Não trazendo nenhum discurso preparado, Vítor Serpa preferiu “arriscar conversar” e começou falando de um problema que considera existir na sociedade actual. O director do jornal A Bola refere que “actualmente as pessoas sentem-se mais distantes, seja ideológica, política ou mesmo desportivamente”. Para o jornalista isso “não faz sentido”, pois considera que “cada vez mais devemos sentir afecto”, considerando a “proximidade entre as pessoas essencial”. Deixando um elogio à iniciativa da Câmara da Covilhã em promover este espaço literário, Vítor Serpa confessa que o que mais gosta de retratar na sua escrita são as pessoas. “Às vezes esquecemo-nos das pessoas, nas empresas, nas escolas, vivemos uma nostalgia das pessoas e estamos muito virados para a questão do número”, explica o jornalista, dando o exemplo da estatística de acidentes ou desemprego e alertando que é preciso “ver por detrás da álgebra, percebendo a vida que há lá”.
Abordando a sua obra mais recente, Vítor Serpa explica que o objectivo do livro é retratar duas gerações, no antes e no depois do 25 de Abril de 1974. “Pensávamos que tudo estaria resolvido com a chegada da liberdade, mas agora reparamos que não resolveu a nossa vida, é preciso lutar no dia-a-dia”, atira o jornalista, que considera que agora existe “uma grande dificuldade em explicar aos filhos porque falharam o futuro”. Vítor Serpa confessa mesmo que teve e tem medo de publicar os seus textos, explicando que deseja publicar aquilo que os leitores mereçam ler, confessando sentir “receio que não mereça os leitores”.
Considerando que em Portugal “publica-se muita coisa sobre nada”, ou seja, não pela qualidade da escrita mas sim pela imagem de quem escreve, o director de A Bola sublinha ainda que muitos escritores distanciam-se das pessoas à medida que vão publicando os seus livros, afirmando que estes “perdem a alma e o coração” na sua escrita. Mostrando-se preocupado com os leitores, Vítor Serpa fez ainda questão de deixar uma palavra de “respeito pelas pessoas que continuam a combater pela literatura”. “Escrever é uma necessidade física, necessidade de escrever sobre o dia-a-dia, sobre as pessoas”, pessoas essas que espera que não fiquem com a sensação de perda de tempo ou de dinheiro, explica o jornalista.
“Vivo intensamente o desporto e a minha profissão”, confessa Vítor Serpa, que explica assim a sua “necessidade de fugir para a liberdade, para a escrita para além do desporto”. Sendo um homem ligado à comunicação e ao desporto, o director do jornal desportivo considera estes dois “os fenómenos mais marcantes do séc. XX” afirmando que “quando se unem é uma força brutal que não pode ser desconsiderada e que tem de ser tratada com cuidado, pois pode tanto criar coisas positivas como negativas”. Um exemplo de coisas positivas que o futebol pode trazer é a presença da selecção na Covilhã. Vítor Serpa explica que “o futebol tem um tributo a pagar à sociedade, que o elegeu como fenómeno de massas”, considerando assim a vinda da equipa das quinas para a Cidade Neve como “um tributo bem-vindo e inteligente”. Ainda sobre o “desporto rei”, o director de A Bola critica a “importância excessiva que o futebol tem na vida das pessoas”, considerando que este deve ter o seu espaço próprio e que falta ética e deontologia no desporto. Vítor Serpa avisa que “o futebol não é uma ciência exacta”, mas aqueles que tentam fazer transparecer isso acabam por ter uma “influência muito grande nas pessoas”.
Sobre o seu jornal, Vítor Serpa chama a atenção para o facto de ser “o único jornal estrangeiro em Angola”, afirmando que o objectivo passa por repetir o mesmo noutros países de Língua Portuguesa, como em Moçambique.
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