Por Celine Martins



"O que gostaríamos era que o teatro, como arte milenar, continuasse a ser um meio de comunicação de referência"

Urbi et Orbi - Como surge o Teatro das Beiras?
Fernando Sena -
O Teatro das Beiras surge há trinta anos, a partir do GICC, que era um grupo de teatro amador. Surge quase como uma evolução natural. Chegou o momento em que achamos que era necessário dar o salto para uma estrutura mais sólida, com outra disponibilidade e daí a formação de uma companhia profissional.

Urbi et Orbi - Quantos profissionais formam a equipa do Teatro das Beiras?
Fernando Sena -
Neste momento, na companhia, entre actores, técnicos e outros, somos cerca de quinze pessoas.

Urbi et Orbi - Como são recrutados os actores?
Fernando Sena -
São actores profissionais. Uns são recrutados após a saída das escolas, isto porque há anteriormente a observação dos actores ainda na escola, nomeadamente nas provas finais dos cursos. Outros conhecemos de outras companhias e de outros trabalhos.

Urbi et Orbi - Como vive o Teatro das Beiras? Recebem apoios suficientes?
Fernando Sena -
Não, não se recebem muitas verbas... O Teatro das Beiras tem o apoio para a produção de espectáculos que é contemplado anualmente pelo Ministério da Cultura. No nosso caso, o último foi há quatro anos, uma vez que nos candidatamos a um apoio quadrienal. A estes apoios juntam-se as receitas que fazemos com os espectáculos.


"Uma das necessidades que se sente no teatro é a de nova escrita"



“O teatro é diferente todos os dias, mesmo que seja a mesma peça a ser representada”

Urbi et Orbi - Como caracteriza o tipo de teatro que fazem?
Fernando Sena -
Bem... uma companhia sediada no interior tem de ter um leque grande de incursões para poder chegar a mais público e, portanto, esse é o nosso objectivo e uma das nossas preocupações quando se preparam espectáculos, sejam eles para crianças, espectáculos de rua, ou outros.
Fazemos peças com textos de autores conhecidos como Beckett, Bertolt Brecht,
Gil Vicente. E fazemos outras com base em novos dramaturgos, porque achamos que é importante que eles sejam representados para que possam continuar a escrever. E uma das necessidades que se sente no teatro é a de nova escrita.

Urbi et Orbi - O Teatro das Beiras é reconhecido a nível nacional?
Fernando Sena -
O Teatro das Beiras faz espectáculos a nível nacional e nessa perspectiva é uma companhia reconhecida.

Urbi et Orbi - Que tipo de relação tem o Teatro das Beiras com o Teatr'UBI e o ASTA?
Fernando Sena -
Bom... Não há uma relação muito intensa entre as companhias. Há uma relação entre as pessoas que fazem teatro. Claro que era importante que essa
relação fosse desenvolvida, mas isso tem de ser uma opção colectiva, de todos.

Urbi et Orbi - Acha que a televisão e o cinema "roubam" espectadores ao teatro?
Fernando Sena -
São lutas desiguais. A televisão é um meio de comunicação quase directo que entra pelas casas. Para ver teatro, as pessoas têm de se deslocar e por vezes há uma grande dose de comodismo. O teatro não pode competir com a televisão. Aliás, penso que a televisão hoje também é feita para que as pessoas fiquem em casa, ao contrário do que me pareceria normal. A televisão deveria ser um meio de divulgação das artes em geral, e assim do teatro em particular.

Urbi et Orbi - Os encantos do teatro, em relação à televisão, são quais?
Fernando Sena -
Há pessoas que dizem que já viram teatro na televisão, mas é completamente diferente. O teatro é um espectáculo que vive da comunicação entre os
actores e o público. O teatro é diferente todos os dias, mesmo que seja a mesma peça a ser representada. Isto porque todos os dias, as pessoas têm emoções diferentes e vivem de maneira diferente cada espectáculo. Na televisão e no cinema, ao fim de quinze, vinte ao mesmo trinta anos, o que se vê é igual. Não há comparação entre o cinema, a televisão e o teatro. Cada um tem o seu espaço, e o que gostaríamos era que o teatro, como arte milenar, continuasse a ser um meio de comunicação de referência.

Urbi et Orbi - Esteve sempre ligado ao teatro?
Fernando Sena -
Sim, desde a fundação do Teatro das Beiras, há trinta anos. É muito tempo.

Urbi et Orbi - Quando era pequeno, sonhava em ser o quê?
Fernando Sena -
Gostava de futebol, de andebol. Via-me como praticante de desporto. Bem, quando andava a estudar estava sempre ligado a eventos culturais. Tanto no liceu, como na zona onde vivia. Mas, nunca pensei fazer teatro e estar ligado a uma companhia profissional.

Urbi et Orbi - Como se caracteriza como homem?
Fernando Sena -
... Simples...

Urbi et Orbi - Uma peça que o marcou?
Fernando Sena -
É difícil nomear uma depois de trinta anos a ver teatro. Viu-se muita coisa bonita, bons actores, grandes espectáculos. Mas no Teatro das Beiras há um espectáculo marcante. Foi feito, salvo erro, em 1999 e chamava-se "Uma das Últimas Tardes de Carnaval". Para mim, é um espectáculo que marca a companhia em termos das produções que fez ao longo destes anos.


"O teatro é um espectáculo que vive da comunicação entre os
actores e o público"



“A política da câmara em relação ao teatro e até à cultura em si é uma aposta fraca”

Urbi et Orbi – Está prevista a construção de um Centro de Artes na Covilhã. O que pensa disso?
Fernando Sena -
Eu não gostaria de me pronunciar muito sobre o Centro de Artes porque é uma questão que nos é extremamente cara. A proposta da construção de um
teatro e de um teatro que servisse o Teatro das Beiras foi feita pela nossa companhia. Para isso, desenvolvemos várias acções durante vários anos para que esse teatro fosse uma realidade. O próprio espaço onde vai ser construído o Centro de Artes foi um espaço que o Teatro das Beiras conseguiu e repentinamente, e sem grandes explicações, fomos arredados desse processo.

Urbi et Orbi - Mas é uma infra-estrutura fundamental e imperativa para a cidade, ou nem por isso?
Fernando Sena -
Acima de tudo, o que achamos importante é que a Covilhã tenha estruturas que possam acolher espectáculos e estruturas que tenham condições que sejam compatíveis com os avanços tecnológicos que houve tanto ao nível de equipamentos como também da qualidade e do conforto que os espectadores possam ter. Portanto, o que gostaríamos era que o Centro de Artes fosse uma realidade que servisse a Covilhã e que não fosse apenas uma estrutura sem qualquer tipo de sentido. Ficaríamos contentes, mesmo não estando lá como gostaríamos.

Urbi et Orbi - O que pensa do teatro? Qual é a política cultural da Câmara Municipal da Covilhã quanto a esta arte?
Fernando Sena -
A política da câmara em relação ao teatro e até à cultura em si é uma aposta fraca. É evidente que estruturas profissionais, quer sejam na área do teatro, da música ou outras artes, estão em situações complicadas. É o caso do Teatro das Beiras. Na Covilhã e interior do país, há uma predisposição menor das pessoas para as actividades culturais e é por isso que deveria haver um forte incentivo, não só ao nível financeiro, por parte das autarquias. A Câmara da Covilhã não entende assim e o Teatro das Beiras tem de fazer o seu percurso de outra forma, apostando em fazer espectáculos pelo país, e não tanto na sua zona natural de intervenção.

Urbi et Orbi - Há alguma estreia em agenda?
Fernando Sena -
Sim... No início da segunda quinzena de Outubro, vamos estrear um
espectáculo que é constituído por vários textos de Eduardo de Filippo, a que o autor chamou "Crónica dos Dias Ímpares". Será ainda realizado o Festival de Teatro da Covilhã, nos fins de Novembro, inícios de Dezembro. Ficará, desta forma, completa a actividade da companhia para o ano de 2004.