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Um Tribunal que Governa o País e a Falácia do Princípio da Confiança
Tiago Sequeira · quarta, 25 de dezembro de 2013 · UBI
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21953 visitas Fomos na passada quinta-feira, 19, confrontados com mais uma decisão do Tribunal Constitucional, a declaração de inconstitucionalidade da medida de convergência das pensões dos pensionistas do Estado, que mais não era do que um corte de 10% neste tipo de remunerações. O Tribunal declarou mais uma vez inconstitucional uma medida de consolidação da despesa, necessária para o re-equilíbrio das contas públicas no âmbito de um processo de ajustamento a que Portugal está sujeito para evitar que seja declarado insolvente, isto é, incapaz de pagar as suas contas. A redução da despesa pública é um desiderado Nacional, não só devido ao programa de ajustamento (resgate) que o País assinou com os seus credores mas também porque ela é a garantia que este se torna capaz de honrar os seus compromissos futuros. A redução da despesa pública é não só necessária para a sustentabilidade e competitividade do país no curto e médio prazos mas é essencialmente uma obrigação intergeracional de quem hoje tem responsabilidades em Portugal. Nenhuma familia, empresa ou país sobrevive acumulando dívida durante décadas, como aconteceu na nossa história recente. Até considero que a medida da convergência das pensões poderia ser modelada de forma a que o princípio da proporcionalidade fosse mais respeitado ou que fosse feita uma demonstração clara de que o corte no regime das pensões públicas aproximava toda a distribuição daquela que se verifica nas pensões privadas em pagamento. Na verdade a combinação desta medida com a contribuição especial de solidariedade garantiria que, de alguma forma, as pensões mais elevadas, a partir de um dado limite minimo, tivessem um corte progressivo. Não consigo no entanto perceber que, face à situação de emergência do país e essencialmente à aproximação do fecho do programa de ajustamento, o Tribunal possa ter usado o princípio da garantia da confiança como argumento, quando em situações similares, o não fez. Há vários exemplos de que, em situações de excepção, o Tribunal Constitucional, com este ou outros colectivos de juízes, declarou constitucionais (ou nem sequer analisou) medidas que parecem violar o mesmo princípio. Quando um funcionário é contratado em funções públicas tem expectativas legítimas de não ver o seu vencimento mensal cortado sucessivamente (situação que hoje se aplica a funcionários em plenas funções e em mobilidade) e, em Portugal, essa medida já foi, em 2010, declarada constitucional. No limite, este princípio poderia ter sido alegado em Portugal, entre 1977 e 1983, quando o governo e o FMI decidiram desvalorizar o Escudo em mais de 21% em 77-78 e em mais de 23% em 82-83 (percentagens que não incluiem a política de desvalorização sucessiva designada tecnicamente por crawling-peg). Não teriam nesse tempo os Portugueses expectativas legítimas de que os preços não aumentariam muito e de não terem que pagar os bens importados cada vez mais caros e inacessiveis? A única diferença entre as medidas já declaradas constitucionais e esta é a definição contributiva da segurança social, i.e., os agora pensionistas descontaram sob uma perspectiva de obterem uma determinada pensão no futuro, que agora auferem. Admitamos que todas as pensões do sistema público têm por base um sistema contributivo e proporcional, o que não é exacto. A excepção mais evidente é a do sistema de pensões dos próprios juízes do Tribunal Constitucional! Ainda assim, como conciliam os juizes a garantia que hoje dão aos pensionistas actuais com a mais que provável falência do sistema contributivo, face à nova realidade demográfica e portanto à incapacidade do sistema de pagar pensões futuras? Não estará o Tribunal a colocar em causa que futuros coletivos do mesmo Tribunal consigam aplicar o principio da Garantia? Mesmo que procurando fazer o seu trabalho, e não isentando o Governo de responsabilidades na modulação das iniciativas legislativas, na prática, o Tribunal Constitucional tem sido um entrave efectivo à prossecução com sucesso do programa de ajustamento financeiro a que Portugal se sujeitou. Ao tomar decisões, o Tribunal Constitucional pondera de forma que não pode deixar de ser considerada subjectiva, embora fundamentada, os diferentes princípios constitucionais, atribuindo maior peso a uns que a outros e ao que estas decisões deixam antever, o Tribunal tem optado por ponderar decisivamente os princípios que tendem a estabelecer garantias para os direitos já adquiridos em deterimento de outros principios, que garantam a solvabilidade do Estado e a garantia de uma vida com direitos sociais e de independência económica para as gerações vindouras. Fica aliás a sensação que com este colectivo de Juízes e esta Constituição nenhum outro pais europeu poderia ter feito as reformas que já executou nas suas finanças públicas e nos seus mercados de trabalho. Através do chumbo sucessivo de medidas de diminuição da despesa pública o Tribunal Constitucional tem sido, em grande medida, responsável pelo facto do ajustamento Português se fazer, ao contrário do que seria desejável, pelo lado dos impostos. Não sabe o colectivo de juizes que um imposto (muito mais um imposto inesperado) é um tipo de expropriação de rendimento privado? Não será também o nivel de impostos actuais, em Portugal, inconstitucional? * O autor deste texto escreve sem as modificações do novo acordo ortográfico.
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