| Urbi @ Orbi - Desde Abril, quando conquistaram 
                      o Festival de Música Moderna na Covilhã, que transformações 
                      sofreu a vossa vida? Hugo Correia - Aconteceram algumas coisas importantes. Entraram cinco músicos 
                      no grupo, realizámos alguns espectáculos e gravámos em Aveiro 
                      o nosso segundo álbum ao vivo. Vai sair, em princípio, nos finais 
                      de Junho.
 U @ O - Editar um disco ao vivo foi uma opção voluntária?H. C. - Sim, é uma opção sobretudo estética. Torna 
                        o trabalho mais homogéneo e a comunicação que há entre 
                        o grupo e o público é fantástica, constituem momentos únicos 
                        que, em estúdio, são impossíveis de recriar. Aquilo é 
                        "one take", fica gravado para sempre.
 U @ O - Quem vos influenciou nesse aspecto?H. C. - Essencialmente Frank Zappa. Ele sempre teve esse ideal de gravar "live". 
                        Guio-me muito pela atitude do Zappa, passava seis meses no estúdio a trabalhar 
                        vários aspectos e depois fazia uma digressão para construir um novo 
                        álbum.
 U @ O - "Two Hundred Motels", álbum de Frank Zappa, foi muito 
                        importante para si?H. C. - Sim, nos anos 80 quando o ouvi foi uma enorme influência. Esse 
                        álbum, realizado simultaneamente com os Mother´s of Invention, é 
                        a banda sonora para um dos seus primeiros filmes. É um disco simplesmente 
                        genial.
 U @ O - Ainda considera Zappa o seu "Deus"?H. C. - O Zappa foi uma influência para tudo isto começar, foi 
                        um Deus e continua a ser. Mas neste momento estou a investir mais na música 
                        clássica, que é a minha área e a dedicar-me também 
                        ao próprio Jazz. Os Fadomorse já conseguiram encontrar o seu estilo.
 
 
                         
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                                "Este é um álbum mais homogéneo"
 |   Os Fadomorse não se consideram um grupo rock
 |  U @ O - Quais as principais diferenças entre este novo disco e o anterior?H. C. - Neste álbum há um grupo homogéneo enquanto que 
                        o outro tinha muitos músicos convidados. Este é um álbum 
                        mais coerente, mais homogéneo em termos de sonoridade. Em Gritar o Fado 
                        investi muito na produção mas este é mais directo às 
                        pessoas.
 
 U @ O - Qual será o seu nome?
 H. C. - Vai chamar-se Entrudo e está relacionado com o Carnaval de 
                        Macedo de Cavaleiros, em que nós atribuímos uma conotação 
                        irónica. Relaciona-se com o Carnaval e o estado do nosso país.
 U @ O - Vocês consideram-se um grupo rock?H. C. - Considero que não. Hoje fomos um grupo com afinidades ao rock 
                        porque o nosso guitarrista não veio e tive que assumir esse papel. Acho 
                        que o nosso som ficou um pouco despido sem a guitarra portuguesa.
 U @ O- A guitarra portuguesa é mais uma tentativa de explorar as tradições 
                        portuguesas?H. C. - Sim, juntamente com a braguesa e outros instrumentos que não 
                        pude explorar porque o Deus Coura (n.r. guitarrista) pertence também aos 
                        Zen e tivemos o azar de coincidir duas datas.
 U @ O- Nos Zen?H. C. - Ele foi substituir o Jorge Coelho. Têm agora um novo vocalista 
                        e, na minha opinião, aquilo está muito agradável, melhor 
                        do que no passado.
 U @ O- E Carlos Paredes também é uma influência importante?H. C. - Não considero. Para o mundo da música é uma grande 
                        influência mas para mim não porque não tento sequer imitar. 
                        O Carlos Paredes era genial. O que pretendo da guitarra portuguesa é apenas 
                        o timbre, simplesmente a cor que ela atribui e não a técnica.
 U @ O- Juntamente com estes instrumentos, vocês utilizam também 
                        muitos samplers de ranchos folclóricos e bandas filarmónicas.H. C. - Sim, porque não temos a oportunidade de trazer esses grupos. 
                        Tenho o sonho de realizar um grande concerto no Pavilhão Atlântico 
                        com ranchos folclóricos, tunas académicas, bandas filarmónicas, 
                        zés pereiras, Pauliteiros de Miranda (risos), tudo o que possas imaginar. 
                        Tenho esse sonho, gostava de trabalhar simultaneamente com todas estas pessoas.
 U @ O- Em contraste com o concerto do festival, notou-se a falta de alguns 
                        instrumentos, nomeadamente, o clarinete.H. C. - Sentimos a falta do clarinete mas tivemos uma flauta transversal e 
                        um saxofone que não sei se foi ouvido no pavilhão. Aqui não 
                        foi possível ouvir Fadomorse, nós estamos com um espectáculo 
                        muito bom, mas quando não temos um bom som é impossível realizar 
                        um óptimo concerto. Mas, mesmo assim, acho que o público gostou.
 
 
 
                         
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                               "Todas as cidades são importantes e a Covilhã tem sido 
                                muita boa para nós"
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 "A música observada como uma arte e uma forma de intervenção"
 |  U @ O - O que significa a vossa expressão: "evoluir na lusomusicologia"?H. C. - Lusomusicologia é um modo de dizer música portuguesa 
                        ou lusófono. Mas a evolução não está relacionada 
                        com aquilo que estás a ouvir agora (n.r. Porquinhos da Ilda). Sempre fizeram 
                        a mesma coisa e não trazem nada de novo. Tem a ver com a atitude perante 
                        a música, observada como uma arte e uma forma de intervenção 
                        como o Zeca Afonso, o Sérgio Godinho ou Janita Salomé fizeram. Isso 
                        perdeu-se e a música adquiriu uma função manifestamente comercial. 
                        Felizmente, a seguir aos Porquinhos da Ilda, vem um exemplo de um grande trabalho 
                        (n.r. Blasted Mechanism). Na minha opinião têm o concerto mais profissional 
                        neste momento em Portugal.
 U @ O - Vocês desejam uma pequena revolução cultural no 
                        nosso país?H. C. - As pessoas parece que deixaram de pensar, passaram a ter uma vida 
                        de "elevador na horizontal". O objectivo é ter um curso, uma 
                        casa, um automóvel e um emprego estável, principalmente proporcionado 
                        pelo Estado. Não têm objectivos arrojados, ambição 
                        ou sonhos, limitam-se a conquistar aquilo que observam no vizinho. Depois agrava-se 
                        porque as pessoas têm uma enorme falta de cultura.
 U @ O - Mas existem aspectos em que tem melhorado?H. C. - Sim, é um óptimo sinal um grupo como os Blasted já 
                        estarem em quase todas as "queimas", é positivo um grupo como 
                        os Fadomorse estarem em cinco "queimas". É um sinal de que alguma 
                        coisa está a modificar, de que aparecem pessoas dispostas a ouvir coisas 
                        diferentes. Provavelmente há três anos era impossível entrar 
                        onde quer que fosse.
 U @ O - Quem é Hugo Correia quando não está nos Fadomorse?H. C. - Uma pessoa feliz. Sou músico de orquestra, trabalho todas as 
                        semanas a fazer aquilo que gosto. Tenho imensos projectos. Neste momento estou 
                        a preparar a inauguração da minha Academia Superior de Música, 
                        em Aveiro, e tenho mais quatro projectos para editar álbuns ainda este 
                        ano. Sou uma pessoa que tenta desfrutar o máximo, compor e criar e deixar 
                        muitos sinais neste país.
 U @ O- Qual é o seu instrumento na Orquestra?H. C. - Contrabaixo.
 U @ O - A Covilhã já é uma cidade importante no vosso 
                        percurso?H. C. - Todas as cidades são importantes e a Covilhã tem sido 
                        muita boa para nós. A minha mulher é desta zona, de Folgosinho, 
                        na Serra da Estrela. Encontro sempre aqui carinho e uma boa empatia de parte a 
                        parte.
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