COVILHÃ cidade?


Francisco Paiva

Os limites da Covilhã preocupam-nos pela óbvia necessidade de ponderar a
forma de transição, fusão ou distinção entre os domínios do urbano e do
rural, quer em termos de densidade e diversidade como de qualidade(s) dos
distintos espaços.
A emergente Baixa da cidade, pela escala das distâncias, está claramente a
impôr como condição de residência o uso do automóvel particular, sem que se
vislumbre a sua cobertura com uma rede de transportes colectivos urbanos que
dissuadam os fluxos de atravessamento gerados nesse perímetro.
Esta imensa área do sopé da encosta mostra-se nostálgica e
confrangedoramente refém do esclerosado arquétipo da "Casa Portuguesa": umas
vezes materializado em "vivenda", outras vezes interpretado à luz da douta
razão lusa nas postiças autenticidades tipológicas de T2 e T3's.
Urge optar entre a construção em extensão, esparsa e deconexa, e a densa, em
altura, libertando terreno arável, rentabilizando a área e aproximando
pesssoas e serviços. Neste particular, a discussão anda centrada quase
exclusivamente no número de pisos, factor de análise não qualitativo que se
deva sobrepor à forma, quer dizer: a qualidade estética e funcional de um
imóvel depende mais do seu desenho do que da sua volumetria.
A figura do Plano Director Municipal deveria significar modelo/conceito de
expansão urbana pretendido, afastando-se progressivamente do estigma de
lesa-património que os epítetos de loteamento e urbanização representam.

Além da qualidade particular da construção e das vias de tráfego, uma cidade
precisa de avenidas, quais alamedas ou «boulevards», que evoquem os remotos
pressupostos do urbanismo hipodâmico (de Mileto) ou da cidade renascentista,
inspiraradores do civismo positivista, de valores, porque não dizê-lo,
humanistas. Deve, portanto, ser feita com áreas pedonais, praças de
encontro e respiração e considerar a priori áreas de lazer, promoção e
divulgação de cultura.
A canalização de recursos para o centro não pode esquecer a qualidade de
vida das periferias, sob pena destas virem a enfermar dos consabidos
problemas suburbanos.
Parece haver consenso sobre a não exclusividade da responsabilidade dos
promotores privados na construção do espaço público, todavia deve ser-lhes
exigido que no momento da conclusão dos imóveis os atinentes espaços
exteriores hajam sido cuidados.

Assistimos recentemente às sentenças difundidas na inflamada imprensa
regional, sobre o silo-auto, os túneis, as propaladas fraudes urbanísticas,
o Polis e os discursos dos pré-anunciados candidatos autárquicos que, a bem
da Nação, encarnam a sempiterna aura despótica do iluminado por cuja
intercessão, este Povo de Deus proscrito, espera a salvação.
A não coincidência entre as prioridades dos políticos e as do cadáver do
País torna a paisagem construída portuguesa num referente material de
incivilidade.