As pessoas com deficiências motoras referem que os edifícios não são concebidos a pensar nas suas necessidades
Edifícios sem barreiras
Deficientes duvidam
das novas leis para construção


O novo decreto-lei aprovado há cerca de duas semanas não vem animar a delegação distrital da Associação Portuguesa de Deficientes. Adelino Pais Fernandes, presidente do organismo na região, critica a já extensa legislação existente sobre o problema, mas que nunca é posta em prática.


NC / Urbi et Orbi


Os novos edifícios que venham a ser construídos a partir desta altura não poderão conter barreiras arquitectónicas para deficientes. O novo decreto-lei revoga o 123/97, de 22 de Maio, e foi aprovado em Conselho de Ministros há cerca de duas semanas. E as consequências para quem não aplicar a lei vão ser muitas. Em caso de incumprimento, as multas podem ir de 250 a três mil 740 euros, quando se trate de pessoa individual, e de 500 a 44 mil 890 euros, quando o infractor for uma entidade colectiva. Além disso, as sanções podem levar à interdição do exercício da actividade e encerramento de empresas e à perda de mandato para os autarcas.
As medidas pertencem ao I Plano de Acção para a Integração das Pessoas com Deficiência ou Incapacidade, que o Ministério do Trabalho e a Segurança Social apresentou na passada quarta-feira, 1, para discussão pública e, por isso, só agora se começam a conhecer alguns dos pormenores, nomeadamente que o valor das multas para quem não cumpra as regras de acessibilidade são reduzidas para um máximo de mil 870 e 22 mil 445 euros em caso de negligência (e não incumprimento).
Segundo Adelino Pais Fernandes, presidente da delegação distrital da Associação Portuguesa de Deficientes (APD), a medida é boa, mas precisa de ser posta em prática. “No que se refere a leis para deficientes, Portugal está à frente do resto da Europa. O problema é que a legislação existente nunca é aplicada”, sublinha. O delegado distrital da APD lembra como em Maio de 2004 ainda tudo estava por fazer neste âmbito, mesmo depois de algum tempo decorrido desde o Ano Europeu das Pessoas com Deficiência, em 2003. “Eu duvido sempre das boas intenções. Leis já temos que bastem, enfiadas nas gavetas. Mas, como eu costumo dizer, vamos acreditar em milagres”, acrescenta.
Adelino Pais Fernandes não nega que “alguma coisa mudou, desde o passado ano de 2003, principalmente no que respeita às mentalidades”. Todavia, as mentalidades continuam ainda a ser “o pior obstáculo” para pessoas com deficiência física. “Os senhores engenheiros e arquitectos insistem em fazer projectos de edifícios sem ter em conta as necessidades dos deficientes, mesmo que estejam sujeitos a coimas. São os intervenientes no processo que mais precisam de mudar a mentalidade”.
E serão, de facto, os intervenientes no processo os mais responsabilizados com o novo decreto-lei. A secretária de Estado adjunta da Reabilitação, Idália Moniz, explica ao Diário de Notícias que “a revisão vai responsabilizar todos os intervenientes no processo de construção e licenciamento, desde o projectista ao arquitecto, do técnico municipal que prepara a informação para ser aprovada pelo autarca ao próprio autarca, passando por quem acompanha a obra e a licencia”.
Mas, a grande novidade assenta no facto da responsabilidade recair individualmente e não sobre as instituições para as quais os intervenientes trabalham. Outra das mudanças diz respeito à criação de uma nova classe de fiscalizadores. As organizações não governamentais que representam os cidadãos deficientes podem intentar acções contra os infractores nos termos da Lei de Acção Popular, para que as normas técnicas sobre acessibilidades sejam garantidas.
Quando se verificar incumprimento da lei, 50 por cento das multas reverterão ao Fundo de Apoio à Investigação para a Reabilitação das Pessoas com Deficiência. A outra metade destina-se à entidade competente para a instauração do processo de contra-ordenação.

Um carro e mudança de instalações previstos para a região

O I Plano de Acção para Integração das Pessoas com Deficiência, que estará em prática até 2009, prevê também a criação de 20 unidades residenciais para cem adultos deficientes, espalhados por diversas zonas do País. Adelino Pais Fernandes diz ainda ter desconhecimento sobre esta medida, mas acredita que a região não irá ser contemplada com uma das residências. “O Interior é sempre o último em tudo. Basta lembrar que, aquando do Europeu de Futebol em Portugal, se fizeram campos em toda a faixa litoral e mais uma vez nós não tivemos direito a nada. Pode-se dizer que nós somos os quartos do Terceiro Mundo”, lamenta.
Quanto a projectos futuros a curto e a médio prazo, o presidente da APD do distrito de Castelo Branco garante que, para além da continuidade da campanha de sensibilização pelas gentes da Beira Interior, está em vista a compra de um carro e a mudança de instalações. No entanto, não esquece a “tarefa árdua” que tem pela frente para conseguir alcançar estes objectivos. “Nós somos apenas uma delegação distrital da Associação Portuguesa de Deficientes, em que a sede-mãe está situada em Lisboa. Sabemos o quanto estamos limitados e como os meios se encontram concentrados nas mãos dos senhores do Litoral”, conclui.