“Em Portugal vi eu já...”
60ª Produção do Teatro das Beiras
fortemente aplaudida pelo público

Do universo da vida social, ao universo da vida religiosa, «Em Portugal eu vi já…» é uma peça composta por excertos de sete textos de Gil Vicente onde a sociedade de outrora e de hoje são alegoricamente satirizadas.

Por Rosália Rodrigues e Sérgio Santarém

A peça em exibição no GICC é apresentada ao ar livre

“Em Portugal vi eu já…”, verso que inicia a obra “Triunfo do Inverno” foi o nome escolhido pelo encenador Gil Salgueiro Nave para o mais recente espectáculo estreado no dia 1 de Julho no auditório ao ar livre do Teatro das Beiras, e que faz as honras da sexagésima produção desta companhia. No palco encontram-se os actores António Saraiva, Flávio Hamilton, Pedro Fiúza, Sofia Bernardo e Sofia Valadas, que dão vida a 25 personagens de excertos das obras vicentinas o Auto da Festa, Juiz da Beira, Velho da Horta, Barca do Purgatório, Triunfo do Inferno, Floresta d´Enganos e Breve Sumário da História de Deus.
É uma peça muito rica, não tivesse ela origem em textos de Gil Vicente, “pai do teatro português” que conta com uma vasta galeria de personagens-tipo que caracterizam a sociedade medieval portuguesa, mas que se adapta facilmente aos dias de hoje. Traça quadros populares de intensidade moral, religiosa, simbólica ou quotidiana que oscilam entre o drama, a tragédia e a comédia. Este autor tornou-se intemporal não só por ter sido o pioneiro na dramaturgia portuguesa, mas também porque os vícios da sociedade das primeiras décadas do séc. XVI que outrora criticou, pouco ou nada se alteraram.
Segundo o encenador “herdámos de Gil Vicente um património carregado de sentido crítico, postura ética, de poesia e musicalidades linguísticas”, sendo por isso este dramaturgo um marco importante e fundamental no teatro português e no Teatro das Beiras em particular.
Também no aspecto linguístico as peças vicentinas dispõem de um valor documental imprescindível, pois constituem seguramente uma fonte de informação dos falares do seu tempo. Gil Vicente retirou uma boa parte da sua cultura de livros escritos em castelhano, adoptando por isso esta língua nas peças, que combinou com o português falado na tradição popular.
O público tem aderido ao espectáculo e quem assiste não esconde o contentamento em relação à representação da peça e ao local onde é exibida, tal como afirma Marília Duarte “assistir a uma peça de teatro ao ar livre e ainda por cima tão divertida, são dois prazeres que se complementam e que tornam esta vinda ao teatro tão especial”.
Fernando Sena, director de produção da companhia, mostra-se satisfeito com a deslocação dos espectadores ao teatro, no entanto, afirma que “o público português não tem o hábito cultural de ir ao teatro, e o mais preocupante é que os jovens, sobretudo os universitários são os que menos assistem a representações teatrais. Tal facto, revela um espírito muito tecnocrata e pouco cultural por parte da sociedade em geral, o que se torna prejudicial para o futuro do país.”
De resto, o Teatro das Beiras tem contribuído para a divulgação da cultura na região e comparticipa activamente na produção artística nacional. No entanto, o caminho percorrido pela companhia só foi conseguido graças a uma forte “coesão e esforço por parte de todos” nas palavras de Fernando Sena.
«Em Portugal vi eu já…» vai continuar em cena na Covilhã até ao dia 22 deste mês, de terça-feira a sábado às 21h30, no dia 29 pelas 21h30 estará no Centro Cultural Raiano de Idanha-a-Nova e no dia 31 às 22h00 na Barroca do Zêzere, na Semana Cultural das Terras do Xisto. Assistir à peça é uma óptima sugestão para quem quer passar um serão diferente e agradável.