José Geraldes

Campanha, votos e Irmã Lúcia


1. A campanha das Legislativas 2005 deixou muito a desejar. E ficou marcada por pontos altamente negativos.
Trazer a público a vida privada dos candidatos não se justifica por nenhum motivo. Basear argumentos em boatos é brincar com coisas sérias. E um atentado à dignidade das pessoas.
Houve muitas promessas dos candidatos. Que não vão ser cumpridas. Quem for governo, desculpar-se-á com razões sem fundamento. É o costume.
Não se ouviu nos comícios e sessões de esclarecimento o anúncio das reformas inevitáveis para o País andar para a frente. Ninguém se comprometeu com as rupturas necessárias num Portugal em crise.
Procurou-se o poder, mas estar no poder e governar com coragem e sabedoria e bom-senso exige clarividência e sentido do futuro.
A própria comunicação social cometeu erros contrários aos critérios básicos do jornalismo. O facto tornou-se mais grave por se tratar de órgãos de imprensa considerados de referência mas onde a ética não pontificou. É caso para perguntar que interesses se movem por detrás de notícias fabricadas e distorcidas.

2. Em quem votar? Nos Estados Unidos, há a tradição de os jornais, em editorial, aconselharem o voto no seu candidato preferido. No mundo latino, não existe este hábito. E, muito menos, em Portugal. Por isso, não aconselhamos o sentido do voto.
Aliás, o voto é livre e depende da consciência de cada um. E ninguém tem o direito de violentar o voto do seu semelhante. Perante as propostas dos programas partidários, os eleitores decidem o que consideram melhor para o País. Felizmente estamos em democracia e nada pode influenciar o nosso voto.
Para um cristão, o voto está em consonância com a sua crença. Ou seja, a “doutrina moral e social cristã” baliza o leque da sua escolha. No documento publicado pelos bispos portugueses em Dezembro passado, lê-se que se devem “apreciar as soluções objectivas para o Governo da Nação”. E a seguir: “Para tal, importa avaliar da sua justiça, da sua viabilidade, da sua consonância com os princípios da dignidade humana, do respeito pela vida, da dimensão social que todas as políticas devem ter. Para os cristãos, o critério de avaliação é o Evangelho e a doutrina social da Igreja”.
Mas deixar de votar é que não. Todos somos responsáveis pelo futuro do País. O nosso voto contribui para uma escolha responsável do nosso destino colectivo. Nem a preguiça nem o humor do dia nos devem levar à abstenção.
Não votar equivale a desinteresse da coisa pública. E nem desculpa de que “os políticos são todos iguais”, “eles o que querem é ganhar o deles” justifica o ficarmos em casa. O votar compromete-nos. Trata-se de um dever a cumprir sem qualquer desculpa.

3. A morte da Irmã Lúcia, última vidente das aparições de Fátima, leva-nos a não resistir a dar um testemunho pessoal sobre a sua personalidade.
Em 1986, tivemos o privilégio de secretariar o Cardeal Lustiger, arcebispo de Paris numa visita a Portugal. O programa elaborado por D. Eurico Dias Nogueira, na altura arcebispo de Braga, contemplava uma visita à Irmã Lúcia no Carmelo de Coimbra.
No diálogo entre o Cardeal Lustiger e a Irmã Lúcia, servimos de tradutor uma vez que a vidente não falava francês.
Impressionou-nos o seu olhar penetrante, a simplicidade com que respondia às perguntas do Cardeal e a serenidade que punha nas respostas. E sempre com um sorriso que irradiava paz.
Foi um momento de tal forma único que não só nos inundou de alegria mas também nos transmitiu uma sensação espiritual de paraíso na terra.