"Nenhuma universidade ensina tudo"
Entrevista a Rogério Palmeiro
"Adaptamos os interesses dos alunos à realidade empresarial"

Com apenas 25 anos, Rogério Palmeiro está à frente do Gabinete de Estágios que existe desde 1996. Este organismo tem como função fazer a ligação entre as empresas e a Universidade. O objectivo é enquadrar os alunos no mercado de trabalho. Rogério Palmeiro não deixa passar em branco o facto de que é com o trabalho e com o dia-a-dia que se aprende a enfrentar as dificuldades.


Por Helena Sousa


Urbi@Orbi- Desde quando é que existe o Gabinete de Estágios?
Rogério Palmeiro-
O Gabinete de Estágios surge integrado no Centro de Estudos e Desenvolvimento Regional em 1996, e foi criado pelo professor Mário Raposo. Numa fase inicial estava vocacionado para a área das Ciências Sociais e Humanas, Gestão e Economia, mas rapidamente se foi alargando.
Este gabinete foi criado com a função de fazer a ligação empresa/ universidade, e de conseguir um enquadramento dos alunos mais fácil no mercado empresarial, o que por vezes não é tão simples como os alunos pensam.

U@O- Como é que funciona o Gabinete de Estágios?
R.P.-
Todos os anos elaboramos uma base de dados de alunos finalistas e recém-licenciados após estes terem efectuado a sua inscrição. Por outro lado temos comunicação com as empresas, estas enviam-nos e-mails onde nos fazem sentir quais as suas necessidades, faltas e carências.
A nossa função é tentar enquadrar os perfis dos nossos alunos, ou seja, ver quais são os alunos que poderão preencher os formulários ou requisitos que cada empresa exige.
Quando uma empresa nos pede uma divulgação mais abrangente, então divulgamos para os Departamentos onde os alunos vêem as ofertas de cada empresa e concorrem, ou directamente ou através do Gabinete de Estágios, para aquelas em que estão mais interessados. O que é importante reter é que, em primeiro lugar a base de dados dos alunos é que vai fazendo a nossa base de dados anuais, e depois que a base de dados das ofertas das empresas é constituída pelas suas vontades e necessidades.

U@O- O Gabinete só arranja estágios para finalistas e recém-licenciados?
R.P.-
Não. Aliás temos alguns programas específicos para alunos que estão no penúltimo ano curricular, e temos também estágios de Verão. Contudo o grosso dos estágios que arranjamos está realmente direccionado para finalistas e recém-licenciados.
O problema que aqui se coloca é que depois estes alunos não vão ter disponibilidade quando chegarmos ao mês de Setembro de continuar com o estágio.

"Não há ninguém da área de jornalismo por colocar"


"Há vários cursos com dificuldades"

U@O- Quais são os cursos que encaram mais dificuldades na procura de emprego?
R.P.-
De ano para ano tentamos sempre superar as dificuldades apresentadas. Há vários cursos com dificuldades. Em relação ao curso de Aeronáutica, o problema do saldo negativo é a Empresa das Oficinas de Material Aeronáutico (OGMA). Esta empresa costumava absorver um grande número dos nossos alunos, mas devido a problemas orçamentais fecharam e não houve contratações. O caso do curso de Ciências do Desporto é um caso muito "sui generis", com questões um pouco diferentes dos outros cursos. O caso que nós identificamos como sendo o curso problemático, e que ainda enfrenta muitas dificuldades no caso das saídas profissionais, é o caso de Química Industrial.

U@O- Quais são os outros cursos com dificuldades a que se refere?
R.P.-
Refiro-me a todos os cursos via ensino, em que as suas dificuldades não passam directamente por nós mas pelos seus departamentos e pelas colocações ao nível das escolas. Em relação à Bioquímica já estamos em negociações para começarmos a precaver o futuro destes alunos.
No caso de Língua e Cultura Portuguesas (LCP) as pessoas já se aperceberam que o ensino não está em expansão e estamos a entrar em contacto com as embaixadas para traduções. Temos também o caso da Psicologia e das Engenharias Mecânicas, que começaram agora a terminar o seu primeiro ano de terminus.
Há uns anos havia problemas com o curso de Ciências da Comunicação mas, graças ao trabalho em conjunto com o docente João Canavilhas já foram ultrapassados. Não há ninguém da área de jornalismo por colocar e em Relações Públicas igualmente. De destacar o facto de começarem a aparecer ofertas para a área da Publicidade. Portanto acho que as coisas estão a funcionar bem.

U@O- Como é que o Gabinete consegue arranjar os estágios aos alunos?
R.P.-
Temos protocolos estabelecidos com algumas empresas, com a Fundação Calouste Gulbenkian, temos intercâmbios para o Instituto da Juventude das Astúrias. Colocamos pessoas nossas no Canadá, ao abrigo da Câmara de Comércio Italiana, em Paris junto da 3M que é a maior empresa de etiquetas do mundo. Estamos a começar a receber muita oferta na área do Marketing.
Actualmente, na área das Engenharias temos alguma oferta para os EUA, para San Diego em cooperação com uma empresa nossa. Por outro lado os protocolos com os bancos estão a aumentar. Antigamente era só o BES e a Caixa Geral de Depósitos. Actualmente temos com o BCP, Montepio Geral, Banco de Moçambique, BPI, os protocolos têm aumentado e isso é muito bom.




"Os programas de emprego não são só os estágios profissionais"

U@O- Qual o curso que tem mais facilidade na colocação de estágios?
R.P.-
É o curso de Gestão. Este tem 100 ofertas de emprego a mais. Foi na análise que fiz a este curso que vi que podíamos ir mais além, moldar os perfis dos alunos, em relação às suas necessidades. Também analisamos as suas preferências: contabilidade, auditoria, consultoria, informática de gestão, marketing.
Portanto, acho que se está a trabalhar para conseguir aproximar cada vez mais as necessidades do mercado de trabalho com os interesses dos alunos. O que é importante é fazer passar a mensagem do que é a realidade do mercado de trabalho e que muitas vezes não é aquela que os estudantes pensam. Temos que mostrar aos alunos que o mercado de trabalho tem regras, e algumas não são muito justas.

U@O- O Gabinete de Estágios apoia os alunos em que aspectos?
R.P.-
Outra componente do nosso gabinete é dar informação e formação ao nível de currículos, material pedagógico, técnicas de procura de emprego, conduta, comportamento nas entrevistas, programas de emprego, redes AGIR, Instituto Português da Juventude (IPJ).
Convém salientar que os programas de emprego não são só os estágios profissionais, há muitas possibilidades de enquadrar os alunos. Temos também os estágios Prodep em relação aos quais temos de estar constantemente atentos. Estes estágios existem em coordenação e articulação com o Gabinete de Planeamento da Universidade, estão sujeitos a portarias específicas, e têm promulgações ao nível da União Europeia.
Por outro lado é preciso estar alerta em relação a tudo o que é legislação sobre emprego. Temos de acompanhar a situação dos alunos, e tentar que a queda no mundo real não seja muito acentuada, tentando precaver o futuro.

U@O- Existe algum manual por onde os alunos se possam orientar?
R.P.-
Sim, redigimos de base um manual de emprego que tem técnicas de procura, comportamento em entrevistas, distinguir currículo de carta de apresentação, como fazer uma candidatura espontânea, etc.. Falamos sobre quão importante é um currículo moldado à candidatura.

"É com o trabalho e com o dia-a-dia que se vai aprendendo"

"Na maior parte dos casos os alunos não sabem nada sobre como concorrer aos empregos"

U@O- Em que consistem os estágios internacionais?
R.P.-
Existe a Agência Nacional Sócrates que coordena toda a parte de estágios no estrangeiro. Por um lado temos os semestres Erasmus, e, numa fase pós licenciatura estágios do Programa Leonardo DaVinci.
Existe ainda um conjunto de entidades que oferecem estágios internacionais. Falo nomeadamente dos centros de emprego IEFP com a rede EUDES, que também concede estágios no exterior, e a comissão "Fullbrigth", ou a Câmara de Comércio Italiana.

U@O- Qual é o tempo de duração de um estágio?
R.P.-
Tirando os estágios que são regulados legalmente, por exemplo o caso do IEFP, que oferece estágios de nove meses, na sua grande maioria é a empresa que os dá que define o perfil do estágio, bem como a sua duração. Normalmente os estágios variam entre os seis meses a um ano. Nunca são menos de seis, nem mais do que um ano.

U@O- Quais as maiores dificuldades de um licenciado quando entra no mundo do trabalho?
R.P.-
O licenciado quando sai daqui, a principio pensa que já vai com a bagagem toda, mas quando chega lá fora depara-se com uma realidade diferente.
O que eu costumo dizer é "o licenciado aqui aprendeu as premissas de defesa, as bases teóricas, agora falta fazer a especialidade". É com o trabalho e com o dia-a-dia e com os erros que se vai aprendendo. Não há receitas mágicas, nenhuma Universidade ensina tudo, portanto a pessoa ganha as premissas, ganha as bases teóricas e depois tem que ir em frente, aprendendo.

"Não entreguem tudo, estejam sempre com um pé atrás"

U@O- Quais são as maiores dificuldades que revelam os alunos da Universidade da Beira Interior (UBI) quando se dirigem ao gabinete?
R.P.-
São duas e muito grandes dificuldades. Considero que é bom que os alunos venham aqui porque assim nós damo-lhes informação, mas a maior parte dos casos os alunos não sabem nada sobre como concorrer aos empregos. Por um lado há um total alheamento do que é o mercado do trabalho, por outro não sabem fazer as candidaturas.
Os alunos têm que se informar acerca das coisas, saber moldar o currículo às exigências das empresas, saber quando e como devem fazer um primeiro contacto telefónico, ou se é correcto enviar um e-mail.
Os alunos têm que pensar que quando vão a algum sitio não há ninguém melhor do que nós, mas também não há ninguém pior - estamos todos por igual, a inexperiência de uns é a inexperiência dos outros.


U@O- Quer deixar algum conselho ou alertar os alunos para algum aspecto em especial?
R.P.-
O gabinete de estágios procura adaptar os interesses dos alunos aos interesses empresariais, mas também tenta fazer passar a mensagem que o mundo empresarial é um bocado complicado e há também quem jogue muito sujo.
Um dos alertas que eu faço muitas vezes é para essas empresas chamadas de "Research", os recrutamentos, uma vez que há muito bom mas também há muito mau.
Um conselho nosso é "não entreguem tudo, estejam sempre com um pé atrás". Nós temos cursos em que há excedente tão grande e de tão boas ofertas não aproveitadas, se calhar numa primeira fase da nossa vida em vez de estarmos a cinco minutos de casa deveríamos estar a uma hora pois assim ganhamos experiência. De hoje para amanhã o nosso currículo vai reflectir essa experiência e vai ser muito mais fácil conseguirmos alguma coisa.