José Geraldes

Os 40 anos do Vaticano II


A convocação do concílio Vaticano II despertou uma onda de entusiasmo e de alegria. Com surpresa de todo o mundo, João XXIII deu a notícia, ele que aos 78 anos tinha sido eleito como um papa de transição. Era preciso, segundo as suas palavras, fazer o “aggiornamento” da Igreja e “limpar o pó das suas janelas e abri-las de par em par”.
Uma onda de esperança invadiu todas as comunidades cristãs. Chegava uma lufada de ar fresco para a renovação da Igreja.
Iniciado a 11 de Outubro de 1962, o Vaticano II foi encerrado solenemente por Paulo VI a 8 de Dezembro de 1965, já que o bom papa João morrera a 3 de Junho de 1963.
Participaram mais de dois mil bispos entre os quais 50 portugueses. Os assessores eram cerca de quinhentos.
Hoje passados 40 anos da sua realização vemos o alcance dos seus documentos. Os temas estudados têm como pilares as constituições sobre a natureza da Igreja, a liturgia, a revelação divina e palavra de Deus e presença da Igreja no mundo. De referir ainda os decretos sobre a liberdade religiosa, o apostolado dos leigos, a educação cristã, ecumenismo, relação com os não cristãos e os meios de comunicação social.
Será que à distância de 40 anos o concílio Vaticano II foi plenamente posto em prática? Dar uma resposta positiva afigura-se difícil. Mas muitas mudanças se operaram. Em algumas áreas mais do que noutras. No entanto, há muito caminho ainda para andar.
Se uma revolução só é totalmente interiorizada passados 50 anos, então em relação ao Vaticano II, grande trabalho há ainda a fazer.
Em 1985, data em que se completaram os 20 anos do Concílio, o então Cardeal Ratzinger, hoje Bento XVI, em entrevista ao jornalista Vittorio Messori, dizia que era necessário reler os seus textos para captar, de um modo novo, as suas grandes intuições essenciais. Quarenta anos depois, esta releitura impõe-se como urgência inadiável.
Dois documentos merecem destaque nesta releitura: a Constituição sobre a Igreja e a Constituição sobre a Igreja no mundo contemporâneo. A primeira introduz a nova eclesiologia em que o mistério, a comunhão e o serviço são as notas da Igreja. Igreja que se apresenta como o povo de Deus. E não como poder. E em que a comunhão e a corresponsabilidade são fundamentais.
A Constituição sobre a Igreja no mundo contemporâneo mostra-nos a missão de acolhimento e solidariedade com todas as “alegrias e esperanças” de todo o homem. Na linha do que escrevia Tertuliano no séc. II: “Nada do que há no homem é estranho à Igreja”.
O início deste documento começa assim: “As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo”. A Igreja quer assumir na sua missão todos os problemas do mundo.
A Constituição sobre a Igreja e o mundo contemporâneo, apesar da marca dos anos 60, conserva plena actualidade. Claro que o tom de optimismo de que reveste, pode parecer diferente em relação ao mundo de hoje marcado por muitas alterações de ordem económica, social, política e ecológica e em que a globalização determina novos comportamentos. Mas o sentido da humanidade permanece inalterável.
O Vaticano II não está ultrapassado. Para além do património que constitui, importa retornar ao seu espírito inicial. E dinamizar muito do que constam os seus textos no “aggionamento” constante.
E não o esquecer mudando as atitudes e mentalidades em diálogo constante com o mundo. Na atenção aos “sinais dos tempos”. Para que a Igreja seja sempre fiel à sua missão assumindo as “alegrias e esperanças” de todos os homens.