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Ateliers de esperança

Sara da Silva Alves em quarta, 26 de julho de 2017

ALGUIDAR, ValiCe, CINCO Atelier. Três nomes, três espaços e um só objetivo: revitalizar a zona histórica da cidade da Covilhã.


Para uns, uma zona ao abandono, esquecida por quem aqui vive. Onde pouco se passa. Onde quase tudo parece perdido ou entregue a si mesmo. Onde, ao final de cada dia, se espera ou se desespera por alturas melhores. Para outros, uma zona que reúne tudo aquilo de que precisam. Que renasce todos os dias. Que esconde ainda muitos segredos prontos a ser desvendados, ao longo de ruas que parecem nunca terminar, repletas de história e de arte. Fala-se da zona centro da cidade. Do centro histórico da Covilhã.

Rui e Liliana, da ALGUIDAR, Vera, da ValiCe, e Ana e Joana, do CINCO, encontraram no centro da cidade o sítio perfeito para tornarem os seus sonhos realidade. Paixões antigas que viram nesta zona as condições ideais para a criação de um amor maior. E nem só quem nasceu sob o olhar da Estrela teve esta vontade de apostar e fazer mais por esta cidade. Houve quem tivesse sido acolhido pela Universidade da Beira Interior e, depois disso, tudo se foi compondo para que aqui ficassem e quisessem dar o melhor de si a quem também deu muito por eles.

"Nós somos namorados. Eu sou o Rui, ela a Liliana. Estudamos ambos cá e a nossa vida profissional também se baseia aqui na Covilhã. Só que, a par disso, do trabalho de cada um de nós, começamos a criar esta marca, a ALGUIDAR". Vindos de Aveiro e Alvaiázere, respetivamente, foi na Universidade da Beira Interior que Rui Lopes e Liliana Ribeiro se formaram. No curso Design Têxtil e de Vestuário, cada um optou por uma vertente diferente - ele seguiu a do Têxtil, ela a do vestuário - e estas escolhas não foram por acaso. "A minha paixão é trabalhar com tecidos, malhas, estampados... tudo o que antecede a própria confeção em si. Mas a paixão pelas malhas já vem de muito cedo, muito antes da minha formação", explica o aveirense. A culpada por tal interesse, no melhor sentido possível, foi a sua mãe, que na altura tinha um tear manual no qual fazia artigos de vestuário. Da paixão, surge a ideia; com a ideia vêm as pessoas que ajudam a concebê-la. "A ideia inicial da marca é do Rui. Eu venho um pouco por atrelado, ajudando um pouco na parte da inspiração, na parte de confecionar", conta Liliana.

Apesar do atelier e da showroom só terem sido inaugurados no dia 13 de maio deste ano, a ALGUIDAR existe desde 2015. Nessa altura, a sede, se assim se pode chamar, era a própria habitação do casal. Aos poucos, Rui foi adquirindo o material de que precisava - alguma maquinaria, fios - e as coisas começaram a tomar outras proporções. Entre risos, recordam: "O nosso espaço em casa já não era o nosso espaço, era o espaço só da ALGUIDAR". Chegava assim a hora da mudança. Estava na altura de a marca ter um espaço só seu para que se desse a conhecer melhor às pessoas. E o que é que há para dar a conhecer? "Estamos a falar de algo que visa buscar todos aqueles pequenos tradicionalismos, o lado mais artesanal, e tentamos metê-los como inspiração na nossa marca. Daí surgem vários produtos têxteis lar, como almofadas, mantas, candeeiros ou puffs", explica Rui.

É também com base no tradicionalismo que vem o nome. Alguidar, esse objeto tão típico de Portugal. Liliana explica: "Pegamos na ideia do objeto tradicional. Além disso, agora começamos realmente com artigos têxteis-lar, mas, assim como um alguidar, em que podemos colocar lá qualquer coisa, também no futuro podemos vir a fazer vestuário ou outro tipo de artigos. O alguidar pode abarcar várias coisas".

Rui e Liliana não são caso único. Entre ruas e vielas, chega-se ao CINCO Atelier. É lá que está Ana Gonçalo, brigantina que correu o norte até vir estagiar para a Covilhã. Depois de ter estudado Design Têxtil, no Porto, tirou Design Multimédia, na UBI. Atualmente, junta o melhor dos dois mundos: é designer têxtil e trabalha como freelancer em design gráfico. Juntamente com Joana Sena, natural da Covilhã e arquiteta pela Universidade Lusíada, fez nascer o CINCO. Mas não é só aqui que se dá por elas. O atual logotipo do município da Covilhã? É da autoria de Ana. A remodelação de uma ala da Pousada da Juventude nas Penhas da Saúde? É um projeto que está nas mãos de Joana.

A Rua Jornal Notícias da Covilhã, a 7 de maio de 2016, via nascer o CINCO... no número 5. É daí que surge o nome. Mas cinco são também os sentidos e, neste espaço, quem fizer uma visita pode encontrá-los “no aroma das flores frescas, no sabor de um chá acolhedor, no toque dos tecidos, nas cores e formas das peças dispostas e no som da alegria acompanhada sempre por uma boa banda sonora”. A necessidade de dividir um espaço de trabalho onde fosse possível criar e fazer crescer novos projetos através da partilha de ideias foi o mote para a criação deste atelier. E é isto que ele é. “O CINCO é, antes de tudo, um espaço de trabalho. Um atelier que serve de palco para testarmos os nossos produtos e projetos, um local onde se partilham saberes e ideias. Serve também de showroom das nossas criações e das de outros designers emergentes ou que possuem um trabalho interessantíssimo que deve ser partilhado”, explica Ana Gonçalo.

Não há dúvidas de que a principal aposta do CINCO Atelier se baseia na partilha de ideias, na partilha de conhecimento. É no meio deste desdobramento de saberes que se podem criar produtos personalizados de acordo com o desejo de cada cliente que vão desde projetos de decoração a logotipos, passando, por exemplo, por estudos de uma embalagem. Reunem-se a arquitetura, o design de interiores, o design gráfico, a moda e o artesanato. Sim, o tradicionalismo, assim como acontece na ALGUIDAR, também aqui impera. E se gostar muito de algumas das peças expostas, ainda tem a oportunidade de as levar para casa, uma vez que se encontram à venda artigos criados pelas donas do CINCO e por outros artistas.

Subindo a rua que fica do lado esquerdo do Mercado Municipal, a Rua de Olivença, passamos a ALGUIDAR e podemos seguir caminho até ao CINCO. Mas, entre estes dois ateliers, há um outro espaço que também não deixa ninguém indiferente, criado por quem cá nasceu. Alguém que gostava de um conceito, que sonhou, e que pelas suas mãos fez então desabrochar a ValiCe. Já ouviu falar no "shabby chiq"? Vera Costa explica: “A ValiCe é uma loja com artigos mais vintage, assim com aquele aspeto mais rústico, o 'shabby chiq'. Uma forma de design de interiores, onde mobiliário e decoração são escolhidos pela sua aparência de idade e pelos sinais de desgaste”. Inicialmente sediado no Pelourinho, este cantinho, que parece saído de uma daquelas histórias de encantar, precisou de mais. “Tinha a necessidade de ter também um atelier, e como nessa loja não dava, mudei para aqui. Assim temos a parte de loja mesmo e uma outra parte com o atelier, onde trabalho muito a pintura e se fazem alguns workshops”, acrescenta.

Vera Costa sempre achou graça a este tipo de loja e de artigos e na conhecida Cidade Neve não exisitia nada dentro do género. Apesar de ser da Covilhã, não vive cá “frequentemente”, mas na altura tinha em mãos um trabalho na região que iria durar três anos pelo que estaria mais presente e reunia assim condições para abrir o seu estabelecimento. “Como eu gostava e não havia nada deste tipo na Covilhã, foi mesmo necessidade minha abrir este conceito”, diz. Este é um projeto paralelo, uma vez que Vera é fiscal de obras e trabalha na área. O nome vem da sonoridade da palavra francesa ‘valise’, apreciada por Vera: “Mas valise é mala e eu não ia propriamente vender malas. Então a minha mãe sugeriu ValiCe”, com as maiúsculas a corresponderem às iniciais de Vera Costa.

Encontra-se um bocadinho de tudo, na ValiCe, sendo a aposta, claro está, nos artigos vintage. Plaquinhas de decoração, relógios, candeeiros, velas, caixas, são só alguns dos vários tipos de elementos decorativos que se podem adquirir. A eles, juntam-se também pequenas esculturas, peças portuguesas que não são tão visíveis noutras lojas, principalmente nos grandes centros comerciais, e que ajudam o espaço de Vera a distinguir-se dos demais. Além destes artigos para revenda, no atelier cria-se. “Existe mais a parte da pintura, com óleo sobre tela, acrílico, panpastel,... E também se pintam móveis. Faço telas e algumas coisas por encomenda que acabam por ser um bocadinho nossas, até porque há pessoas que acabam por pedir coisas específicas”.

 

Covilhã, Cidade Neve, com história, que se diferencia e ajuda

Porta da Serra da Estrela, a antiga “Manchester Portuguesa” – assim conhecida noutros tempos devido à sua produção têxtil – vai-se então abrindo para quem nela quiser entrar. E permanecer. Vera e Joana são filhas da terra; Ana já cá vivia; Rui e Liliana regressaram por motivos profissionais, depois de ambos terem rumado a outras paragens quando concluiram os estudos na UBI, há cerca de dez anos. É então fácil perceber o porquê de terem escolhido a Covilhã. “O motivo principal para termos aberto aqui é por estarmos cá a viver. Sendo um atelier, um espaço de trabalho, e uma vez que somos nós a fazer tudo, tinha mesmo de ser. Mas é claro que temos bastante orgulho em que a sede da ALGUIDAR seja nesta cidade, que tem toda essa ligação com os têxteis e os lanifícios e que também tanto nos orgulha”, é Rui quem o diz e Liliana corrobora.

Com duas zonas muito distintas – a histórica, bem no cimo, e aquela que pode ser considerada como a mais comercial, na parte baixa – o que terá levado estas pessoas a escolher precisamente a primeira opção? Para Liliana, o motivo é simples: “O Rui sempre gostou aqui da parte histórica e mais antiga da cidade, e o facto de também estarem a nascer pequenos negócios, como o CINCO, que abriu numa altura em que andávamos a ver espaços, contribuiu. Aliado a isto, queríamos ter alguma visibilidade e sabemos que aqui, também graças aos roteiros de arte urbana e tudo, acaba sempre por vir mais gente. Lá em baixo, ao lado do shopping, seria totalmente diferente”.

“Eu, jamais, em tempo algum, iria para a parte baixa da cidade”. Vera não ouviu a opinião dos seus vizinhos, mas quase que se poderia pensar que sim, dada a prontidão da resposta que acaba por se assemelhar à deles. “Quando pensei abrir a ValiCe, sempre foi para ser no centro da cidade, pois eu acredito que este tipo de loja só faz sentido nesta zona”, acrescenta. Assim foi na primeira loja e assim é agora na segunda. Não se arrepende, pois mesmo que o fluxo de pessoas não seja tão grande, sabe, e di-lo de forma convicta e ternurenta, que está envolta num ambiente que não trocava por nada.

A questão do fluxo é, inevitavelmente, algo que dá que pensar e que levou a alguns momentos de receio ou de maior apreensão. A zona histórica da Covilhã, repleta de arte em cada canto, cheia de vivências em cada viela, carrega também consigo um fardo: o comércio tradicional, que integra estabelecimentos com vários anos, não atravessa uma boa fase e muitos foram aqueles que acabaram por ter de fechar as suas portas. Observar os dois lados da moeda e mostrar confiança e determinação é o segredo para, ainda assim, se apostar nesta localização. “Isso assusta-nos um pouco, mas, se formos a ver, estamos a falar de um comércio que acabou por estagnar e o público dessas lojas, se calhar já um pouco envelhecido, vai acabando por desaparecer. Além disto, ainda que fiquemos reticentes, a verdade é que nós sabemos o valor do nosso produto, sabemos que é diferenciador e achamos que isso vai ajudar a revitalizar um pouco a zona”, adianta Rui.

Da vontade dos novos e da persistência e luta dos antigos, surge uma relação de entreajuda que só traz benefícios a todos, como confirma Vera: “Claro que as lojas mais antigas aqui sediadas têm os seus clientes fixos que poderão não ser os nossos, mas eu acho que os donos sentem que o facto de haver gente a abrir, gente nova que traz um bocado mais de alegria, é importante. Acabamos todos por ser uma forma de trazer pessoas ao centro da cidade. E mesmo que os clientes de umas lojas não tenham nada a ver com os de outras, acabam por vir. Ainda não é com a frequência que gostaríamos, mas eu continuo a acreditar que com o tempo vamos conseguir”. Os próprios espaços mais recentes também acabam por se ajudar: “Por exemplo, o CINCO Atelier tem workshops e as pessoas que vão lá, acabam, eventualmente, por passar aqui, ou porque vêm a pé, ou porque vêm estacionar os seus carros. É sempre uma mais-valia”.    

Espaços pequenos, direcionados para coisas específicas e atuais, que se vão adequando ao público (ao contrário do que se verifica em algumas das lojas que contam ou contaram décadas de existência). A ALGUIDAR, a ValiCe e o CINCO entusiasmam os que já conhecem aquelas ruas como a palma das suas mãos e vêm agora um possível renascer, graças às suas chegadas. Mas é preciso mais do que chegar e ser novo. É preciso ser diferente. Distinguir-se de tudo o resto que possa ser concorrência.

“O que nos diferencia é mesmo a necessidade da partilha de saberes tradicionais. Aqui, damos a possibilidade de as pessoas entrarem e verem um atelier ‘vivo’. Chegam cá e, num dia, podemos estar a fiar, noutro a bordar, e por aí”, afirma Ana Gonçalo. No CINCO Atelier, faz-se de tudo um pouco para que não se percam de vez algumas técnicas ancestrais e tradicionais, criando assim “uma ponte de consciência para algumas artes manuais e artesanais”. O objetivo é que, desta forma, a população estudantil e residente possa usar tudo aquilo que aprende no CINCO, seja em contexto informal ou académico. A oferta de workshops é vasta: tecelagem, macramé, feltragem, organização de espaços, encadernação, scrapbooking, crochet, criação de sandálias, bordado, cianotopia, caligrafia... Aos fins-de-semana, Ana, Joana ou formadores convidados tentam tornar as atividades o mais interessantes possíveis “para que a pessoa seja autónoma e dê continuidade a projetos semelhantes em casa, superando-se”. Os materiais? Estão sempre incluídos.

Para os que gostam de workshops, de experimentar coisas novas e de se surpreenderem, na ValiCe também podem encontrar alguns, apesar de Vera “não conseguir fazer workshops com tanta frequência como gostaria”. Contudo, quando os faz, não se queixa da adesão. E há para todas as idades. “Os que se direcionam para as crianças são normalmente à base da pintura a óleo. Com os adultos, trabalha-se mais a madeira e a pintura da mesma”, acrescenta. Mas não são propriamente estas iniciativas que diferenciam a ValiCe de lojas semelhantes. Um conceito mais caseiro, ao invés do típico comercial, é o que torna este espaço único. “Eu queria criar um tipo de loja a que as pessoas gostassem de vir, nem que seja só para ver, para virem conversar um bocadinho ou simplesmente para estar. Eu sinto-me bem cá e acho que as pessoas, quando vêm, acabam por se sentir também. Queria que elas chegassem e se sentissem em casa, num ambiente acolhedor, onde tivessem sempre música, onde se sentissem bem”, conta a proprietária. Em breve, estará concluído o site que vai permitir compras online (por enquanto, as muitas encomendas são feitas via Facebook).

Na ALGUIDAR, desde logo se procurou pelas marcas que, eventualmente, poderiam ser concorrentes na área dos têxteis-lar. E Liliana bem sabe quais são as características diferenciadoras: “O principal é mesmo o facto de as nossas malhas serem feitas em tear manual. A maior parte dos produtos de têxteis-lar que vemos em malha são feitos em teares industriais, em muita quantidade. Aqui não. Nós fazemos séries limitadas e em tear manual”. A conjugação de cores “mais atrevida” e as mantas entrelaçadas (que são mesmo resultado de várias tiras de malha entrelaçadas – o best seller da marca) fazem com que os produtos da ALGUIDAR se tornem inconfundíveis. Como Liliana e Rui têm horários de trabalho diferentes, torna-se complicado definir um horário certo para que o o espaço esteja aberto ao público, mas sempre que ambos estão na ALGUIDAR, as pessoas podem entrar, ver o processo de fabrico das peças, escolher aquilo que mais gostam e fazer a encomenda online, pois a ALGUIDAR não é propriamente uma loja, e sim uma showroom, não vendendo lá os seus artigos. Contudo, muito graças ao facto de participarem em várias feiras e exposições nas zonas de Lisboa e Aveiro, Rui e Liliana conseguiram dar o “salto maior” e começaram a vender em lojas (A Desconfiada, em Aveiro; Casa Mãe – Concept Store, em Lagos; Flores – Creative Consept Store, no Porto).

 

Um incentivo para os estudantes?

A Universidade da Beira Interior recebe estudantes de todas as zonas do país, e também do estrangeiro, que põem a cidade a mexer, principalmente durante o período letivo. A região interior de Portugal não tem fama de ser propriamente atrativa, uma vez que as grandes oportunidades, os grandes centros, se encontram maioritariamente no litoral do país, mas há quem vá contra esta ideia, tão consolidada entre os portugueses, e arrisque em ficar na Covilhã, já depois de concluídos os estudos. Um bem maior para a cidade, que acaba por se renovar. Aconteceu com Ana Gonçalo, Rui Lopes e Liliana Ribeiro, por exemplo. Será que as apostas feitas pelo quinteto empreendedor servem de incentivo para que os estudantes se fixem cá e criem os seus postos de trabalho?

“Eu acho que sim, que é um incentivo, mas compreendo que quem venha de fora perca um bocadinho essa vontade. Às vezes há dias menos bons, em que não aparece ninguém, mas o facto de eu ser da Covilhã dá-me alento, coisa que poderia não acontecer se eu fosse de outra cidade, pois pensava ‘oh, não vou apostar aqui, vou apostar noutro sítio’. De qualquer forma, acredito que isto lhes possa dar vontade de abrir ou arranjar conceitos do género nas localidades deles, pois acredito muito que o futuro vai passar por lojas assim”, adianta Vera Costa.

Rui ficaria muito satisfeito se fosse “um impulsionador”, mas sabe que é complicado, pois “o interior do país continua a ser o interior do país” e isso acaba por afetar de alguma forma. E acrescenta: “Temos bastante orgulho em estarmos aqui fixados, por todas as razões que já mencionamos, mas torna-se complicado, enquanto negócio, pensar única e exclusivamente na Covilhã”. “É difícil gerir e abrir negócios tendo em conta toda a população que é realmente daqui” - começa por explicar Liliana – “pois a verdade é que a cidade é muito sazonal: vive quando os estudantes estão cá; quando não estão, morre. E a gente apercebe-se disso, em muito negócios que fecham, pois acho que eles não preveem realmente uma época mais baixa, onde não há estudantes”. Entristecidos pela perda do comércio tradicional, o casal fica com a esperança de que os ubianos lhes sigam as pisadas e que, tal como eles, implementem as suas ideias numa cidade que lhes abriu as portas.

Ainda não fez um ano desde que a ALGUIDAR começou a apresentar os seus produtos ao público, participando em alguns mercados. Mas a verdade é que a aceitação tem sido sempre fantástica, de acordo com os seus criadores. “O público gosta muito do produto, principalmente dos nossos modelos entrelaçados. Gostam dessa diferenciação, do colorido, da nossa preocupação no uso de fibras naturais, como o algodão e a lã. E sempre que há uma conversa mais aberta com o cliente ainda há uma maior valorização por parte deste, pois percebe realmente o trabalho que está por trás de cada artigo”, adianta Rui.

ValiCe, a vizinha de cima, também regista um balanço positivo. Apesar de não se verificar um “crescimento enorme”, Vera Costa sente que, mesmo tendo mudado de rua, as pessoas acompanharam-na: “Há quem venha especificamente à procura de determinadas peças, ou seja, já vêm especificamente porque sabem que aqui vão encontrar um determinado artigo que não encontram noutro lado. Portanto o balanço é positivo, não posso dizer o contrário”.

Estão assim dados os ingredientes para o sucesso da revitalização do centro histórico da Covilhã. Sucesso esse que já se comprova, de acordo com Ana Gonçalo, do CINCO: “Acreditamos que o centro será um centro vivo novamente. Nós trabalhamos todos os dias para trazer pessoas para o lado de cá da Câmara e, na verdade, o balanço tem sido muito positivo. O centro histórico começa a ser cada vez mais visitado”.

Para quem ainda não o fez, ficam sugestões. Na ALGUIDAR, principalmente aos fins de semana, quem quiser pode ir, ver como tudo se processa e como nascem as ideias ou, quem sabe, até mesmo participar. “Queremos que as pessoas vejam esse valor”, salientam.

Na ValiCe, encontram sempre alguém com quem conversar, podem tirar ideias para projetos futuros ou novos conceitos; têm alguém que incentiva a que não se perca a vontade de criar algo próprio.

No CINCO, podem consultar-se livros, pedir explicações de tudo aquilo que se pode fazer, ver a tradição e o bom gosto sempre de mãos dadas.

Numa época difícil, numa zona que ainda não convence todos, surgem espaços de esperança, vêm-se sonhos tornados realidade. A história, já há muito unida à arte, visível em cada parede, em cada muro, vai criando a magia necessária para o aparecimento de novos conceitos. Nas palavras de Fernando Pessoa: “De sonhar ninguém se cansa, porque sonhar é esquecer, e esquecer não pesa e é um sono sem sonhos em que estamos despertos”. Que se continue então a sonhar. Sonhar para revitalizar.

 

Há sempre mais a visitar     

Conhecer os novos cantinhos do centro histórico, implica conhecer também a A Tentadora, que no decorrer desta reportagem se via a braços com a organização de mais uma edição da WOOL, Festival de Arte Urbana da Covilhã. Situada na Rua Alexandre Herculano, este espaço, que era uma antiga mercearia de 1935, foi completamente restaurado. O projecto atual tem três vertentes diferentes: um cowork vocacionado para as áreas criativas, uma loja de produtos de design de autor, artesanato e alimentação gourmet de origem portuguesa e uma sala de exposições com programação cultural de pequeno formato. 

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