José Geraldes


Lugar da ética

Vida sem ética tem o sabor do vazio. Política sem ética destrói os princípios do poder. Economia sem ética leva à corrupção dos cidadãos. Relações sociais sem ética degradam o espírito humano. Sociedade sem ética afunda-se no pântano dos valores.
A História demonstra que, onde desaparece a ética, se abrem os caminhos a todas as perversidades. A agonia da ética na sociedade apresenta-se sempre como consequência da negação de princípios fundamentais que devem balizar os comportamentos humanos e as relações sociais.
É um facto sem contestação a existência de um défice de ética na sociedade portuguesa. Défice que se confunde com uma "crise da sociedade e do seu alicerce moral, com notórias repercussões políticas e sociais", nas palavras textuais do recente Manifesto da SEDES.
Outra crise apontada pela SEDES : a da confiança. A este propósito, é oportuno citar um inquérito a nível europeu sobre a confiança. Neste inquérito, 76 por cento dos portugueses, a taxa mais alta dos europeus, dizem que "nunca se é cuidadoso de mais com os outros". Ou seja, desconfiar sempre. Mas a desconfiança conduz ao nível zero as relações sociais.
A crise da ética e da confiança gera um estado de espírito desmobilizador. A SEDES traça o retrato : "Crise de confiança no futuro, nas capacidades próprias, nos dirigentes e nas elites.(...) Vive-se em ambiente de desânimo e de desorientação, onde pontua o conformismo para com uma sensível degradação comportamental de que sobressaem o oportunismo e o chico-espertismo, a falta de rigor e a indisciplina, a irresponsabilização e um empobrecimento da ética pública."
E depois há o florescimento do egoísmo mais feroz. Muitas vezes disfarçado sob um verniz de solidariedade que mais não passa de auto-
-promoção pessoal. Para efeitos de ocupação de certos lugares desejados. E para se ter boa imagem e até tranquilidade de consciência burguesa.
Mas, se for preciso pontapear a ética para alcançar os fins, à boa maneira maquiavélica, não há escrúpulos que resistam.
Torna-se, pois, imperioso para regenerar o tecido social, restaurar os "princípios éticos". A SEDES aponta o caminho: "Recuperar a ética como referência fundamental da vida económica e social, promovendo a generalizada adopção de boas práticas e assim fortalecendo a confiança recíproca dentro da sociedade, reconhecido factor fundamental de desenvolvimento."
Resta saber quem está disposto a percorrer este caminho. Depois de hábitos adquiridos de desprezo das leis, de tudo se facilitar, de não respeito por regras, é preciso duplicar esforços para se atingir o equilíbrio de uma sociedade adulta. E não só a nível nacional como também local e regional.
Basta olhar à nossa volta e saltam logo à vista os atropelos à ética. Nos vários domínios de actividade.
Se repetíssemos a experiência de Diógenes à procura de um Homem ao meio-dia com uma lanterna acesa na praça principal de Atenas, onde encontraríamos hoje a ética a orientar as actividades sociais ?