José Geraldes

Quando o futebol vence eleições


Noticiava o jornal Público que o Euro 2004 tinha batido as eleições nas audiências de televisão. O jogo de futebol França-Inglaterra foi o programa mais visto no domingo com uma audiência muito superior à divulgação dos resultados das eleições europeias.
Além da taxa elevada da abstenção no acto de votar, os portugueses interessaram-se mais por um jogo de futebol do que em seguir uma noite eleitoral em que o futuro da sua vida colectiva estava também em jogo. Mas, como costumava dizer, muitas vezes, Victor da Cunha Rego, as coisas são como são. E não há que violentá-las, pois trata-se de uma verdadeira perda de tempo.
O alheamento dos resultados do escrutínio eleitoral revela claramente que o tema Europa ainda não atingiu o patamar de mobilização desejado. Aliás, também nos restantes países da União Europeia houve um grande desinteresse.
O facto parece contraditório quando, afinal, as sondagens têm revelado que as opiniões públicas desejam uma Europa Comunitária o mais aprofundada possível.
Certamente, haverá razões para um tal alheamento. Por um lado, os responsáveis políticos ainda não terão encontrado a fórmula ideal para interessar os cidadãos dos seus países pela Europa. Ou então fazem-no de tal forma que os eleitores não são cativados.
Por outro lado, os cidadãos sentem longe a realidade europeia. Ou seja, não estão convencidos de que eleger deputados para o Parlamento Europeu seja tão importante como participar na eleição de deputados para os Parlamentos nacionais.
É lícito tirar esta conclusão pelo sentido de voto manifestado. Os eleitores votaram pensando sobretudo nos problemas concretos dos seus países. E aproveitaram estas eleições para darem avisos sérios aos seus governos.
Vejam-se os casos exemplares de Portugal, França e Alemanha. Os governos no poder sofreram derrotas humilhantes que devem levá-los a uma reflexão muito séria sobre as políticas a seguir. E as reformas a empreender de forma a diminuir o desemprego e implantar modelos de desenvolvimento que não frustem os desejos dos cidadãos.
No caso português, a derrota assume proporções de maior grandeza por se tratar de uma coligação governamental que se supunha, à partida, conseguir maior número de deputados. Tal não aconteceu. A descida de votos, para lá da abstenção, configura uma derrota com uma mensagem bem clara.
O Primeiro-ministro, Durão Barroso declarou com palavras de verdade ter compreendido o que os eleitores quiseram dizer. E será da maior inabilidade política não proceder em conformidade com decisões que devem ser tomadas a prazo.
Este resultado é uma penalização severa para a Coligação. E não há que mergulhar na areia como a avestruz. Dois anos para as próximas legislativas passam depressa.
Até 4 de Julho, os portugueses estão ocupados com o Euro 2004. Depois são as férias.
Se a retoma económica não chegar, as empresas continuarem a falir, o investimento a tardar, avizinham-se tempos difíceis.
O País precisa de um rumo definido e não de meras medidas avulsas.