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Guitarra, voz e sentimentos com Valter Lobo nos “Sons à Sexta”

Ricardo Morais em quarta, 14 de fevereiro de 2018

Valter Lobo é o artista que se segue nos “Sons à Sexta”. No próximo dia 16 de fevereiro, o palco da Moagem, no Fundão, recebe o poeta cantor para um espetáculo que o músico promete ser “intimista”. O Urbi et Orbi e a Rádio Universitária da Beira Interior estiveram à conversa com o autor de “Inverno” e “Mediterrâneo”, trabalhos que convidam os ouvintes a viajar pelo mundo da música e dos sentimentos.


Urbi@Orbi: Como é que surge a relação do Valter Lobo com a música?

Valter Lobo: A relação foi natural, desde sempre gostei de música, embora não tenha ninguém na família ninguém ligado diretamente à música, mas sempre ouvi música e a certa altura tive de começar a aprender a tocar guitarra sozinho, e a cantar as músicas que eu queria tocar, dos artistas que eu gostava, e depois comecei a criar as minhas canções, há muitos anos. Só mais tarde é que me dediquei, já adulto, a fazer as minhas canções, da minha autoria.

U@O: Que importância tiveram os “Wood Spirit” naquilo que é hoje o Valter Lobo e o seu percurso musical?

VL: Os Wood Spirit? Que engraçado, já não me lembrava de ninguém perguntar sobre isso. Foi uma pequena banda entre amigos, universitários, e foi às tantas que eu comecei a desenvolver mais a escrita direcionada para gravar, para tocar, mas foi um projeto assim muito experimental. Foi fundamental pela experiência. Mas engraçado que já ninguém me perguntava por isso há muitos anos.

U@O: Existe algum motivo para se trocar uma potencial carreira no direito pela música? E podemos dizer que Valter Lobo é o primeiro músico jurista ou será um jurista músico?

VL: Isto é assim, eu ainda não troquei definitivamente a carreira do direito pela musical. Eu ainda continuo a fazer algumas coisas, agora muito mais ligadas também à parte da música, ou seja, direcionei o direito para a música, neste momento para os direitos de autor e direitos dos artistas, onde ainda estou a trabalhar. Agora não sou um advogado de cidade, um advogado de tratar dos divórcios, das partilhas, é uma coisa mais interessante um bocadinho. Não é o primeiro nem há de ser o último. Só em Portugal temos alguns casos, como por exemplo o Adolfo Luxúria Canibal dos “Mão Morta”, temos o Miguel Guedes dos “Blind Zero”, que são músicos e juristas.

U@O: Quais é que são as referências ou influências musicais do Valter Lobo?

VL: Há muitas influências, mas gosto sempre de basear-me agora em alguns nomes principais, ou alguns artistas principais, Singer/Songwriters como o Damien Rise, como o Ryan Adams, como o Bon Iver. Mas também vou buscar tudo o que há de portugalidade e da música portuguesa, de alguma forma, a sensibilidade da música portuguesa. Ou seja, não pretendo seguir ninguém, é um trabalho de autor, no entanto, posso sempre destacar esses dois ou três artistas, como o Glen Hansard até, que são artistas que sozinhos e a solo, conseguem só com guitarra e voz, e com as suas palavras, fazer a música. Posso indicar esses.

U@O: De que forma é que essas influências estão presentes nas músicas do Valter Lobo?

VL: Pela sensibilidade que transmitem, pelas sensações, ou seja, são artistas que têm sempre uma intensidade muito grande quando tocam e são demasiado emotivos. E isso para mim é a diferença entre a maioria das bandas que tocam música por tocar, ou fazem uma música sem realmente sentirem o que estão a tocar. Isto às vezes é o que eu penso, posso estar certo ou não, é só uma opinião.  

U@O: Pode-se dizer que o Valter Lobo é o one man show, não apenas em palco, mas também fora dele? Existe algum motivo para ser o Valter a tratar da parte criativa, da promoção, do agenciamento...

VL: Também nunca tinha pensado nesse aspeto, pode ser uma maneira disso. Eu às vezes o show dá-me a ideia de que sou um homem de espetáculo e de fazer espetáculos e lembra-me de coisas muito grandes. Eu não gosto de coisas muito grandes, nem de concertos muito grandes, nem de muita produção, gosto de coisas mais pequeninas e intimistas, e que seja um momento de partilha e especial, quase espiritual, e não o próprio espetáculo. Eu também já não vou a espetáculos grandes, já não gosto.

U@O: O facto do tema “Pensei que fosse fácil” fazer parte da coletânea Novos Talentos Fnac 2012 foi uma importante rampa de lançamento para o Valter Lobo?

VL: Sim, definitivamente. A Fnac acabou por dar um carimbo e é sempre importante no inicio termos um carimbo, ou sermos distinguidos entre os demais, por uma instituição, se assim posso dizer, não quero chamar empresa, como a Fnac, e que acaba por distinguir e dá sempre um balanço, dá sempre um embalo para continuarmos a trabalhar. Foi muito importante.

U@O: Primeiro o EP “Inverno”, depois o disco “Mediterrâneo”, como é surge o nome para os trabalhos?

VL: Surgem sempre através das sensações, dos momentos, ou seja, o “Inverno” estava num momento às tantas mais reprimido, mais resguardado em casa, e um sentimento de maior melancolia. Já o “Mediterrâneo” já foi uma viagem dessa cabana, dessa casa numa montanha no inverno, para junto do mar. Ou seja, não foi assim tão descabido, faz parte de um percurso, de uma viagem. Ou seja, estão os dois de alguma forma ligados, e todas as canções e os títulos, ou seja, não é por acaso.

U@O: É mais o que une ou o que separa os dois trabalhos? Como é que descreve cada um dos álbuns?

VL: É mais o que une, embora separe. Os dois trabalhos estão ligados, é como a vida, há momentos melhores, há momentos piores. Há momentos em que nos sentimos de uma maneira, depois de outra, ou seja, estão unidos de alguma forma, tal como a nossa vida está ligada, entre os vários momentos que passamos. O “Inverno” é virado para dentro, são canções viradas para dentro, e o “Mediterrâneo” são canções feitas de dentro para um corpo que quer sair, quer ir para fora, quer estar mais perto das pessoas, quer ter outro afeto. Talvez pudesse ser assim a melhor maneira de os descrever.

U@O: As letras das músicas são sempre muito profundas. Como é o processo criativo? Pode-se dizer que o Valter Lobo escreve poesia que depois canta?

VL: É bonito ser entendido assim. O processo criativo é simples, eu tenho exatamente na cabeça o que é que quero cantar, ou seja, a mensagem. Depois de ter a melodia da guitarra ou de outro instrumento qualquer, depois começo a desenvolver o poema, mas a mensagem eu sei exatamente o que queria dizer. Por isso o processo criativo parte muito daí, não há aqui esquema nenhum, nem ficção nenhuma, já sei o que quero dizer e escrevo.

U@O: “Inverno”, “Mediterrâneo”, o que é que se segue em termos de álbuns e para quando?

VL: Vou ter mais um álbum em 2019, vou começar a prepará-lo, já tenho algumas canções, mas ainda não tenho nada definido, enquanto sentimentalismo ou denominação do disco, mas a seu ponto, a vida ou este percurso, vai-se encarregar de mo dizer. Por isso no inicio de 2019, certamente que sim. Entretanto vou ter outros trabalhos, mas só para 2019 é que haverá um novo álbum, que espero que seja muito bonito.

U@O: Como foi tocar na primeira parte do concerto de Eddie Vedder?

VL: Foi muita gira, isto foi uma surpresa. Não foi um convite para tocar antes do Eddie Vedder, foi um convite a uma ida ao palco por parte do Glen Hansard, que gosta das minhas canções, e que decidiu que eu devia tocá-la naquele momento, perante aquelas cinco mil pessoas em Amsterdão, e foi uma experiência diferente, e uma surpresa. Ainda por cima agora, pela ligação que tenho com o Glen, de quem sou amigo, e pronto, é sempre uma experiência diferente. O facto de estar Eddie Vedder à escuta é sempre engraçado, como é que a vida de repente nos faz cruzar com isto. Como é que um simples músico independente de repente está no mesmo sitio e no mesmo palco, é sempre engraçado.

U@O: Alguma vez pensou em cantar em inglês?

VL: Não, às vezes meio em jeito de brincadeira as pessoas vão falando, “vamos fazer umas coisas em inglês”, mas acho que não faz sentido. A minha língua materna e que domino, se assim posso dizer, é o português. Farto de mau inglês já está o mundo, por isso acho que faço bem em continuar a cantar em português.

U@O: Como é que o Valter Lobo vê a música que atualmente se faz em Portugal?

VL: Acho que estamos num bom momento, muita música boa, muita gente nova a fazer coisas novas, tenho esperança... De outra forma também às vezes chateio-me um bocado pelo facto de estarmos a copiar artistas internacionais e querermos ser artistas como os que estão lá fora e que são da moda, com o hype, e isso depois mais tarde acaba. E o que quero dizer com isto é que acho que devemos ser mais originais, mais nós, e não tanto ligar ao que se faz lá fora. Por isso às vezes isso é uma crítica que faço. Às vezes ouço os novos projetos, que são bons, têm muita qualidade, os artistas são muito bons, mas acabam sempre por me fazer lembrar outra coisa qualquer, que já ouvi. Mas por outro lado estamos às tantas na fase mais produtiva de sempre e com mais qualidade de sempre.

U@O: Como surge ida aos Sons à Sexta? Tem acompanhado a iniciativa e os artistas que têm passado pelo Fundão?

VL: Sim, tenho acompanhado desde sempre. Houve um convite, houve um diálogo entre mim e a organização, até foi com o Toni Barreiros, e decidimos que seria a altura certa para o fazer, e acho que é uma iniciativa muito interessante no Fundão. E se todas as terras tivessem iniciativas dessas, acho que seria muito melhor para a música nacional, para o panorama musical nacional e para as cidades que apostam em música nova, em música independente, em novas estratégias para a trazer, e que não compram o catálogo habitual. Por isso há que dar os parabéns a isso e estou muito feliz por poder estar aí presente.

U@O: O que podem esperar os espetadores que forem ver “Valter Lobo", no dia 16 de Fevereiro, às 22h30, no palco d’A Moagem, no Fundão, nos ''Sons à Sexta"?

VL: Vamo-nos conhecer, que é o mais importante. Vão conhecer o meu trabalho, espero proporcionar um momento diferente, que seja um momento mais intimista, que seja um momento de ligação, de contacto e de partilha, e que não é mero entretenimento, mas é uma ligação espiritual, se assim posso dizer. Estão todos convidados a ir, e vai ser uma noite muito bonita.

U@O: “P’ra Sentir Mais Dou De Mim Mais”, “Mediterrâneo”, “Oeste”, “Tenho saudades”, “O Governo Não Sabe Nada Do Nosso Amor”, “Guarda-me Esta Noite”; “Fora Do Coração”; “#Supernós”; “Quem me dera”. Que música escolheria em jeito de convite às gentes da beira para assistirem ao concerto de “Valter Lobo"?

VL: Eu sou uma pessoa mais nostálgica, mas deixaria o “Oeste”, para nos abraçarmos e para nos alterarmos. Por isso deixaria a faixa três, “Oeste, como despedida. 

GeoUrbi
GeoUrbi:  Guitarra, voz e sentimentos com Valter Lobo nos “Sons à Sexta”