Por Rosa Ramos



"A avaliação foi instituída com o objectivo de estimular a melhoria da qualidade do sistema de ensino"

Urbi @ Orbi- O que se pretende, exactamente, com este processo de avaliação dos cursos de Ensino Superior?
Artur Patuleia -
Esta avaliação foi instituída, de uma forma geral, com o objectivo de estimular a melhoria da qualidade do sistema de ensino. Pretende-se, por outro lado, informar a comunidade educativa e não académica sobre o desempenho, em vários níveis, das licenciaturas. A avaliação deverá contribuir para um crescimento ordenado e lógico do sistema de ensino português, assegurando-se, em simultâneo, uma rede de comunicação eficiente entre todas as intituições do Ensino Superior.

U @ O – Este conjunto de objectivos e o próprio conceito de avaliação dos cursos não é algo de recente, na verdade...
A.P.–
Não, de facto. Em 1995 foi assinado um protocolo entre o Ministério da Educação, o Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP) e a Fundação das Universidades Portuguesas (FUP), no sentido de criar o Conselho de Avaliação da Fundação das Universidades Portuguesas (CAFUP). Este órgão coordena o processo de avaliação dos Ensinos Superior Público e Concordatário (Universidade Católica).
Actualmente, estamos no final do segundo ciclo de avaliação. O primeiro durou seis anos. No primeiro ano da sua existência, fez-se um projecto-piloto, em que apenas alguns cursos foram avaliados, a título experimental. De seguida, procurou-se proceder a uma avaliação mais profunda. Este segundo ciclo que está a decorrer deveria ter tido apenas quatro anos. Porém, encontramo-nos, já, no seu quinto ano de existência. As causas deste prolongamento prendem-se com falta de verbas. Esta é, aliás, uma situação que eu gostaria de ver alterada. Afinal, não podemos correr o risco de perder a objectividade, a confiança e a credibilidade do processo de avaliação por não se cumprirem prazos em tempo oportuno. Não podemos estar dependentes da disponibilidade do próprio ministério.

U@O- Falando agora do Artur, como surgiu a oportunidade de chegar a representante dos estudantes do ensino superior a nível nacional?
A. P. –
Era um interesse meu, devo dizer. Estive na Associação Académica da Universidade da Beira Interior (AAUBI) no ano lectivo de 2003-2004, como Coordenador da Secção Pedagógica. Nesse sentido, fui sempre acompanhando os Encontros Nacionais de Direcções Associativas (ENDA’s) e as questões pedagógicas e de avaliação a nível nacional. Portanto, a minha candiatura surgiu de uma forma quase natural. Fui extremamente bem aceite pela Associações Académicas, que me elegeram por unanimidade, em conjunto com o Berto Messias, de Coimbra. Tenho plena consciência, por outro lado, de que este factor me acarreta uma reponsabilidade adicional. De qualquer forma, e embora tenha sido eleito há pouco mais de um mês, tenho consciência de que o trabalho será muito, mas é com grande vontade que o realizarei.

U@O- Ainda neste sentido, qual é, concretamente, o seu papel junto dos órgãos de avalição do Ensino Superior?
A.P. –
A nossa participação, enquanto representantes dos alunos, não se faz tanto a nível científico. Posso dizer que a minha função acaba por ser a de mediador entre as Associações Académicas (que ouvem os estudantes e me transmitem os seus anseios e as suas preocupações) e os órgãos de avaliação. Acompanho o processo, faço a ligação com as Associações, dando-lhes a conhecer os problemas que vão surgindo e o próprio desenrolar dos trabalhos. Já reuni com grande parte delas, ouvi-as e apresentei, também, algumas soluções. Têm surgido alguns problemas, que se prendem com o facto de algumas instituições não reconhecerem, por exemplo, os relatórios que a Comissão de Avaliação Externa (CAE) emite. Os estudantes, de uma forma geral, têm, também, mostrado interesse em saber o que vai acontecer com Bolonha e até que ponto será, ou não positivo. O processo de avaliação está, neste momento, na fase de visitas às instituições. Em Maio, começarão as primeiras reuniões para tomar medidas. Começar-se-à, por outro lado, a perspectivar aquilo que vai ser o terceiro ciclo de avaliação.





"Algumas instituições não reconhecem os relatórios das Comissões de Avaliação Externa"

U@O - O Artur sente que os alunos são verdadeiramente ouvidos e tidos em conta no desenrolar deste processo?
A.P. -
Por ter sido eleito há tão pouco tempo, ainda não tenho a experiência necessária para saber como se vão desenrolar determinadas situações. De qualquer forma, e até ao momento, as Associações têm sido extremamente abertas. Espero que a minha voz possa ser ouvida e que não haja entraves às nossas opiniões e à nossa participação. Existem muitas questões que fazem falta aos estudantes. Há um subinvestimento na educação por parte do próprio Estado, sobretudo no que se refere ao Ensino Superior. Existem muitas questões pedagógicas que limitam a normal progressão do estudante no seu percurso académico. A acção social, como todos sabemos, não é para todos. Na verdade, estas e outras situações perpetuam-se ao longo dos anos, enquanto que os estudantes apresentam, sucessivamente, propostas relativas à melhoria das instituições. Espero poder contribuir de alguma forma para que os estudantes possam ser, por fim, ouvidos.

U@O - E como se desenrola o processo de avaliação, propriamente dito?
A.P. -
O CAFUP aprova o calendário da avaliação dos diferentes cursos ao longo de um dado ciclo de avaliação. Elege, ainda, as diferentes Comissões de Avaliação Externa (CAE). Posteriormente, a avaliação acontece em duas fases: a auto-avaliação e a avaliação externa. Na primeira, as instituições elaboram uma avaliação interna seguindo as directivas de um guião que é aprovado no CAFUP e homologado pelo Ministério. Na segunda fase, de avaliação externa, a CAE visita as instituições, procurando tomar conhecimento da realidade dos cursos em fase de avaliação. Daqui resultam relatórios que, algum tempo depois, são tornados públicos. Trata-se de um processo algo moroso e de extrema importância, por englobar parâmetros diversos. Neste momento, existem 14 pontos a ser avaliados: instalações, corpo docente, teses científicas que foram produzidas, situação dos estudantes já no mercado de trabalho, entre outros.



"A avaliação trata-se de um processo moroso e de extrema importância"

"Outro problema que me preocupa bastante diz respeito à internacionalização do nosso Ensino Superior"

U@O - De uma forma geral, sente-se satisfeito o desenvolvimento do processo de avaliação?
A.P. -
O não cumprimento das recomendações que são apontadas pelas CAE nos relatórios de avaliação finais constitui, a meu ver, um dos principais problemas no que se refere ao bom desenvolvimento do processo. Muitas vezes, isso acontece pelo facto de as instituições não terem verbas para tal. No entanto, existem outras que entendem que a avaliação foi injusta ou mesmo pouco idónea. Outro problema que me preocupa bastante diz respeito à internacionalização do nosso Ensino Superior. Em cada cinco membros da CAE, um terá de ser, forçosamente, estrangeiro. No entanto, o que acaba por acontecer é que são escolhidos portugueses docentes no estrangeiro, brasileiros e espanhóis para ocupar tal papel, porque os relatórios não são traduzidos e exige-se que o tal perito estrangeiro domine a língua portuguesa. Ora isto vai, obviamente, restringir a qualidade e a avaliação construtiva com que um perito estrangeiro poderia participar. E mais grave ainda, isto acontece por não existirem verbas para elaborar os relatórios e traduzi-los posteriormente para a língua inglesa. A falta de abertura de Portugal à participação e à consulta estrangeira deverá ser uma situação a inverter urgentemente. Isto, se queremos um sistema de Ensino Superior de qualidade, que receba contributos vindos do estrangeiro e que seja reconhecido e credibilizado num contexto europeu.

U@O- Sente que existe um desinteresse generalizado e crescente, por parte dos estudantes, no que se refere às questões do associativismo académico? Enquanto elemento mediador, entende que essa situação poderá, de alguma forma, ser colmatada?
A.P. – Enquanto estive ligado à AAUBI, senti, de facto, alguma dificuldade em chegar aos alunos. A questão da mobilização tem-se mostrado extremamente complicada. Admito que há, realmente, um certo afastamento dos estudantes em relação a questões como a política social, a pedagogia e a política educativa. Não sei se a mensagem não passará ou se, por outro lado, esta situação terá a ver com a preocupação cada vez maior, por parte dos estudantes, de acabar rapidamente os seus cursos. Afinal, o Ensino Superior é cada vez mais dispendioso.





Perfil



Artur Filipe Schouten Patuleia tem vinte anos e frequenta o terceiro ano da licenciatura em Engenharia Electromecânica na UBI. O penúltimo nome, fora do vulgar, prende-se com o facto de ter ascendência holandesa, pela parte materna. A Holanda foi, aliás, o país que o viu nascer.
Apesar das lides no associativismo académico, não lhe falta tempo para ser um aluno aplicado. Actualmente, Artur Patuleia tem média de 15 e não descura as preocupações de qualquer estudante normal no que se refere ao ingresso no mercado de trabalho. Confrontado com a pergunta relativa a projectos para o futuro, diz com convicção que deseja “terminar a licenciatura com sucesso”.
O seu percurso nestas andanças do associativismo não é de agora. Do currículo de Artur constam a particiapção activa na Associação de Estudantes da Escola Secundária Campos Melo (Covilhã). No ano lectivo de 2003/2004, Artur ingressa na AAUBI, assumindo um cargo nada fácil. Na verdade, coube-lhe a Coordenação da Secção Pedagógica. O contacto directo com esta área permitiu-lhe estar mais à vontade na candiatura ao cargo de representante dos estudantes no Conselho de Avaliação da Fundação das Universidades Portuguesas.
Interessado por tudo o que diz respeito às questões da actualidade, confessa-se leitor assíduo da imprensa. O jornal “Expresso” e a publicação internacional “The Economist” constituem os títulos de leitura regular de Artur. Kafka é uma das suas preferências em matéria de livros. Sérgio Godinho, REM e Simply Red é o que prefere ouvir nos tempos livres. Como filme de eleição, Artur escolheu “JFK”, de Oliver Stone. Nas últimas férias esteve na Indonésia. Um dos seus desejos é voltar brevemente. Até lá, Artur Patuleia promete continuar a defender, acerrimamente, os interesses dos estudantes do Ensino Superior.