Santos Silva mostra a UBI como uma universidade capaz de responder aos problemas do futuro
Reitor da UBI pondera recandidatura
"Nunca fugi aos problemas"

Na semana em que se fixou o valor das propinas em 700 euros, o Reitor falou sobre a mudança urgente no que se refere às metodologias de ensino, por imposição do tratado de Bolonha, e da difícil situação financeira que atravessa o ensino Superior e a UBI em particular, tocando na recandidatura nas próximas eleições para a Reitoria que decorrem em Novembro.


Por Ana Maria Fonseca e Daniel Sousa e Silva


U@O - As próximas eleições para a Reitoria são em Novembro próximo. Vai-se recandidatar?
Manuel Santos Silva - É bom que haja alternância nestes cargos. Um indivíduo não se pode perpetuar. É preciso dar lugar a novas pessoas, com novas ideias e uma nova dinâmica para a Instituição.
Vivemos uma situação difícil no Ensino Superior, a nossa Instituição ainda não está devidamente estabilizada e vamos atravessar um período complicado em termos de captação de verbas para os empreendimentos que temos em curso. Haverá ainda uma grande transformação no Ensino Superior, pois há que implementar a Declaração de Bolonha, uma nova Lei de Bases da Educação, uma nova Lei de Autonomia. Há que produzir novos estatutos para a Universidade, incluindo um novo estatuto da carreira de docente. Tudo isto terá de se concretizar num curto espaço de tempo. É evidente que me dizem que numa situação destas seria melhor para a Universidade ter alguém que conhece bem a instituição, com conhecimento sobre como conduzir determinado tipo de processos. Perante as minhas responsabilidades, a situação da Universidade e as manifestações de apoio que tenho tido, até por parte de todos os que estão em condições de se candidatar, não me parece que tenha grandes alternativas. Há que ponderar para bem da instituição. Eu nunca fugi aos problemas.

U@O - O programa a apresentar é de continuidade?
M.S.S.-
Será de continuidade em alguns aspectos, mas não noutros. Não sou capaz de estar quieto. Essa não é a minha maneira de estar. Tenho novas ideias para a Universidade, mas há projectos já traçados que têm de continuar.
Este ano embarcámos numa nova aventura, o curso de Arquitectura, com novas metodologias de aprendizagem. Não podemos esquecer que há um grande desafio na Declaração de Bolonha. Se a quisermos implementar tal e qual está definido, será uma mudança radical na instituição. Tanto para alunos como para professores. Não é um processo fácil. As universidades são massas com alguma complexidade e que levam o seu tempo a adaptar-se.

U@O - Como se encontra a UBI a nível de infra-estruturas e que obras estão planeadas a curto e a longo prazo
M.S.S.-
Uma das lacunas desta instituição é a unidade alimentar no Pólo IV. Tendo uma residência da dimensão da Pedro Álvares Cabral, que poderá acolher entre 375 e 420 alunos, é evidente que teremos de construir uma unidade alimentar.
Para colmatar um pouco o problema, este ano alargámos o snack, com receitas próprias da Universidade e dos Serviços de Acção Social, tentando dar um mínimo de condições aos alunos daquele Pólo.
O nosso objectivo para uma nova unidade alimentar passa por conseguir um sistema de cattering interno da universidade. Desta forma poderia-se baixar os custos de confecção dos alimentos e melhorar a qualidade, uma vez que se terias um controlo mais eficiente, oferecendo também, maior variedade. Se tivermos financiamento para aquela unidade alimentar, ela será construída em moldes ino-vadores, não será só mais uma cantina no sentido tradicional.

U@O - Mas tem outros investimentos em mente...
M.S.S.-
Há ainda outras obras que terão de ser levadas a cabo. O pólo III é algo que teremos de solucionar com alguma urgência, porque quando a Faculdade de Medicina entrar em velocidade de cruzeiro, teremos entre 700 e mil alunos e é claro que nessa altura fará sentido construir mais uma residência nessa zona. Teremos alguma dificuldade em justificá-la à Tutela, porque temos uma das melhores taxas de cobertura a nível nacional. Por isso mesmo estamos a inovar. Vamos tentar construir a residência em parceria com privados. Porque estamos cientes de que o Orçamento de Estado não chega para tudo e vamos tentar resolver um problema que deverá surgir dentro de dois ou três anos, com a transferência da FCS para o pólo III.
No que diz respeito às condições dos funcionários, não nos pode-mos esquecer que a reitoria está muito bem instalada num convento do século XVI, mas as condições de trabalho de alguns funcionários da reitoria não são as mais adequadas. É necessário expandir os serviços centrais.

U@O - E quanto às salas de aula?
M.S.S.-
A esse respeito, a UBI já está neste momento, praticamente em ruptura. Temos problemas sérios na elaboração dos horários, se bem que funciona-mos em dois turnos, porque os anos ímpares têm aulas de manhã e os pares à tarde. Essa medida foi implementada fundamentalmente por razões pedagógicas. Mas também nos permite gerir melhor os espaços da universidade.
É urgente que se dê início ao Complexo Pedagógico das Ciências do Desporto, onde os alunos estão a ter aulas em condições que não são minimamente admissíveis. Há também que ampliar as áreas de ensino das Ciências Sociais e Humanas e das Letras. Há que recuperar um edifício contíguo, que a UBI já adquiriu com receitas próprias, onde já se insere o Cybercentro.

U@O - A residência Pedro Álvares Cabral, precisamente junto ao Pólo IV, já devia estar pronta para começar a funcionar no início do ano lectivo, o que não aconteceu....
M.S.S.-
O responsável pela empresa já garantiu que entregaria a obra no final de Outubro. Depois ainda precisamos de algum tempo para a equipar e mobilar. Não é admissível que uma empresa não tenha terminado a obra o ano passado, conforme se comprometeu, para que entrasse em funcionamento neste ano lectivo. É uma residência que nos vai permitir praticamente duplicar a capacidade de alojamento, se bem que a UBI já tem, neste momento a melhor cobertura de camas por aluno a nível nacional. Espero que ainda durante este ano lectivo se possa ocupar pelo menos parte desta residência e resolver um dos grandes problemas dos alunos da UBI, uma vez que temos uma percentagem extremamente elevada de alunos deslocados. Nesta nova residência vamos inovar. Por exemplo, a nível informático está toda equipada com sistemas wireless. Um aluno, em qualquer ponto da residência, poderá estar ligado à rede da universidade com o seu computador portátil.



"Ou nos afirmamos pela qualidade e pela diferença, ou morremos"


U@O - Medicina na UBI foi um dos cursos mais procurados a nível nacional, com uma das causas apontadas para a metodologia inovadora de ensino. Essa metodologia será alargada a outras licenciaturas?
M.S.S.-
A Universidade tem de mudar, até porque, cada vez mais o que conta é a aprendizagem feita pelos alunos e não o que os professores ensinam. Há uma grande percentagem de alunos que não frequenta as aulas e isso é inconcebível. Temos de arranjar uma nova metodologia. Os tempos mudaram. Quando passei pelos bancos da universidade, a minha principal fonte de informação era o professor. Hoje em dia a informação entra por todo o lado e de variadas formas. Não temos só o suporte de papel, mas todas as novas tecnologias da comunicação e informação. Hoje o professor tem de ser mais um encaminhador, traçar os objectivos do aluno. É por isso, num esforço de adaptação, que a nossa universidade tem dos maiores índices de computadores por aluno das universidades europeias. Não é por acaso que a nova Biblioteca Central não é uma biblioteca tradicional. É uma estrutura dinâmica em que qualquer utente tem acesso à informação através do suporte de papel, mas também através das novas tecnologias. Tudo isto está a ser desenvolvido porque na UBI pensamos que o que conta é o que o aluno aprende. Julgo que o caminho que seguimos em Medicina é o que as universidades têm de tomar.

U@O - Cinema e Arquitectura, que mais valias trarão?
M.S.S.-
A UBI foi desenvolvendo, ao longo do tempo, competências na área da imagem, de uma forma geral e da produção de conteúdos. Há uma necessidade absoluta de formar profissionais nesta área. para além das Ciências da Comunicação e do Design Multimédia, desenvolvemos uma estrutura ao longo do tempo, como o CREA ou o Cybercentro, onde existem estúdios, capacidade de produção.
Na área de arquitectura fomos também adquirindo experiência e "know how" ao longo do tempo. Temos no Departamento de Engenharia Civil um ramo de Planeamento e Urbanismo, onde há um conjunto de arquitectos que ao longo do tempo tem desenvolvido actividades relacionadas com a arquitectura.
Não queremos um curso de massas, temos 40 alunos e propusemos, no máximo, 50, para podermos implementar um novo processo de aprendizagem, pôr os alunos a trabalhar e segui-los convenientemente.


U@O - O orçamento de funcionamento foi reduzido em cerca de 400 mil euros em relação ao ano passado. Como vê essa redução?
M.S.S.-
Penso que esta redução foi demasiado drástica. Se nós já estávamos numa situação complexa, tivemos de aumentar as propinas para tentar um equilíbrio mínimo da instituição em termos financeiros e para continuarmos a ter a qualidade que desejamos para a universidade. Se não tivermos esses valores o ensino praticado irá degradar-se em termos de qualidade. As propinas servem, no fundo, para suportar a qualidade do ensino.

U@O - O valor das propinas fixado em 700 euros será suficiente para equilibrar as contas da instituição?
U@O -
O valor que fixámos foi tendo como base o plafond do ano passado, este ano reduzido em 400 mil euros. Quer isto dizer que teremos de procurar outras receitas que irão contribuir para o equilíbrio financeiro. A propina que estabelecemos em reunião do Senado foi conseguida de uma forma simples. Fizemos as contas e tínhamos um défice de cerca de três milhões e meio de euros, grosso modo. Temos cinco mil alunos. Para equilibrarmos financeiramente, precisamos de 700 euros por aluno. Perguntei ao Senado se queríamos entrar em ruptura financeira, degradar a qualidade de ensino, ou manter uma qualidade mínima. Não temos alternativa. Estamos no Interior, ou nos afirmamos pela qualidade e pela diferença, e os números que temos no acesso deste ano, mais uma vez demonstram, os alunos escolhem esta universidade, ou então morremos. Se o Estado se desresponsabiliza, temos de ir buscá-lo a outra fonte, que são as famílias, ou os estudantes. Não há outra situação possível.

U@O - Será possível manter o mesmo número de bolseiros quando o orçamento para a acção social subiu menos de 400 mil euros?
M.S.S.-
Para mantermos o nível de bolsas que tínhamos no ano passado, por exemplo, teremos que ter um reforço orçamental. Neste momento o valor que nos atribuíram é insuficiente, e estamos a alertar o Governo para esse aspecto. O Governo garantiu que nenhum estudante ficaria de fora por razões financeiras. Espero que cumpra.



O reitor tem paixão pela agricultura



Perfil



Manuel José dos Santos Silva nasceu e cresceu numa quinta junto a Vale Formoso. Foi nessa freguesia e depois em Orjais que frequentou a escola primária. Concluído o ensino primário fez o primeiro e o segundo ano no colégio de Belmonte seguindo para o liceu da Guarda onde concluiu o sétimo ano. Nesse verão, como em todos os outros durante o tempo de estudante, ficou a ajudar os pais na quinta. "As minhas férias forem sempre passadas agarrado a um tractor ou em outras actividades agrícolas". Mas, nessa altura, nasceu uma dúvida quanto ao que queria estudar. "Tinha feito o sétimo ano com uma média bastante elevada, que me dispensava das provas de aptidão. Como fiquei dispensado porque tinha média superior a 16, tinha uma grande dúvida entre ir para o Técnico ou para medicina. Na altura tinha uma vocação grande para a parte tecnológica, mecânica. Por isso escolhi a Engenharia Mecânica, mas também poderia ter ido para medicina. Provavelmente, como, sempre tive muita aptidão para inventar coisas novas, para mexer, para idealizar esquemas e sistemas teria seguido cirurgia..."
Ainda antes de se ter licenciado em Engenharia Mecânica no Instituto Superior Técnico, em Lisboa, começou a dar aulas de física no liceu Camões.
Em 1975, ano em que terminou a licenciatura, ingressou no então Instituto Politécnico da Covilhã. Foi aqui, neste instituto que depois se transformou em Universidade da Beira Interior, que decorreu todo o seu percurso académico. À excepção da pós -graduação em engenharia Têxtil que concluiu na Universidade da Alta Alsacia para onde foi, a convite e com uma bolsa do governo francês. A partir daí iniciou a investigação na área do têxtil.
Manuel Santos Silva foi o primeiro doutorado pela instituição. "Por isso me considero também ex-aluno da UBI. Poderia ter apresentado a tese alguns anos antes, porque o trabalho estava concluído, mas fiz questão que os doutoramentos fossem criados nesta instituição, e de me doutorar aqui".
Acompanhando o instituto politécnico desde o início, trabalhou de perto com o primeiro presidente da Comissão Instaladora do Instituto, Duarte Simões, "nomeadamente na questão das obras que era o essencial na altura, a expansão física", refere. Em 1990, o então Reitor Passos Morgado convidou-o para vice-reitor. "Quando aconteceram as primeiras eleições na instituição para Reitor, e como de acordo com a lei da autonomia e com os nossos estatutos, só pode ser eleito um professor catedrático, o único professor catedrático com nomeação efectiva que existia na Universidade da Beira Interior era eu", explica, e continua, "É evidente que no momento não foi uma decisão fácil, mas não podia abandonar a instituição, e é claro que me candidatei para Reitor nessa altura". Já lá vão quase (oito anos).
Nos tempos livres, o reitor da UBI foge para a quinta.
"Tenho um hobbie que provavelmente me está nos genes. Sendo filho de agricultores, nasci no campo e gosto de fazer agricultura. Quando tenho um bocadinho, fujo para a quinta. Como tenho o bicho da investigação, também a minha quinta é um campo de investigação. Vou sempre introduzindo variedades, fazendo cruzamentos, ensaiando novos sistemas de rega. Digamos que tenho uma propriedade que é o meu hobbie, onde passo os bocadinhos que tenho e tentando sempre inovar".