João Canavilhas

Código de esperança


Entrou em vigor o novo Código da Estrada. No essencial, as novas regras agravam fortemente as penalizações para algumas das infracções causadoras de acidentes, nomeadamente o excesso de velocidade, as manobras perigosas, a condução sob efeito de álcool e o uso de telemóvel.

O facto das coimas chegarem aos 2500 euros terá um importante efeito dissuasor, mas a nova legislação vai mais longe e refere que os pagamentos devem ser realizados imediatamente após a autuação ou no prazo máximo de cinco dias, período durante o qual os documentos do infractor serão apreendidos pelas autoridades.

Considero que estas alterações podem acabar com a autêntica guerra civil vivida diariamente nas estradas portuguesas: os 1.124 mortos e os 42.806 feridos registados em 2004 dizem bem da tragédia vivida nas estradas. E o pior é que, para além destas vítimas directas, os acidentes provocam oito ou nove vezes mais vítimas indirectas, nomeadamente os familiares e amigos dos sinistrados. Ou seja, poderemos estar a falar de 400 mil vítimas, só em 2004. Visto à distância, o número parece apenas isso, um número. Mas para quem já viveu a perda de um ente querido, a vítima mortal é um bocado de si próprio que desaparece naquele momento devido a um estúpido acidente muitas vezes resultante dos excessos alheios.

Por isso, quando alguns se mostram preocupados com a possibilidade do novo código violar o princípio da presunção da inocência e o direito ao contraditório, eu prefiro pensar que a nova legislação defende um valor mais importante: o direito à vida.
Curiosamente, um inquérito realizado esta semana revela que a maioria dos portugueses não acredita numa diminuição dos acidentes em resultado do novo código. Mas basta estar atento à circulação nas estradas da nossa região para se perceber que nos últimos três dias se circula com muito mais cuidado. Esperemos que isto não seja apenas o receio inicial, mas o princípio de uma nova atitude dos automobilistas portugueses.