José Geraldes

Abril hoje


Os mais novos – e é cerca de 40 por cento da população- não imaginam o que era viver em Portugal antes do 25 de Abril de 1974.

O 25 de Abril de 1974 era inevitável. Portugal não podia continuar no estado em que se encontrava. A “primavera marcelista” tinha desiludido todos quantos esperavam uma mudança política em ordem a um regime democrático.
A “abertura” manifestada não havia modificado o estado de coisas do País. A guerra nas ex-colónias impunha uma solução. E a existência de uma polícia política e da censura na imprensa continuavam na lógica da ditadura de Salazar.
O livro Portugal e o Futuro do General Spínola lança um debate que vai desembocar numa tomada de consciência da classe militar.
Se bem que os primeiros movimentos das Forças Armadas sejam de carácter reivindicativo de tipo salarial, a componente política apodera-se dos seus membros.
O capitão Salgueiro Maia que comandou o pelotão de Santarém até ao Largo do Carmo, em cujo quartel da GNR Marcelo Caetano se rendeu, usava uma expressão reveladora : “Em Portugal, havia três Estados : O Estado comunista, o Estado socialista e o estado a que o País tinha chegado”.
Claro que já tinha havido tentativas para derrubar o regime, mas sem sucesso.O próprio 25 de Abril não teve o mesmo sentido para todos os que intervieram na sua execução.
Se para uns, como ficou patente, era a instauração de uma “Cuba” na Europa, para outros seria criar uma sociedade governada pelo método do poder popular.
O 25 de Novembro comandado pelo General Ramalho Eanes restabeleceu o sentido que esteve na origem do Movimento das Forças Armadas: a instauração das liberdades cívicas e a realização de eleições livres para uma democracia representativa parlamentar.
De um simples golpe militar passou-se a uma revolução que fez uma ruptura com o sistema ditatorial vigente. Revolução sem tiros e cujo símbolo era um cravo vermelho no cano das espingardas. Revolução que o professor de Harvard, Samuel Huntington, disse ser o início da “terceira vaga da democracia” na Europa.
Com o 25 de Abril, Portugal entrou num novo capítulo da sua história de 800 anos. Uma nova era se abria no seu horizonte. Abandonado o Império das ex-colónias, o País toma a opção europeia com a entrada para a então denominada CEE (Comunidade Económica Europeia) depois transformada na União Europeia.
A Revolução de Abril propunha o programa dos três D : “Descolonização, democratização, desenvolvimento”. Passados 30 anos, os dois primeiros já estão realizados. Quanto ao último, muito se fez mas há ainda trabalhos de Hércules a enfrentar.
Os mais novos – e é cerca de 40 por cento da população- não imaginam o que era viver em Portugal antes do 25 de Abril de 1974. O País deu um salto de gigante no progresso quase correspondente a um século. A taxa de analfabetos desceu de 25 por cento para 9 por cento. Só 48 por cento das famílias tinham água canalizada. Hoje 97,9 beneficiam deste melhoramento. A rede de auto-estradas passou de 80 quilómetros para 1800. Os alojamentos familiares passaram de 2 milhões e 700 mil para mais de 5 milhões. O poder local tornou-se num agente de progresso.
Segundo o Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas, Portugal ocupa, hoje, o 23.º lugar do “ranking” mundial. De 1933 a 2002, ultrapassámos 23 países.
Mas também há o reverso da medalha. As desigualdades acentuaram-se. E, segundo uma sondagem recente, 42 por cento dos portugueses consideram que dos objectivos de Abril falta cumprir a melhoria da condição dos mais desfavorecidos e 36 por cento o aumento da qualidade de vida da população. É um facto que a classe média está em declive. E precisa de se tornar forte em ordem ao futuro colectivo.
Actualmente, estamos a ficar para trás. Outros países já nos passaram à frente inclusive do Leste que, partir de 1 de Maio, entrarão para a União Europeia.
Os capitães de Abril abriram-nos o caminho para um País novo. Que a sociedade civil e os políticos tomem consciência do facto para cumprirmos o compromisso de um melhor Portugal. Para que o desenvolvimento chegue a todos os cidadãos. Com o espírito de Abril.