Anabela Gradim

Ano Bom


À beira de mais um ano que se despede, e que aos portugueses não deverá deixar saudades, convém lembrar que apesar do pessimismo omnipresente, nem tudo foi tão mau quanto parece, e que 2003 que agora finda teve, pelo menos, um grande mérito que espero ver repetir no próximo - a mim, e a si leitor, este já ninguém nos tira! A este propósito, breve resenha meio aleatória do que de melhor e pior o ano trouxe:

O pior:
Declaração de guerra ao Iraque feita a partir dos Açores. Envolvimento de 10 milhões de portugueses, via José, nesse heróico feito. As televisões generalistas. A cultura obscena e barulhenta que as povoa, que nos apresentam como sendo “o povo”, mas que não o é: é apenas uma forma de o aviltar, bestializar e embrutecer, quando poderia perfeitamente, seguindo-se a direcção contrária, ser elevado e espiritualizado. O fim anunciado da RTP2. O aumento do desemprego. A intolerância dos portugueses face aos imigrantes manifestada nas recentes sondagens. A deriva do governo para a direita, quando pertencendo a um partido sem ideologia mas com “objectivos”, se deixa colonizar por um CDS que representa ínfima parte da população (criminalização do aborto e imigração). Os ricos cada vez mais ricos, e os pobres cada vez mais pobres. A constatação de que a maior miséria é moral, e a maior pobreza a de espírito, e que por isso esta não se resolve atirando-lhe dinheiro para cima. O aumento da violência sobre crianças, sob a forma de maus tratos ou exploração sexual. A recessão. O défice. A inflação. Os ministros, a filha de um deles, o curso e as demissões. Irregularidades na colocação de professores que se resolverão com o bode expiatório do costume. As confusões na Administração Interna. Não haver um único ministro do norte (Área Metropolitana do Porto) neste Governo. Dinheiro para o dr. Alberto João (segunda região mais rica do País), e falta dele para todos os outros. Por fim, a carreira política da ex-deputada Maria Elisa, eleita nas listas do PSD pelo generoso distrito de Castelo Branco, onde resido.

O melhor
A prisão de Saddam Hussein. O facto do Iraque – com todas as reservas quanto aos meios e fins – ainda não ter sido abandonado à sua sorte, visto que resiste. A ausência de ataques terroristas massivos, género bomba-suja, demonstrando que a guerra contra o terrorismo pode estar a ganhar em algumas frentes. A retoma nos Estados Unidos e na Europa. A coerência e firmeza com que o Papa, no limite das suas forças físicas, manteve uma posição pró-Paz, recordando-se que teólogos houve, em Portugal e não só, que “teologizaram” contra ela (muito se divertiria Deus às nossas custas se não fosse Sumamente Bom).
A maior visibilidade e o aumento de denúncias e condenações sobre crimes cometidos contra cianças. O crude do Prestige ter-se mantido ao largo da nossa costa (graças às orações de ministro devoto, é certo). O aumento das exportações. Os estádios do Euro2004 estarem mais ou menos prontos a horas. O controle do défice. Tímidos sinais de retoma em Portugal. A UBI e os Politécnicos das região terem mantido um bom número de acesso de novos alunos, quando a tutela tenta reduzir vagas. A ligação da Covilhã ao IP2, à Guarda e a Castelo Branco. Mais vagas para Medicina em todo o País. As belíssimas rotundas e espaços verdes com que a Covilhã tem vindo a ser ornamentada. Mais valem dois arbustos e um metro quadrado de relva do que fonte luminosa ou pindérico monumento em betão armado, e graças a Deus que um dos sítios onde se percebeu isso foi aqui.

O que está para vir:
O saldo entre este deve e haver é certamente melhor do que o espírito com que o ano foi vivido, sinal inequívoco de que é hora de os portugueses se animarem - tristezas não pagam dívidas - brindarem, com alegria e confiança, à chegada do novo ano. E arregaçarem mangas que sexta, 2, já é dia de trabalho.