a "má vontade para resolver as coisas, nomeadamente a falta de vontade política". Humberto Santos, responsável nacional pela APD, salienta que as falhas do decreto-lei e o facto de os vários Orçamentos de Estado nunca terem contemplado financiamento para a adaptação de edifícios contribuíram para ajudar a explicar porque é que o problema não foi resolvido.
"Há engenheiros e arquitectos que nem conhecem este decreto e continuam a desenhar e construir edifícios sem acessibilidades, já para não falar nas obras que não respeitam a lei e são licenciadas", sublinha Luís Eugénio. Mas a APD chama ainda a atenção para o baixo valor das coimas previstas para os incumpridores, entre os 250 euros e os dez mil euros, que consideram ser um convite à violação da lei. Por isso propõem o seu aumento e a criação de um fundo para o qual reverta parte do valor das multas.



APD quer comissões de fiscalização independente

As associações defendem a criação de comissões independentes de avaliação

A Câmara da Covilhã, como muitas outras, é um desses inúmeros edifícios onde uma pessoa com mobilidade condicionada não consegue aceder aos pisos superiores, pelo menos sozinha. No entanto, é às autarquias, as entidades licenciadoras, que compete a fiscalização da aplicação do diploma. Embora inicialmente estivesse previsto que isso ficasse a cargo da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN). E como os edifícios públicos não precisam de licenciamento, não são fiscalizados.
Este é outro dos factores que no entender da ADP contribuíram para que a eliminação das barreiras arquitectónicas não fosse concretizada, já que entendem que as decisões políticas devem ser monitorizadas para que tenham efeitos práticos. Por isso defendem a criação de comissões de fiscalização que sejam independentes e integrem organizações da sociedade civil. "Os próprios deficientes são as pessoas mais qualificadas para avaliar, numa vistoria, o que mais lhes faz falta, porque os outros não sentem o problema na pele", frisa Luís Eugénio, que entende que para além dos bombeiros e dos fiscais municipais as associações de deficientes também deviam estar presentes e dar a sua opinião.
Como a lei não foi cumprida no período que foi determinado a APD lembra que a partir de agora qualquer pessoa pode processar os responsáveis dos espaços abertos ao público onde esbarrem com dificuldades de acesso por não serem respeitadas as exigências da lei. E Humberto Santos sublinha que no grupo de pessoas que costumam ser afectadas por este problema estão não só deficientes motores como também idosos ou pessoas com carrinhos de bébé.
Por aprovar ainda continua o Plano Nacional para a Promoção da Acessibilidade, com que este Governo diz ter vontade de avançar. Trata-se de um projecto para determinar as condições mínimas nas habitações, a criação de sinaléctica para os transportes ou o plano de acessibilidade a locais como as praias e que vai envolver não só as entidades públicas como também o sector dos transportes, das comunicações e os privados.