António Fidalgo

Modelos e valores


Os governantes portugueses procuram um modelo de desenvolvimento para Portugal. Há uns anos atrás foi o irlandês e agora é o finlandês. É, todavia, uma ideia peregrina e saloia julgar que o desenvolvimento recente de um país pode ser copiado sem mais ou que os procedimentos aí adoptados em determinado sector podem ser transplantados para um outro país. De todos os países devemos aprender o que de bom têm, mas isso não significa importar estruturas, processos ou políticas sectoriais como aliás, também, evitar, o que de mal têm.

Não são modelos que estão em causa, mas sim valores. O trabalho, o apreço pelo trabalho, a honestidade, a não corrupção, a sobriedade, a não ostentação, são valores em si que devem ser seguidos, independentemente de qualquer modelo. O modelo de Portugal só pode ser o modelo português e não qualquer outro, nem finlandês, nem irlandês, nem espanhol. As receitas que deram resultado noutros países podem não resultar em Portugal. Há particularidades nossas que condicionam a aplicação desses modelos e o levar a cabo essas receitas. Não quer isto dizer que somos inferiores ou piores (nem tão pouco que somos superiores ou melhores), apenas que somos diferentes e que é com a nossa história que temos de fazer contas, aprender dos erros, reforçar as virtudes e multiplicar os sucessos.

Os valores têm, ao contrário dos modelos, validade universal. A educação é, nas sociedades actuais, um importante valor, mas não é um modelo. Trata-se antes de tudo o mais de uma atitude, de uma maneira de ser, ditada pela religião ou pela cultura, e não tanto fruto de condições materiais. Um povo pode ter os professores mais bem pagos do mundo, as escolas mais bem equipadas, mas se não beneficiar de um espírito de trabalho, se o conhecimento não for valorizado em si, então nenhum modelo escolar, pedagógico ou científico pode colmatar essa falha.

O que se passa nos Estados Unidos é sintomático. Num mesmo sistema de ensino são os emigrantes asiáticos que mais apostam no estudo. As famílias fazem todos os esforços para colocar os filhos nas escolas de mais prestígio, e as universidades são vistas como a via privilegiada de ascensão e sucesso sociais.

Não se pode importar o modelo finlandês para Portugal pela simples razão de que a cultura, em particular a ética de vida, daquele país não é a mesma que a nossa. Falar de modelos de sucesso, julgar que basta importá-los para alcançar sucesso idêntico, é um doce engano. Aliás conhecemos bem o que temos de fazer: é corrigir as falhas, emendar os erros, esforçarmo-nos mais. O sucesso é afinal o resultado da via estreita ou difícil. Soluções fáceis, milagrosas, não existem. Não precisamos de modelos para sabermos o que temos de fazer: fazer bem o que fazemos, seja em que campo for.