Urbi@Orbi – Como surge a ideia de criar este espaço?
António Rebordão – Em Dezembro de 2008 o presidente da câmara ouviu a minha ideia e pediu-me para fazer um plano para lhe apresentar. Fiz um plano para a criação de espaços para a ocupação dos tempos livres. O presidente da câmara quando viu a proposta disse-me logo que era uma óptima ideia e começamos a sinalizar algumas fábricas fechadas, abandonadas que fosse possível recuperar para a criação deste projecto.
Quando estávamos a analisar algumas o senhor presidente lembrou-se de um espaço importante, o Mercado Popular, que foi há 25 anos um espaço vocacionado para o artesanato mas que não resultou e que está abandonado. Assim, viemos imediatamente ver o espaço, e eu fiquei logo encantado com isto e comecei logo a imaginar o que podia fazer grandes coisas, apesar de estar completamente degradado.
Depois de fazer o protocolo, em Fevereiro de 2009 arranquei com isto completamente sozinho. E com companhia da dona Alice Garcia, de 75 anos, que me acompanhou desde o início, que nunca me abandonou e muito deste espaço se deve a ela.
Arrancamos com isto, recuperar, e reconstruir. E em ano de crise o financiamento da câmara era apenas de 25 mil euros. Tive que meter mãos a obra e andar de terra em terra à procura de material em segunda mão que posteriormente a minhas oficinas restauraram. As secretárias foram oferecidas. Em Junho quando vi que estava a ocupar todas as lojas disponíveis, inclusive a capela, mandei chamar o senhor presidente e o espanto dele foi enorme quando aqui chegou e viu o que já tínhamos conseguido. Foi assim que consegui fazer o que neste momento todos podem ver.
Urbi@Orbi – E como gere o financiamento que lhe é disponibilizado?
António Rebordão – A partir do momento que tenho orçamento como tenho, os meus dinheiros são gastos naquilo que são despesas correntes e ao mesmo tempo na acção social. E foi aí que eu comecei imediatamente com uma equipa de duas pessoas que começaram a ir a casa dos carenciados a desenvolver um trabalho de colaboração com as pessoas com dificuldades (…) Aquilo que os lares ou os centros de dia, e até os serviços domiciliários não fazem, desde a limpeza de casa, higiene, acompanhamento, ensina-los a ler, a ir às compras (...) todo o trabalho que é bom para o idoso, nós estamos a fazer isso.
Urbi@Orbi – Quais são os serviços disponíveis actualmente no “Espaço das Idades”?
António Rebordão – Há serralharia, há carpintaria, cabeleireiro, terapeuta da fala, electricista, engomadoria, música, reprografia, espaços de convívio, um bar, assistente social, olaria, fisioterapeuta, psicólogo, jurista e dentista, entre outras ofertas, num total de 58 lojas abertas.
Urbi@Orbi – Onde é que os maiores de 65 anos e com cartão social municipal, ou seja os frequentadores deste espaço, mostram mais entusiasmo?
António Rebordão – Nas aulas de Informática. Tivemos que transferir a sala de informática para uma sala maior pois a procura foi muita. Temos quatro turnos. A alegria deles é enorme, estão entusiasmados em aprender, são eles que chegam a casa e ligam o computador e felizes com a sua autonomia, pois já podem falar com os familiares que estão distantes.
Urbi@Orbi – Que tipo de descontos oferecem aos idosos portadores do cartão social? E aos idosos que não têm o cartão também fazem descontos?
António Rebordão – Todos os frequentadores do espaço beneficiam de um desconto de 30 por cento do preço praticado no mercado, nomeadamente o médico dentista, o psicólogo, oftalmologista, e fisioterapia. O posto de socorro permite a realização de medições de tensão, glicemia, colesterol sem custos mas mediante marcação. Na jurista as consultas são gratuitas (…)
Urbi@Orbi – E as lojas têm tido adesão satisfatória? As lojas ligadas à saúde conseguem atrair os idosos devido ao seu baixo custo?
António Rebordão – Só no dentista temos mais de 170 marcações, o salão de cabeleireiro à sexta-feira tem uma fila interminável, o oculista igualmente, e por aí em diante.
Urbi@Orbi – Quais são os novos desafios para tornar este espaço ainda mais próximo das dificuldades dos idosos?
António Rebordão – O novo desafio agora é conseguir os aparelhos auditivos a preço de referência, com garantia de três anos, com garantia de adaptação de seis meses e com a possibilidade de pagar em 24 meses. E também o seguro de saúde após os 60 anos, uma proposta muito aliciante da AXA, que oferece cinco consultas de especialidade por ano, um check up, e desconto nos internamentos, pela quantia de 200 euros, para aqueles que não podem pagar mais.
Urbi@Orbi – É fundamental a colaboração da assistente social neste meio?
António Rebordão – A nossa assistente social é de extrema importância pois já conseguimos recuperar dois casos, onde os idosos já só desejavam a morte, pois a pensão que recebia era de pouco mais de 200 euros e os medicamentos de que necessitavam excediam em muito esse valor. Quando veio cá conhecer isto, quando chegou e conheceu a sala dos bordados e da costura começou a chorar, pois em tempos tinha sido a sua grande paixão. Mas hoje é uma excelente carpinteira, e desde esse dia que não falta um dia. E nas festas que fazemos, fala do seu caso publicamente e diz mesmo que deve a vida à nossa persistência.
Urbi@Orbi – E a divulgação do Espaço das Idades tem superado as expectativas?
António Rebordão – Recebemos há pouco tempo uma socióloga da união europeia, pois a Covilhã foi escolhida para integrar o programa “Together for Health” e a senhora disse mesmo que nunca viu nada igual. Já nos mandou imensas mensagens a felicitar-nos e já se dispôs a trazer cá pessoas para conhecer o espaço.
Urbi@Orbi – E já participou em alguma conferência ligada ao idoso e à acção social?
António Rebordão – Já fui convidado para dar inúmeras conferências, a mais recente em Viseu, num congresso de médicos, e todos ficaram entusiasmados quando lhes expliquei o projecto. O ideal era haver mais espaços destes por todo o País, pois é atrás da solidão vêem as doenças todas.
Urbi@Orbi – O sucesso deste espaço é conhecido nesta região. É verdade que outros presidentes de junta queriam um dia por mês aqui para os idosos?
António Rebordão – Estou a ser procurado por outras freguesias mas é impensável dar um dia a cada freguesia da Covilhã, uma vez que o mês tem 31 dias ficava sem espaço para mais.
Urbi@Orbi – Acabou com o Cabaz de Natal, porquê?
António Rebordão – Na altura do Natal, uma época de festa, as famílias carenciadas recebiam um cabaz cheio de coisas de que não precisavam. Agora através de uma parceria que fiz com o Intermaché, as famílias recebem um cheque para comprar tudo que necessitam, pois uma garrafa de vinho do porto, para quem está a passar por dificuldades, para que serve?! Já me aconteceu do engenheiro do Intermaché me ligar a dizer que uma família queria gastar os 40 euros do cheque em pão. Porquê? Porque diziam eles que se tivessem pão para comer e dar aos filhos já era bom.
Urbi@Orbi – E projectos falhados existem?
António Rebordão – Há pouco tempo a Sic Solidária teve uma iniciativa extraordinária com parceria do Café Delta, e vieram perguntar-me o me faltava aqui para o espaço. Ora o que falta é uma carrinha para transportar os utentes. Mandei-lhes o orçamento no mesmo dia, mas quando os envolvidos foram fazer cumprir lei, infelizmente esbarramos sempre na lei pois não somos IPSS, não puderam aceitar a nossa candidatura. Não há nenhuma IPSS que abranja 16 mil pessoas, mas a lei existe e é para se cumprir.
“Covilhã SOS será um serviço para idosos, durante as 24 horas do dia”
“Uma forma de combater a solidão”