Anabela Gradim

Critério técnico e desconfiança


Nenhuma mãe ou pai em seu perfeito juízo desejaria que um filho, seja o 1º ou o 10º, nascesse num local sem as condições materiais e humanas necessárias à condução de um parto com segurança. Isto é, é possível que quando se trata da bandeira do clube de futebol local, ou do símbolo da junta de freguesia, razões bairristas se possam sobrepor à Razão propriamente dita. Mas isso já não é admissível quando o que está em causa é a saúde e a vida de mães e recém-nascidos.

Porque se batem, então, as populações, e as grávidas, das localidades cujas maternidades têm os dias contados, pela sua manutenção? Suspeição. Incredulidade. Déja vu.

A questão do encerramento das maternidades – que se desenrola em simultâneo com o drama do encerramento de escolas, postos dos correios, e outros serviços – não tem sido interpretada como aquilo que o ministro defende ser: uma questão técnica, de qualidade e segurança.

Porque se discute, e se resiste, à anunciada medida? Pelo óbvio: desconfiança das intenções e argumentação do ministro. Agravada pelo facto de, entre as fileiras dos que contestam as medidas, se contarem também médicos e obstetras.

Num País onde ano a ano se agrava o fosso entre a região mais rica – Lisboa e Vale do Tejo – e quase todas as outras; onde o Público titulava, há poucos dias, que o rendimento da 2ª região do País, Grande Porto, era um terço do de Lisboa e envolvente; onde o Governo se prepara para transferir para o sítio do costume a breve e (diz-se) bem sucedida aventura nortenha da Agência Portuguesa de Investimento; onde o encerramento de escolas – consensualmente reconhecido como necessário – não foi precedido por uma avaliação qualitativa das mesmas; onde o debate sobre a OTA chegou a conclusão nenhuma, portanto avança; esgrimir a razão técnica para sustentar o encerramento das maternidades só pode suscitar o previsível: desconfiança.

E no entanto, cidades que estão a 30 minutos de distância, ligadas por auto-estrada; ou, como sucede no norte, separadas por 20 ou 30 kms, necessitam do seu próprio bloco de partos? Claramente, não. E se isso implicar redução da qualidade e segurança nos serviços prestados, menos ainda. Mas face ao que têm sido as várias velocidades do desenvolvimento de Portugal nos últimos anos, vai ser muito difícil convencer os portugueses directamente atingidos da bondade deste último argumento.