  
                          José Geraldes 
                         
                     | 
                      Direitos 
                        dos doentes e humanização dos hospitais 
                         
                         
                         A maioria dos hospitais 
                        portugueses ignora a Carta dos direitos dos doentes. Esta 
                        é a conclusão de uma avaliação 
                        efectuada pela organização internacional 
                        “Active Citizenship Network”. A avaliação 
                        consistiu em verificar a forma como os direitos dos doentes 
                        são respeitados em 12 dos mais antigos membros 
                        da União Europeia. Portugal surge de entre estes 
                        países o que menos respeita os direitos dos doentes. 
                        A falta de conhecimento desses direitos pode lesar o doente 
                        no seu direito à privacidade e confidencialidade. 
                        E ainda não ser confrontado com a possibilidade 
                        de autorizar intervenções de risco – 
                        o chamado consentimento informado – e o não 
                        respeito do “direito ao tempo” ou hora marcada, 
                        ficando sujeito a longas esperas. 
                        O resultado da avaliação é chocante 
                        na medida em que os direitos do doente estão bem 
                        explícitos em documentos importantes como a Declaração 
                        Universal dos Direitos do Homem, a Constituição 
                        da República Portuguesa, a Lei de Bases da Saúde, 
                        o Estatuto Hospitalar e o Regulamento Geral dos Hospitais. 
                        Em pormenor, os direitos dos doentes são enumerados 
                        na Declaração sobre os direitos do doente 
                        ou Declaração de Lisboa aprovada pela Associação 
                        Médica Mundial em 1981 e na Carta dos direitos 
                        das pessoas doentes aprovada pelo Bureau Regional da Europa 
                        da Organização Mundial de Saúde. 
                        Em Portugal, a Direcção Geral de Saúde 
                        elaborou a Carta dos Direitos e Deveres do Doente que 
                        resume os documentos mencionados. 
                        O primeiro direito é o doente ser tratado como 
                        pessoa, na sua dignidade humana. Deste direito decorrem 
                        os restantes. O doente chega frágil ao hospital. 
                        Daí o seu direito a um acolhimento digno e não 
                        ser tratado como uma caso ou um número. 
                        As convicções religiosas, culturais e filosóficas 
                        merecem todo o respeito e não podem se ridicularizadas 
                        ou rebatidas. O contacto com o ministro religioso deve 
                        ser imediatamente facilitado. O doente tem direito a receber 
                        todos os cuidados de saúde específicos ao 
                        seu estado em tempo útil e a morrer com dignidade. 
                        A prestação de cuidados continuados e a 
                        informação dos serviços de saúde 
                        existentes e suas competências é também 
                        um direito a cumprir. Inclusivamente, o doente deve ser 
                        informado sobre os elementos de diagnóstico e terapêutica. 
                         
                        A informação sobre a situação 
                        do seu estado de saúde e o obter uma segunda opinião 
                        a este respeito figuram também como direitos do 
                        doente. Como parceiro no processo de saúde, o doente 
                        pode dar ou recusar o seu consentimento, antes de qualquer 
                        acto médico ou participação em investigação 
                        ou ensino clínico. Trata-se aqui de respeitar a 
                        vontade do doente com base no princípio da autonomia. 
                         
                        O direito à confidencialidade de toda a informação 
                        clínica engloba o respeito total do doente como 
                        pessoa. Estes dados só podem ser comunicados ao 
                        doente. Daí que todos os profissionais de saúde 
                        – e não apenas os médicos – 
                        sejam obrigados ao segredo profissional, sob pena de procedimento 
                        disciplinar ou legal. Quem falha este segredo, comete 
                        uma falta ética. 
                        A privacidade de qualquer acto médico deriva do 
                        respeito pela dignidade humana do doente. Assim só 
                        podem assistir aos actos de diagnóstico ou de tratamento 
                        os profissionais necessários. E não pode 
                        haver comentários nem interrogatórios sobre 
                        vida privada e íntima a não ser que sejam 
                        importantes para o diagnóstico, evolução 
                        e tratamento da doença. 
                        Aos direitos correspondem deveres que o doente tem a respeitar: 
                        zelar pela própria saúde, fornecer as informações 
                        necessárias, ter em conta os direitos dos outros 
                        doentes, colaborar com os profissionais de saúde, 
                        evitar gastos desnecessários, utilizando bem os 
                        serviços hospitalares. 
                        O respeito pelos direitos dos doentes e cumprimento os 
                        seus deveres constituem elementos de base para que as 
                        unidades de saúde respirem humanização. 
                        Os hospitais e os centros de saúde podem ser grandiosos 
                        edifícios apetrechados com técnicas de ponta. 
                        Mas são os médicos e profissionais de saúde 
                        que lhes dão a alma. 
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