Domingos Vaz*

A Investigação como Vocação


Sempre vi na Universidade uma comunidade científica em que a investigação está ligada ao ensino especializado de alto nível. Para o que concorrem as suas duas principais missões: traduzidas no binómio ensino/investigação. Será dessa osmose que depende a sua vitalidade enquanto fonte de produção e irradiação de saberes livres, inovadores e sempre em renovação criadora.
Privilegiar apenas uma das duas dimensões daquele binómio faz-se sempre à custa do sacrifício do outro. Se for valorizado apenas o ensino, a investigação tende paulatinamente a desaparecer em proveito de uma docência meramente pedagógica ou didáctica. E a prazo a Universidade não passará de uma espécie de liceu onde os docentes terão que esforçar-se por ensinar os alunos a pouco mais do que saberem construir uma frase. Neste caso, os professores andam sempre cheios de trabalho e não têm nenhum tempo para se dedicarem à investigação. Em contrapartida, uma exclusiva aposta na investigação tende a tornar a Universidade num laboratório científico, uma espécie de clausura numa torre de marfim, certamente com as suas virtudes, mas sem ligação à comunidade, inerte aos impulsos da realidade, sempre em mutação constante. Daí ser decisivo criar as condições para um permanente e fecundo equilíbrio entre os dois termos do binómio, a “tensão essencial” capaz de os projectar.
Mas o grande problema em discussão é a meu ver o da investigação. Esta é uma convicção que hoje circula nos corredores da UBI, e que é tema de preocupação generalizada entre colegas de mais ou menos afinidades científicas disciplinares. Se a UBI fez, e continua a fazer, um esforço notável na qualificação do seu corpo docente esse esforço terá dificuldades em frutificar, se os seus professores não forem “libertados” de inúmeras rotinas administrativas, para as quais não se estiveram a especializar, ou de cargas horárias médias exacerbadas e calculadas por critérios inadequados. E, claro, bem sei que nós docentes também não estamos inteiramente isentos de “culpas”, sobretudo quando não somos capazes de promover a prática de reuniões eficientes, onde os assuntos sejam previamente estudados, discutidos e os argumentos esgrimidos de forma a que as decisões sejam aceites como grandes orientações para todos e permitam afectar o conjunto que é sempre mais do que a soma das partes.
Mas não é possível encetar uma trajectória adequada a enfrentar os desafios do futuro cedendo às ameaças das conjunturas que não, raras vezes, confundem qualidade com quantidade. E cair na ilusão dos “melhoramentos” puramente estatísticos, que não correspondem a competências reais. É da investigação, em quantidade e qualidade, que depende o prestígio de uma Universidade. A aposta na qualidade exige condições reais para a prática da investigação e esta deverá ser uma «vital» prioridade.
Estimular a investigação, o mesmo é dizer, educar a insatisfação é a meu ver inerente à condição da Universidade. O que significa fazer alastrar esse espírito para os estudantes, e incutir-lhes essa motivação. O apelo da investigação deve ser despoletado desde logo nos nossos alunos. Nunca devemos estar satisfeitos com o conhecimento existente, devemos ir sempre mais além, e penso que esta é mesmo a condição da ciência, mormente das Sociais, e com primazia para a Sociologia. Essa é também a ferramenta certa para combater a rotina, o hábito, o terreno fértil ao vício burocrático.
Não haverá bom ensino sem boa investigação. Esta a condição para que os professores se dediquem e entreguem à nobre missão: a do binómio produção científica/ensino-aprendizagem. A UBI não pode ceder nesta matéria. Não pode permitir o primado único da docência.
Eis uma opinião, que pelo que me chega não é única, e com alguns ajustamentos talvez mereça ser devidamente ponderada e discutida entre todos.

* Docente do Departamento de Sociologia