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  Anabela Gradim
 |   Todos os homens são iguais A sequenciação do genoma humano está completa e, entre outros 
                        progressos, os cientistas concluiram que não existem diferenças 
                        genéticas entre raças ou etnias. Finalmente, para os que ainda tinham 
                        dúvidas. All men are created equal. Iguais na grandeza como 
                        na miséria, na vocação para o bem, e no inverso. É 
                        bom lembrá-lo. O mal não é privilégio dos outros.
 Vem isto a propósito da vitória militar alcançada pelos americanos 
                        no Iraque - da qual nunca, ninguém, em seu perfeito juízo, duvidou 
                        -, e do que nos é dado ver. Primeiro: dificilmente existirá país 
                        mais desarmado do que o Iraque. Depois, o delírio das pilhagens em lojas, 
                        residências, museus e hospitais - refinarias e poços não, 
                        estão bem seguras desde a primeira hora. Mas no meio de tudo, a imagem 
                        que se destaca é a dos milhares de pessoas desejosas de voltar à 
                        normalidade: terem um emprego, cuidarem dos seus, frequentarem ruas seguras, acesso 
                        a saúde e educação... Tal como nós.
 Pouco tempo depois do 11 de Setembro, quando no rescaldo dos ataques ainda se 
                        tentava perceber o que se estava a passar, os que referiam as condições 
                        materiais e organizacionais deficientes dos regimes árabes, a par com as 
                        enormes riquezas desses países, como causa de ressentimento, foram histericamente 
                        atacados. Essa era a visão marxista impenitente que não percebia 
                        que estávamos perante uma guerra de civilizações, onde pura 
                        e simplesmente não havia lugar para o diálogo. Eles eram irremediavelmente 
                        diferentes. Ora onde falha o diálogo, só sobra a razão da 
                        força.
 E esses, mesmíssimos, para quem para o árabe as condições 
                        materiais de existência não contam - só o desprezo pelo ocidente 
                        e a certeza da salvação - estão entusiasmadíssimos 
                        com o plano Wolfowitz, o tal que, na letra e na forma, crê que propagar 
                        a democracia (abstraio dos meios) e concomitantemente, melhorar as condições 
                        materiais de existência desses povos, é uma via eficaz e legítima 
                        para combater o terrorismo. Concordo com a primeira, não com a segunda. 
                        E não é possível sustentar as duas simultaneamente. Só 
                        se a final solução Wolfowitz é retórica para inglês 
                        ver.
 Adenda às hossanas sobre a vitória militar: sabem o que se passa 
                        hoje no Afeganistão? Não? Eu também não. Só 
                        sei que o assunto desapareceu completa e convenientemente da agenda dos media. 
                        Em notas de rodapé, aqui e ali, indícios. Que fora de Cabul o país 
                        está a saque e em completa anarquia, e que a produção de 
                        heroína, que abastece toda a Europa, bateu um record histórico em 
                        2002. E isso comprovo quando saio à rua na minha cidade natal. Nunca ouve 
                        tanta, nem tão barata.
 
 
 
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