Wool
as cores de uma cidade





por 
Ana Margarida Rodrigues
Carolina Fernandes
Cristina Guerreiro
Diogo Parente

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“Perto do céu, longe do mar” assim cantam os trovadores da Tuna Académica da Universidade da Beira Interior (UBI) – Desertuna. Localizada no interior do país, a Covilhã é porta de entrada para a Serra da Estrela. As ruas estreitas e íngremes desafiam a população envelhecida pelas calçadas fora, temperadas pelo frio durante o inverno, e pelo calor abrasador, no verão. Com o desenvolvimento da UBI foi possível atenuar a pacatez envelhecida da cidade com a vivacidade dos estudantes. O sentimento de solidão desvanece-se durante os períodos escolares, assim como, o silêncio avassalador das ruas que a lua ilumina. No entanto, era necessário algo mais… 


 Ainda adolescentes e inspirados pelos graffitis do sul de Espanha, os irmãos Pedro Seixo Rodrigues e Lara Seixo Rodrigues, naturais da Covilhã, começaram a ganhar o gosto pela arte. Mais tarde, em Lisboa, depararam-se com a realidade da arte urbana (termo mais abrangente para classificar toda a arte de rua, incluindo os graffitis). Também influenciados por festivais de arte urbana na Europa, nomeadamente o FAME FESTIVAL em Itália e o Nuart na Noruega, os irmãos encontravam-se na missão de trazer o conceito para a Cidade Neve.


Este projeto concretizou-se em 2011 com o arranque do Festival de Arte Urbana da Covilhã – WOOL. Foi um início auspicioso que contou com “apoios pontuais da Direção Geral das Artes (DGArtes), onde apresentámos uma candidatura que foi aprovada e financiada” salienta Pedro Seixo Rodrigues. Este projeto atua não só na Covilhã, como também em outras cidades dentro e fora do país. A nível nacional podemos encontrar obras da curadoria do WOOL no Lx Factory, em Lisboa.

Com as ideologias assentes na Covilhã, começou a haver uma projeção das intervenções no centro histórico da cidade. As ruas taciturnas vestem agora as cores acolhedoras que o WOOL veio trazer.
 Os murais não são apenas paredes pintadas, são histórias da cidade e da sua gente.  Depois de um ano de 2017 fustigado por incêndios, foi no verão de 2018 que os Bombeiros Voluntários da Covilhã (BVC) viriam a ser homenageados pelo WOOL com uma intervenção numa das paredes da instituição. Conta-nos Fernando Lucas, comandante da equipa: “Já tínhamos pensado várias vezes em pintar aqueles muros (…) só que depois surgiu a proposta do festival urbano WOOL e logo, de bom grado, cedemos a parede”.  

O tema da obra foi escolhido pelo WOOL e pelo artista espanhol Roc Blackblock, que se inspirou nas homenagens recorrentes aos bombeiros do seu país. Apenas mais tarde a cooperação ficou a saber que iria ser uma homenagem. Cada gota de tinta tem na sua essência uma história real. “A representação do incêndio com os bombeiros a tentar dominá-lo foi inspirada numa fotografia nossa. É real.” revela o comandante. Desta forma, o WOOL glorificou não só os bombeiros da Covilhã, como também todos os bombeiros portugueses. 


Para além do mural dos bombeiros é possível contabilizar mais 30 obras de arte urbana. De entre os 30 artistas, destacam-se Vhils, Pantónio, Tamara Silva, Samina e Bordalo II. Sobre este último, Pedro Rodrigues, afirma que “talvez o Bordalo seja aquele nome que não era muito conhecido quando cá veio, mas que depois pela parede ter sido considerada, em 2014, uma das mais conhecidas desse ano a nível internacional, ficou dentro das 25 paredes mais populares e acabou por ter muita projeção lá fora”. 

Mobirise

BORDALO II

Bordalo II é, então, o autor do emblemático mocho, intitulado de “Owl Eyes”. O mocho feito a partir de lixo e sucata, simboliza cultura e sabedoria, apelando ao desenvolvimento da zona histórica da cidade neve. Carolina Duro, aluna de Ciências da Comunicação da UBI, afirma que “o mocho é talvez a obra mais memorável do WOOL”


SAMINA

Um dos artistas de arte urbana mais conceituado do país deixou a sua marca na 3ª edição do festival – EXTRA WOOL, em 2015. O seu trabalho é caraterizado pela junção de retratos e de formas geométricas. Sendo que todas as obras têm uma história, a da intervenção de Samina com a obra Sr. Viseu é muito peculiar. Antigo operário dos lanifícios, ex-jogador do Sporting da Covilhã, ex-treinador de atletismo e morador do centro histórico. Foi em 2011 que o fundador do WOOL teve o primeiro contacto com o Sr. Viseu “quando lhe tirei um retrato e o entrevistamos para um projeto de fotografias que esteve na antiga fábrica” revela Seixo Rodrigues. “Em 2014, quando convidamos o Samina para vir e sabendo que o trabalho dele é à base de retratos e de formas geométricas, ficamos logo naquela situação de quem é que vamos retratar porque é sempre complicado escolher quem se vai retratar” continua. Com o objetivo de que “as intervenções do WOOL tivessem sempre a ver com a cidade, a sua história ou com a região, na altura pensamos logo no Sr. Viseu que seria a pessoa certa para, no fundo, identificar o que é uma pessoa da Covilhã.” 

Pedro Seixo Rodrigues confidenciou-nos o momento em que o retratado ficou muito “emocionado e honrado”: Ainda os andaimes tapavam aquilo que seria o retrato final, e o Sr. Viseu, acompanhado pelo seu neto, cruzou-se com o artista, na rua das Portas do Sol. Samina estava a verificar o seu trabalho de longe, quando reconheceu o ex-operário, questionando-o se não se reconhecia no retrato. Sr. Viseu respondeu negativamente. O seu neto inocente e convictamente repara e exclama “Não vês que és tu, avô?!”


"O objetivo é que as intervenções do WOOL tivessem sempre a ver com a cidade, a sua história ou com a região"

Pedro Seixo Rodrigues


Apesar de, hoje em dia, o WOOL ser um projeto firmemente estabelecido, nem sempre foi assim. No início do projeto, em 2011, o principal apoio foi da DGArtes, como já referido. O mesmo não se passou em 2012, em que não houve apoio algum e o artista convidado (Kram), apenas participou pela sua projeção, não recebendo honorários. Na edição de 2013, continuando a não haver apoios, o festival viu-se obrigado a migrar para a capital, para o que seria o WOOLOnTour, intervindo no LxFactory.

 Só em 2014 é que o WOOL voltou a ser apoiado pela DGArtes e pela Câmara Municipal da Covilhã (CMC), sendo que o custo médio de cada edição pode rondar os 30 mil euros. Apenas em 2017 é que a CMC decidiu apoiar o festival, depois da organização ameaçar acabar com o evento, em 2016. Assim sendo, as edições de 2017, 2018 contaram com o apoio da Câmara.
 “Em 2019 haverá novamente o festival na primeira, segunda semana de junho. Ainda não temos artistas. Temos em vista algumas paredes, mas o nosso intuito é continuar e tentar fazer sempre igual ou melhor do que temos estado a fazer até agora” afirma Pedro Rodrigues.


Créditos

Todas as fotos utilizadas neste trabalho pertencem a
Pedro Seixo Rodrigues e Lara Seixo Rodrigues
do WOOL – Festival de Arte Urbana da Covilhã.


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