José Geraldes

Portugal, o pessimismo e o Intercidades


1. Que se passa com os portugueses? Marcados historicamente pela saudade, vivem entre a euforia dos grandes acontecimentos e a depressão dos momentos que não correm bem.
Tendo mais alma de poetas, falta-lhes a audácia e o engenho para vencer as grandes crises. Mas na época de 500 os portugueses fizeram história com os descobrimentos inaugurando com cinco séculos de antecedência a era da globalização.
Actualmente revelam-se amorfos incapazes de reagir petrificando-se num comodismo perigoso que pode resvalar para a decadência. Parece que é uma sina que nos persegue. E da qual não se sabe como sair.
Já o poeta Alexandre O'Neill, num poema célebre escrito no século XX, descrevia o Portugal de hoje : “Ó Portugal, se fosses só três sílabas, / linda vista para o mar,/ Minho verde, Algarve de cal,/ surdo e miudinho,/ (…) se fosses só o sal, o sol, o sul,/ o ladino pardal,/ (…) se fosses só a cegarrega do estio, dos estilos,/ o ferrugento cão asmático das praias,/ o grilo engaiolado, a grila no lábio,/ o calendário na parede, o emblema na lapela, / ó Portugal. Se fosses três sílabas/ de plástico, que era mais barato!/ Portugal: questão que tenho comigo mesmo,/ feira cabisbaixa,/ meu remorso,/ meu remorso de todos nós…”
O poema retoma actualidade com os resultados de um estudo recente que diz a maioria dos portugueses não se interessar pelos País declarando-se infeliz e pessimista quanto ao futuro. Mais grave é a verificação de 85 por cento da população portuguesa não estar “envolvida” com o País.
A TNS Portugal que levou a cabo o estudo, em comentário, afirma que, “se Portugal fosse uma marca e se nada fosse feito, estaríamos em risco de desaparecer”.
O curioso é que para os portugueses residentes fora, Portugal é muito atractivo. Há um problema que nós portugueses temos de resolver connosco próprios. E quanto mais depressa melhor. O doente não se cura a lamentar-se do seu estado. É preciso reagir.
Muitos factores não ajudam à visão optimista de Portugal. O desemprego a aumentar, a situação económica a piorar, a taxa de abandono escolar a crescer, a produtividade em queda acelerada, o mau exemplo de políticos que, em vez de servir o País, se servem a eles próprios, a imagem negativa dos deputados, a falta de elites, a demissão de líderes das suas responsabilidades, uma prática de sindicalismo que já passou à história e uma educação que é um sorvedouro de dinheiros sem se verem melhorias a curto prazo.
Mau grado a situação presente, não podemos nem nos devemos resignar. E só com a colaboração colectiva se sai do impasse em que estamos. O “medo de existir” que dá o título ao badalado livro de José Gil, tem de ser banido da mentalidade dos portugueses.
Portugal tem que deixar de ser o “remorso de todos nós”. A um país com oito séculos de história compete dar um safanão no presente para se aventurar nos caminhos do futuro.
2. A manchete do NC sobre o fim do comboio Intercidades provocou uma onda de indignação de toda a Beira Interior. Como é concebível que se pense em acabar com o Intercidades?
Dizemos se pense porque a resposta vinda da CP questionada pelo nosso jornal se revela seca e nada afirmativa. Responder apenas que os comboios se mantêm, depois de as notícias que vieram a público, sabe a muito pouco. E não nos tranquiliza. Mas também gritaremos até que a voz nos doa. E lutaremos com todas as nossas forças.
Querem fechar as maternidades, agora tiram os comboios e qualquer dia tiram-nos a todos daqui, transformando a Beira Interior num deserto.
Que decisores temos na CP? Esses senhores refastelados nas suas poltronas e gabinetes alcatifados com ordenados chorudos pagos com os nossos impostos, sabem o que é viver no Interior?
O Intercidades veio para ficar. E é um serviço estruturante para a Beira Interior.