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                        Investigação como Vocação
 
 Sempre vi na Universidade uma comunidade científica 
                        em que a investigação está ligada 
                        ao ensino especializado de alto nível. Para o que 
                        concorrem as suas duas principais missões: traduzidas 
                        no binómio ensino/investigação. Será 
                        dessa osmose que depende a sua vitalidade enquanto fonte 
                        de produção e irradiação de 
                        saberes livres, inovadores e sempre em renovação 
                        criadora.
 Privilegiar apenas uma das duas dimensões daquele 
                        binómio faz-se sempre à custa do sacrifício 
                        do outro. Se for valorizado apenas o ensino, a investigação 
                        tende paulatinamente a desaparecer em proveito de uma 
                        docência meramente pedagógica ou didáctica. 
                        E a prazo a Universidade não passará de 
                        uma espécie de liceu onde os docentes terão 
                        que esforçar-se por ensinar os alunos a pouco mais 
                        do que saberem construir uma frase. Neste caso, os professores 
                        andam sempre cheios de trabalho e não têm 
                        nenhum tempo para se dedicarem à investigação. 
                        Em contrapartida, uma exclusiva aposta na investigação 
                        tende a tornar a Universidade num laboratório científico, 
                        uma espécie de clausura numa torre de marfim, certamente 
                        com as suas virtudes, mas sem ligação à 
                        comunidade, inerte aos impulsos da realidade, sempre em 
                        mutação constante. Daí ser decisivo 
                        criar as condições para um permanente e 
                        fecundo equilíbrio entre os dois termos do binómio, 
                        a “tensão essencial” capaz de os projectar.
 Mas o grande problema em discussão é a meu 
                        ver o da investigação. Esta é uma 
                        convicção que hoje circula nos corredores 
                        da UBI, e que é tema de preocupação 
                        generalizada entre colegas de mais ou menos afinidades 
                        científicas disciplinares. Se a UBI fez, e continua 
                        a fazer, um esforço notável na qualificação 
                        do seu corpo docente esse esforço terá dificuldades 
                        em frutificar, se os seus professores não forem 
                        “libertados” de inúmeras rotinas administrativas, 
                        para as quais não se estiveram a especializar, 
                        ou de cargas horárias médias exacerbadas 
                        e calculadas por critérios inadequados. E, claro, 
                        bem sei que nós docentes também não 
                        estamos inteiramente isentos de “culpas”, 
                        sobretudo quando não somos capazes de promover 
                        a prática de reuniões eficientes, onde os 
                        assuntos sejam previamente estudados, discutidos e os 
                        argumentos esgrimidos de forma a que as decisões 
                        sejam aceites como grandes orientações para 
                        todos e permitam afectar o conjunto que é sempre 
                        mais do que a soma das partes.
 Mas não é possível encetar uma trajectória 
                        adequada a enfrentar os desafios do futuro cedendo às 
                        ameaças das conjunturas que não, raras vezes, 
                        confundem qualidade com quantidade. E cair na ilusão 
                        dos “melhoramentos” puramente estatísticos, 
                        que não correspondem a competências reais. 
                        É da investigação, em quantidade 
                        e qualidade, que depende o prestígio de uma Universidade. 
                        A aposta na qualidade exige condições reais 
                        para a prática da investigação e 
                        esta deverá ser uma «vital» prioridade.
 Estimular a investigação, o mesmo é 
                        dizer, educar a insatisfação é a 
                        meu ver inerente à condição da Universidade. 
                        O que significa fazer alastrar esse espírito para 
                        os estudantes, e incutir-lhes essa motivação. 
                        O apelo da investigação deve ser despoletado 
                        desde logo nos nossos alunos. Nunca devemos estar satisfeitos 
                        com o conhecimento existente, devemos ir sempre mais além, 
                        e penso que esta é mesmo a condição 
                        da ciência, mormente das Sociais, e com primazia 
                        para a Sociologia. Essa é também a ferramenta 
                        certa para combater a rotina, o hábito, o terreno 
                        fértil ao vício burocrático.
 Não haverá bom ensino sem boa investigação. 
                        Esta a condição para que os professores 
                        se dediquem e entreguem à nobre missão: 
                        a do binómio produção científica/ensino-aprendizagem. 
                        A UBI não pode ceder nesta matéria. Não 
                        pode permitir o primado único da docência.
 Eis uma opinião, que pelo que me chega não 
                        é única, e com alguns ajustamentos talvez 
                        mereça ser devidamente ponderada e discutida entre 
                        todos.
 * Docente do Departamento 
                        de Sociologia
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