Situações Caricatas *

Imagine o Sr. Director a seguinte situação:

Um aluno de uma conceituada universidade do interior do seu país deseja efectuar a melhoria da nota de uma disciplina já concluída num ano anterior. Consciente dos meandros burocráticos da sua universidade, o aluno desloca-se à entidade compentente por forma a pôr em curso o processo necessário aos seus intentos.
O aluno é então informado que deve pagar a módica quantia de 17,10 Euros, presume-se que por motivos administrativos, o que o aluno efectua imediatamente para evitar posteriores complicações burocráticas. O funcionário informa então que está tudo tratado, o aluno pode ir efectuar em descanso o seu exame de melhoria, e que deverá regressar se for bem sucedido (obter a melhoria da nota), após o lançamento da nota por nós (por eles), para ser ressarcido de uma parte da quantia que teve de desembolsar. O aluno sai todo contente e vai à sua vida.
Passadas umas semanas, o aluno efectua o seu exame, e milagre dos milagres, é informado pelo professor que conseguiu efectivamente melhorar a nota em causa. Agora o aluno só tem mesmo é de esperar que a burocracia siga o seu caminho, tendo em vista o melhoramento do aspecto do seu currículo, e obviamente os 8,55 Euros a que tem direito.
Entretanto vêm as férias académicas, as notas vão sendo lançadas às pinguinhas, os dias infernais são cada vez mais frequentes, mas a nota que ele aguarda mais impancientemente teima em não sair.
O Verão passa, as férias acabam, estamos já em Setembro e o aluno ainda aguarda o lançamento da nota que vale dinheiro. Todos os outros alunos da mesma disciplina já viram a sua nota lançada, mas o aluno aceita que esta demore mais algum tempo, afinal não é uma nota como as outras, esta tem inclusive uma pauta especial só para ela. Mesmo assim estranha a demora. Dirige-se então aos serviços em causa para indagar da demora, e, caso seja possível (sorriso disfarçado nos lábios do aluno), ser já reembolsado.
Afinal a Internet tem mesmo razão, a nota ainda não foi lançada. Mas que se passa, indaga o aluno, o que é que eu tenho de fazer para apressar as coisas. Nada, responde o funcionário, só tem que aguardar que o seu professor entregue a pauta ao seu Secretariado e que estes depois a façam chegar cá (lá). No entanto, e uma vez que a melhoria foi efectivamente conseguida, pode já preencher a Nota de Reembolso; agora, quando verificar o lançamento da nota basta dirigir-se cá e receber o seu prémio. O aluno ainda pergunta ao funcionário se este tem a certeza, é que a demora é muita. Não se preocupe, não se preocupe...
Ainda não totalmente convencido, o aluno abandona o local, debate-se agora com a consciência: são tantos os relatos de situações anómalas que já ouviu contar acerca dos mesmos serviços (situações bizarras até), a sua própria experiência anterior nunca foi muito positiva, mas, que diabo, relatos são relatos, um tipo nunca sabe se as pessoas estão a exagerar, quem conta um conto acrescenta um pouco, etc, etc. Não, há que ter fé nas instituições, afinal para que servem as despesas administrativas? Um pouco contrafeito, o sorriso lá voltou aos lábios do nosso jovem. Vamos esperar! Entretanto os dias vão passando, já está a chegar o fim do mês, as aulas começam já hoje e no news from the Internet.
Aproveitando a sua presença no local de ensino, a aluno decide-se a ir ao Secretariado em causa indagar da demora do lançamento da nota, afinal até conhece a funcionária e esta até é simpática e tudo. Vamos lá esclarecer o que se está a passar. Mas, qual não é a sua surpresa, a funcionária até já sabe do que se trata: É por causa da nota tal não é? É é, como sabe. Ah, o professor tem passado aqui, ainda está à espera que se inscreva para receber a pauta para lançar a nota. O quê? Mas já estou inscrito há tanto tempo, têm-me dito que só estão há espera da pauta! Pois é, mas antes de eles estarem à espera da pauta deviam-na enviar primeiro, e aqui ainda não chegou nada. A funcionária ainda ligou para a entidade competente, com vista a poupa-lo à indesejável deslocação, mas nada feito. O aluno tem mesmo de ir lá, ah e levar o recibo de pagamento, para provar que se inscreveu, os serviços poderem enviar  a pauta ao Secretariado, estes preencherem-na, devolverem-na e finalmente os serviços poderem lançar a nota oficialmente, uf.
O desânimo é total, afinal "Não se preocupe, não se preocupe" e o funcionário é que não se preocupou em verificar se o processo já tinha iniciado. Para não falar do primeiro funcionário, o tal que não lhe deu início. De cabeça baixa, demasiado farto para manifestar a sua ira, o aluno lá se dirigiu, explicou a situação, o novo funcionário pediu o recibo, Sim senhor, está pago. Mas... Pronto já está. Agora já está a caminho. Tem a certeza que..., é que da outra vez... Não se preocupe, agora é a sério. O aluno, já sem esperança, ainda pede uma explicação para o sucedido, mas esta sai vaga e não explica nada.
A vida continua, certamente durante esta semana o nosso amigo irá falar com a senhora do Secretariado, saber se a pauta já foi efectivamente recebida. Nestes casos todo o cuidado é pouco.
Imagine o Sr. Director agora que a situação descrita acima não provém de nenhuma obra de um novo Kafka português, mas que ocorreu aqui na Universidade da Beira Interior, cidade da Covilhã, Portugal neste nosso ano de 2005.
Bem sei que são acusações duras de incompentência, leviandade e irresponsabilidade as que emanam da situação descrita, mas que hei-de eu fazer? Escrever no livro de reclamações? Para quê? Algum tempo depois receber uma carta de atendimento da reclamação, talvez um pedido de desculpes, mas que não aquece nem arrefece? Não acha que uma situação destas merece uma divulgação maior, para que talvez alguém de direito sinta um rubor nas faces e tome providências para minimizar ocorrências similares?


Luis Aguilar, aluno

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