Carlos Cabrita

As engenharias. Breves considerações


Pode-se afirmar, de uma forma praticamente universal, que “Engenharia” é uma ciência aplicada que tem como objectivo primordial estudar e desenvolver técnicas que permitam colocar o engenho e a arte, baseados em sólidos conhecimentos de ciências fundamentais como a matemática e a física, ao serviço do bem estar, da qualidade de vida e do desenvolvimento da humanidade, de forma sustentada respeitando o meio ambiental envolvente.
Desde os primórdios da criação da humanidade, que as engenharias se encontram presentes em todos os sectores de actividade. Basta pensarmos no homem primitivo de há 100 mil anos e nas suas necessidades básicas de sobrevivência, para concluírmos de imediato que a construção dos seus utensílios elementares obedeceu a critérios bem definidos quanto à sua concepção – armas para caçar, com características diferentes das armas para pescar, por exemplo –. Com o desenvolvimento das capacidades cerebrais, esses utensílios sofreram um aperfeiçoamento constante, tendo originado, como se sabe, as idades do ferro, do cobre e do bronze. A própria descoberta do fogo representa, em si, um acto de engenharia já com uma certa complexidade, na medida em que obrigou à utilização de todas as capacidades inventivas do homem primitivo. Com esta descoberta, e com o desenvolvimento das técnicas de conservação de alimentos, nascia timidamente a Engenharia Química, que, através dos tempos, se transformou num sector de actividade fundamental, abrangendo áreas tão diversas como os produtos alimentares, farmacêuticos, de perfumaria, os combustíveis, os lubrificantes, a extracção de petróleo, os plásticos e borrachas, os óleos e sabões, os detergentes, os novos materiais compósitos e outros, etc. Curiosamente, Descartes chegou a afirmar que a evolução das nações se deveria quantificar através dos níveis de consumo de ácido sulfúrico!
Quando o homem primitivo construiu o seu primeiro abrigo nunca imaginou que estava a dar os primeiros passos para a criação da mais espectacular e, talvez, da mais ancestral das engenharias – a Engenharia Civil –, espectacular devido à forma como a natureza é transformada e pela grandiosidade das obras, factores intemporais que podem ser apreciados desde os grandes monumentos civilizacionais do passado, até ao tempo presente, como sejam as autoestradas, os aeroportos e portos de mar, as grandes centrais hidroeléctricas, os arranha-céus, etc.
Quanto à Engenharia de Minas, de importância vital pois é responsável pela extracção dos recursos minerais que o planeta nos oferece, teve a sua origem igualmente no homem primitivo quando começou a descobrir esses recursos e sentiu a necessidade de penetrar no subsolo para os conseguir obter.
Por sua vez, a Engenharia Mecânica nasceu também nos tempos ancestrais quando a humanidade começou a desenvolver as suas alfaias agrícolas e, mais tarde, os seus meios de locomoção aproveitando a força animal. Esta engenharia evoluiu de forma espectacular tendo atingido o seu auge na primeira revolução industrial, com a descoberta da força motriz do vapor e com a consequente invenção do motor térmico, transformando-os em poderosos meios de produção, como os caminhos de ferro, a construção naval e a indústria têxtil.
Quanto à Engenharia Electrotécnica, até 1880 não houve propriamente uma indústria eléctrica, existindo apenas algumas oficinas de vão de escada, dispersas. Todavia, mal a lâmpada de incandescência começou a brilhar, uma torrente de fábricas irrompeu como cogumelos por toda a Europa e pelos Estados Unidos. O homem pressentiu que a electricidade seria a energia do futuro – o vapor cedeu-lhe a camisola amarela e tornou-se o seu parceiro discreto. A electricidade surgiu assim, no dealbar do século XX, como a grande força libertadora e símbolo de uma civilização cujo propósito era trazer a felicidade à humanidade. Actualmente, a engenharia electrotécnica, apesar de ser a mais jovem das engenharias, encontra-se presente em todos os sectores de actividade, desde a indústria pesada ao lazer, passando pela medicina.
Devido à complexidade dos sistemas actuais (a aeronave Boeing 747 possui 4,5 milhões de componentes, e um automóvel topo de gama cerca de 11 mil), e ao alargamento do leque de indústrias existentes, têm vindo a nascer novas engenharias, todavia baseadas nas engenharias canónicas – papel, têxtil, aeronáutica, aeroespacial, automóvel, biomédica, industrial, informática, electrónica, segurança, etc.
Para finalizar, para que melhor nos apercebamos de que forma as engenharias se encontram presentes no nosso quotidiano, veja-se o exemplo de um simples automóvel, que reúne em si praticamente de forma directa ou indirecta, todas as áreas de engenharia: mecânica e automóvel (estrutura, suspensões, caixa de velocidades, motor), automóvel e aeroespacial (aerodinâmica), química (vidros, plásticos, pinturas, combustível, lubrificantes, pneus), têxtil (tecidos e revestimentos interiores), electrotécnica e electrónica (computador, gerador, motores e actuadores, instrumentação e sensores), segurança (sistemas activos e passivos), civil (as estradas de circulação).