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"A vida é feita de ciclos" e os lanifícios também
Inês Santos e Inês Tomé e Bruna Duarte e David Garcia Fernandes · quarta, 23 de fevereiro de 2022 · Região Durante décadas, a cidade da Covilhã foi conhecida como a "Manchester portuguesa", devido ao elevado número de fábricas têxteis. Fomos ouvir a população com um passado ligado aos lanifícios, como as pessoas recordam os dias gloriosos do setor e o que pensam do estado em que se encontra atualmente. |
Maria Ferrão entrou para uma fábrica aos 13 anos, hoje é comerciante de artesanato |
21992 visitas “A vida é feita de ciclos”, composta por “inícios, meios e fins”, diz Maria Ferrão emocionada, enquanto faz um porta-chaves à mão, na sua loja de artigos artesanais na rua Ruy Faleiro, uma das principais artérias da Covilhã. A máxima aplica-se ao trabalho na indústria de lanifícios, onde Maria começou precocemente, com 13 anos de idade, mas que depois começou a perder peso na economia local e culminou no fecho de grande parte das fábricas. A decadência, na perceção de Maria, deveu-se ao aparecimento de “novas tecnologias e de produtos chineses no mercado”. Hoje, o trabalho nos lanifícios faz parte da sua memória, que recupera na tarde fria, atrás do seu balcão de lojista. Também António Júlio Pinheiro, atualmente funcionário numa das queijarias mais movimentadas da cidade, trabalhou durante 40 anos nos lanifícios, onde foi chefe de armazém de uma unidade fabril. Para ele, “trabalhar nos lanifícios era, no fundo, um trabalho como outro qualquer”, mas não deixa de recordar com saudade os tempos em que grande parte da população covilhanense trabalhava nas fábricas laneiras. “Antigamente, a Covilhã vivia praticamente da indústria têxtil”, recorda. Ao longo do século XX, a cidade serrana mereceu o epíteto de “Manchester portuguesa” devido à concentração de fábricas e trabalhadores do setor da lã. Em 1930 a Beira Interior reunia 29% do total de empresas têxteis do país, com a Covilhã a concentrar 96 por cento dos operários do distrito. Em 1940, 60% da produção têxtil nacional saía das fábricas covilhanenses e em 1945 as 140 empresas de lanifícios da cidade empregavam mais de 6 mil operários. Os milhares de postos nos milhares nos lanifícios começaram a declinar com a crise dos anos de 1970 e a situação agravou-se no decénio seguinte, marcado pelo encerramento de unidades fabris. Nuno Dias, outro antigo trabalhador que deixou os lanifícios “há mais de duas décadas” e atual funcionário de uma charcutaria tradicional em pleno centro da cidade, também aponta a diferença entre o tempo em que o setor “dava emprego a muita gente” e os dias de hoje, em que “há três grandes empresas com cerca de 300 ou 400 trabalhadores”. Uma explicação para a pouca empregabilidade no setor poderá ser a baixa remuneração, considera Nuno Dias. No meio das tarefas da queijaria, António Júlio também está ciente que o setor laneiro já não dá tanto emprego nem comanda a vida económica da Covilhã, mas não acha tudo negativo. Modernizou-se muito”, afirma. “Hoje até se podem produzir os mesmos metros, mas com um terço dos trabalhadores.” “As empresas modernizaram-se e algumas tinham estofo para tal. As que não tinham, foram de certa maneira engolidas e ficaram para trás, pois não possuíam capacidade de concorrência com o estrangeiro”, relata o ex-chefe de armazém. “A Paulo de Oliveira, que é uma empresa familiar, por essa mesma razão tem demonstrado grande estabilidade ao longo dos tempos e agora também já faz exportações para o estrangeiro”. Atualmente, o setor tem cerca de 40 unidades instaladas no país e emprega cerca de 3 mil pessoas, representando um volume de negócios de 200 milhões de euros e exportando para todo o mundo 85% da sua produção, segundo a Associação Nacional dos Industriais de Lanifícios, sediada na Covilhã. Embora em número reduzido, as empresas do concelho continuam entre as principais do setor, com destaque para a Paulo de Oliveira, A Penteadora, Tessimax, Fitecom, Benoli e Brimtextil, de acordo com o site do município. |
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