Por António Gil



O ambiente em que decorre toda a encenação é uma mistura de ficção científica com realidade

Foi um espectáculo memorável para aqueles que assistiram, no passado dia 6 de Novembro no Teatro-Cine da Covilhã, à apresentação da “peça” Wasteband de Patrícia Portela, integrada no Festival Y#02. Foi a quebra de todos os tabus, na maneira de fazer teatro, de estar em palco e fundamentalmente na maneira de “agarrar” o espectador. Neste espectáculo o público é levado a participar, deixando a fase tradicional, ou seja, estar sentado a ver os actores, e passa para o outro lado, o palco.
É um espectáculo que tem no máximo trinta pessoas, apesar de naquela noite haver um pouco mais. Inicia-se, com uma breve apresentação, onde se salienta um certo tom irónico na linguagem utilizada e a explicação do que irá acontecer. Posteriormente, os espectadores são encaminhados para o palco, onde se encontra uma mesa elíptica, tendo no centro a projecção na vertical de imagens, rodeada de bancos utilizados em aviões, com os indispensáveis cintos de segurança. Nesta mesa encontram-se dispersos vários monitores, dando-nos a sensação de uma certa virtualidade, bem como, um lápis e um pequeno livro de apontamentos. Todos os que assistem à peça tornam-se assim parte dela e são convidados a sentar e a embarcar, no virtual.
Transportado através do tema, “a espera”, o público fica envolvido com a cena. Sucedem-se diversas e variadas imagens, o espaço, cosmonautas, um ritual chinês, que considera que “a lua cairá numa praia cheia de sapos e regressará aos oceanos, lugar a que sempre pertenceu”. Um espectáculo onde fica vincada a passagem de meros espectadores a participantes, acabando, o público, por ficar imbuído naqueles cenários, tudo ocorre na sua mente, faz mesmo recordar, pensar e imaginar coisas de outros locais. Questiona quem terá começado primeiro, o tempo real ou o virtual. Através de jogos de palavras e de imagens, acaba por conduzir todos os espectadores aos confins da mente. “ Há pessoas que não têm tempo, vêm o tempo passar”; “Se os desejos fossem, já não eram desejos”; São estas frases, um pequeno exemplo do jogo que se pode fazer com elas.
“Westeband é o espaço onde todas as ideias aparecem, caso se concretizem ou não”. É um monólogo, com a duração aproximada de setenta cinco minutos, nada pesado, antes pelo contrário, existe a tentativa de aproximar todos aqueles que participam, de uma ideia única, “ser virtual sem ser digital”.
Wasteband ou waisteband, Patrícia Portela fez-nos essa distinção: “Waisteband é a tal faixa que servia para dar forma à cintura dos vestidos que as senhoras usavam; Wasteband é uma faixa de tempo de desperdício, Waste como desperdício, portanto é uma faixa de tempo perdido, que é onde nós nos encontramos”. Sobre os efeitos que este tipo de teatro provoca, salientou que não tem acesso a eles, “mas à partida cada um tem o seu percurso”, sendo esse o “verdadeiro sentido desta peça virtual”. O percurso que as “pessoas fazem para seguir as várias histórias, que vão acontecendo ao mesmo tempo, isso é um percurso pessoal, essa sim é a verdadeira peça virtual”. Considerou o público da Covilhã, “bastante acolhedor e receptivo”, quanto ao número bastante reduzido de pessoas que podem assistir ao espectáculo, considerou que quantidade não é sinónimo de qualidade.
Quanto ao espaço onde decorreu a peça, achou-o “muito acolhedor, bonito e onde houve mais interactividade de conseguir ver os olhares e as reacções dos participantes”; salientando “que isso dá imensa vontade e motivação de continuar e ir melhorando o espectáculo”.

 





Sobre a peça



Patrícia Portela - (1974). Tem o bacharelato em realização plástica do espectáculo na ESTC em Lisboa, MA of Arts in Scenography na Faculty of Theatre the Utrecht e Central St. Martins College of Art, European Film College na Dinamarca.
Trabalha desde 1994, para diferentes companhias de teatro independente, sobretudo como figurinista, cenógrafa, guarda-roupa e decoração, em curtas-metragens.
Escreveu e coordenou várias performances das quais se destaca “Operação cardume rosa”, 1998, “T5” (Prémio Encenação Teatro na Década), 1999 com o grupo “O resto” ou “Lan Tao”, 2000, “Odilia” 2002, “oogopslag”, 2003 e 2004.
Desde “Wasteband”, 2003 (Prémio Reposição Teatro na Década e Menção Honrosa do Prémio Acarte/Madalena de Azeredo Perdigão) o foco principal é a relação entre tempo e espaço, virtualidade e realidade, nas artes performativas e na vida quotidiana; através do texto, da linguagem e do uso da tecnologia, em “palco”.
Com a colaboração de Christoph De Boeck; Eric da Costa e de Patrícia Bateira.

Urbi @ Orbi - Porquê Wasteband?
Patrícia Portela -
Wastebanb é a tal faixa, com i Waisteband é para agarrar a cintura que dantes as senhoras usavam e Wasteband é uma faixa de tempo de desperdício, Waste como desperdicio, portanto é uma faixa de tempo perdido que é onde nós nos encontramos.

U@O - Acha que esta parte do teatro virtual tem uns efeitos diferentes, logo os efeitos colaterais são aqueles esperados?
P. P. -
Isso agora compete aos participantes, porque eu não tenho acesso aos resultados dessa forma tão concreta, mas à partida cada um tem o seu percurso, o verdadeiro sentido desta peça virtual é o percurso que as pessoas fazem para seguir as várias histórias que vão acontecendo ao mesmo tempo e isso é um percurso pessoal e essa sim é a verdadeira peça virtual.

U@O - Acha que aqui a nível do interior há essa possibilidade de propagação deste tipo de teatro?
P. P. -
Eu acho que sim, que tem todas as possibilidades, até porque é um público bastante acolhedor e bastante receptivo
Estamos sempre dependentes do número de pessoas que assistem ao espectáculo?
O que quer dizer que não seja melhor ou pior, conforme a quantidade, porque há espectáculos bastante íntimos, com 4 ou 5 pessoas que possa ser bastante mais intenso.

U@O - O que quer dizer que a quantidade não quer dizer qualidade? P. P. -Exactamente.

U@O - O que é que está a achar da Covilhã, já deu alguma volta?
P. P. -
Temos estado aqui fechados, mas é dos espaços mais acolhedores, muito bonito, mais engraçado e onde houve mais interactividade de conseguir ver os olhares, as reacções e tudo. Isso dá imensa vontade e motivação de continuar e ir melhorando o espectáculo.
Ou seja está sempre com ideias de cá voltar novamente? Sim, claro.