Prezado senhor Director,
partindo do princípio, parafraseado do brasileiro,
de que citar não ofende, proponho aqui à
reflexão dos seus leitores um extracto do livro
Elogio do analfabetismo - Ensaio sobre a incultura
letrada, de Ricardo Paseyro, cuja versão em
Português foi editada pela Publicações
Europa-América. O autor fala da escola francesa,
mas as conclusões parecem-me aplicar-se a todos
os paises da Europa e mesmo de todo o Ocidente.
À página 134:
Ousarei reiterar,..., a minha hipótese de que,
no Ocidente, a alfabetização universal capaz
de converter todos os homens em bacharéis é
uma perversa utopia? Apenas os regimes totalitários
possuem os meios coercivos para a tentar.
À página 144:
Sob as ruínas de uma cultura que a Universidade
já não protege, os meios de comunicação,
o dinheiro e a publicidade conquistam, sem dificuldade,
as Letras e as Artes que eram outrora relativamente livres.
Uma sucessão ininterrupta de imagens efémeras
distrai o espírito e os conhecimentos pacientemente
adquiridos são varridos pela onda de uma informação
"insuflada, disforme, maquilhada, perversa, numa
palavra, falsa, por natureza e por função",
escreve Annie Kriegel (artigo de jornal). A ideologia
(cuja última astúcia é convencer-nos
da sua própria morte) sufoca a sensibilidade e
as religiões abaixam-se ao papel de servidoras
da Sociologia.
Já não estamos num sistema totalitário,
mas sim num sistema totalizante. Assenta no relativismo
cultural: tudo é cultura, toda a "pintura"
é pintura, toda a "música" é
música, toda a "poesia" é poesia,
toda a "literatura" é boa se a televisão
as acolhe e se as recompensas as oficializam.
Já desmoralizadas e amputadas daquilo que as religiões
vivas ofereciam de maravilhoso e de sobrenatural, as nossas
sociedades também se privam - abstendo-se de emitir
juízos de valor - do último fermento criador,
dessa "visão artística do mundo"
desejada por Nietzsche.
Esperando que a amostra, embora incómoda, tenha
sido estimulante, despeço-me.
Atenciosamente
Eduardo Segre
Depto. de Física da UBI
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