Anabela Gradim

Branca autárquica


A noite eleitoral que passou não trouxe grandes surpresas ao mapa autárquico. Se descontarmos casos como o Porto ou Guarda, em que as principais sondagens apontavam para «empate técnico» (1), e cujos resultados se saldaram na recondução do partido do poder, não houve grandes surpresas relativamente à contabilidade das vitórias e derrotas.

A maior surpresa foi sem dúvida o bloqueio das bases de dados do STAPE, devido ao «invulgar número de acessos» que ultrapassou largamente o que era esperado pelos responsáveis do sistema. O resultado foi uma «branca» que se fez sentir mais ou menos entre as 19h30 e as 22 horas e que, para todas as Câmaras onde não havia sondagens realizadas à boca das urnas – a esmagadora maioria – deixou os eleitores em suspenso, na expectativa de um resultado que afinal já ninguém sabia qual seria.

A cobertura mediática do evento, por seu turno, ficou «descalça», comprazendo-se em mais de hora e meia de reiteração e tautologia da parca informação existente. Resultado previsível: mais utilizadores tentando sem sucesso entrar no site do STAPE, contribuindo para prolongar a avaria.

Segundo noticiava o jornal Público, os responsáveis pelo serviço estimavam que, relativamente às autárquicas de 2001, as taxas de utilização do sistema quadruplicassem. O que de facto se verificou foi que «o aumento acabou por ser "seis a sete vezes" e as visitas chegaram a atingir as 480 por segundo».

Que o STAPE levou um «choque tecnológico» foi certamente o comentário mais ouvido este propósito. Mas há alguns dados da situação que importa reter. Não só que a disponibilização das TIC tem vindo a aumentar em todo o território nacional, como, muito mais importante, os portugueses sabem utilizá-las, e sabiam, os suficientes para bloquear o sistema, que na noite eleitoral teriam resultados em directo a partir do STAPE, e informação personalizada – especificamente aquela que lhes interessava – sem dependerem dos media convencionais. Saber em tempo real, os resultados do apuramento da freguesia de Paranhos ou Ferro ou Massarelos, é um complemento muitíssimo atraente à cobertura necessariamente generalista que pode ser levada a cabo pelas rádios ou televisões.

Que os portugueses têm uma taxa de penetração das TIC razoável, já se sabia. Segundo a Anacom, por exemplo, a evolução do número de subscritores de acesso à Internet tem crescido a uma taxa de 91% ao ano. Em 2000 havia 2.110.828 subscritores, e em 2004 eram já 8.314.878. O inquérito à utilização das TIC por parte da população portuguesa acompanha estes dados. Entre 2000 e 2004 a posse de ligação à Internet nos agregados familiares cresceu a uma taxa média anual de 40%, enquanto a posse de ligação à Internet por banda larga pelas famílias cresceu 212%. (2)

Posto isto, que os portugueses tinham cada vez mais acesso às TIC, mesmo no remanso do lar, não constituía novidade para ninguém. Já que neste espaço de tempo tenham aprendido a utilizá-las melhor, ficamos agora a sabê-lo, e não são de todo más notícias.

O problema nos servidores do STAPE parece em tudo semelhante ao que, há dois ou três anos, ocorreu num dos concursos nacionais de colocação de professores: um número de acessos muito superior ao previsto paralisou o sistema. Ora, problemas técnicos têm soluções técnicas. No ano seguinte, relativamente aos concursos, todas as questões técnicas relativas à pane informática e aos acessos estavam resolvidas. Enfim, os portugueses que não surpreenderam nos resultados eleitorais, surpreenderam no acesso às TIC. Nem tudo hão-de ser só más notícias.




  1 - E no Porto, sondagens, havia-as para todos os gostos: http://margensdeerro.blogspot.com/

2 - Esta taxa de crescimento é muito elevada porque em 2000 a percentagem de lares com acesso à banda larga era de 0%, enquanto em 2004 rondava os 19%