José Geraldes

Verbos da vida

Quem disse que não era difícil perdoar? Mas é possível. Norma a reter pelos políticos para não viverem da vingança. Por vezes mesquinha e rasteira.

Dar, acolher, pedir, oferecer, recusar e perdoar são os seis verbos que definem uma vida. É François Varillon, jesuíta francês, que chama a atenção para esta realidade.
Dar é um gesto que fica sempre bem. Mas dar sem interesses escondidos nem cálculos para obter dividendos. Dar o seu tempo aos outros para os ouvir e os compreender. Dar do seu dinheiro para ajudar os que precisam. Não diz o povo que “quem dá aos pobres, empresta a Deus” ?
O acto de dar liberta o espírito e tranquiliza a consciência. Mas com realismo e sem falsas ingenuidades. Há quem explore os que são “mãos largas”. Por isso, também é preciso saber dar. Até para não criar “parasitas”.
Se o dar faz parte da natureza humana, o acolher leva-nos ao encontro do outro. A considerá-lo como igual a nós. Como uma pessoa com direitos e deveres.
Acolher, para além de uma norma de boa educação – disciplina que parece não ser ensinada nas escolas – estabelece cumplicidades entre as pessoas. E é o primeiro momento para o trabalho de equipa. Mesmo na discordância, o acolher desfaz barreiras e constrói pontes. Lá canta Rui Veloso o que o bom Papa João XXIII havia dito nos anos sessenta : “É mais o que nos une do que aquilo que nos separa”.
Quem pede, mostra nobreza de carácter. Pedir exige humildade. E revela o que somos. Não é vergonha pedir. Seja um favor, um serviço, uma ajuda, um acto de compreensão, uma desculpa. “Errar é próprio do homem” – diz um provérbio latino.
Quanto maior for a capacidade em pedir, tanto maior será a possibilidade em dar. Quem dá, pede e quem pede, dá. Em ambos os casos, se revela a grandeza do homem. Que só o orgulho impede.
Oferecer é apresentar-se disponível. Na linha do dar, do acolher e do pedir. Quando se oferece uma prenda, não se trata, apenas, de um gesto material mas também de afirmação de entrega pessoal. Elimina-se um vazio que possa existir.
Oferecer equivale a darmo-nos. Com as qualidades e defeitos que temos. E o tempo de que dispomos.
Recusar implica uma atitude de coerência. Agir como pensamos. Frontalmente. Sem cedências no essencial embora flexíveis no acessório. Agostinho de Hipona o disse: discordar dos erros mas amar as pessoas.
Há comportamentos que não podem ser aprovados. Mas recusar não é condenar. Antes, firmeza nos valores que nos engrandecem. Como diz o verso de Fernando Pessoa : “Sê todo inteiro naquilo que és”. Ter coluna vertebral. Porque há por aí muitos palhaços. Gente sem carácter nem princípios.
Perdoar.Dar a mão a quem errou. Esquecer e varrer o ódio. Não alimentar ressentimentos. Só os gestos de bondade preparam um mundo melhor.
Quem disse que não era difícil perdoar ? Mas é possível. Norma a reter pelos políticos para não viverem da vingança. Por vezes mesquinha e rasteira.
Seis verbos. Seis atitudes que, na expressão de Michel Quoist, nos mostram o homem de pé. De que estamos a precisar no País corroído pela pedofilia e pela corrupção. E para eliminar de vez o triângulo infernal que a sustenta referido por Maria José Morgado : “Autarquias, futebol e construtores civis”.
Uma grande empreitada para todos os portugueses.