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Os dois lados da linha
Eduardo Alves · quarta, 23 de novembro de 2011 · Região A substituição dos comboios por automotoras, na Linha da Beira Baixa, continua a dar que falar. O Urbi ouviu dois docentes da academia, especialistas em redes de transportes e em ferrovias. Ideias que pretendem acrescentar argumentos a esta temática. |
O serviço "Intercidades" passou a ser feito através de automotoras |
21955 visitas Os utentes do serviço “Intercidades” da CP ainda não estão totalmente habituados às novas composições. Desde o início do mês que as composições de carruagens e máquina deixaram de circular sobre os carris e os passageiros fazem agora a viagem de ligação à capital numa automotora. |
Comentários:
Comentários: Concordo plenamente com a opinião do grande especialista em planeamento de transportes, e meu estimado colega e querido amigo, Prof. Reis Silva, sobre a ferrovia. Contrariamente ao que sucede em muitos países, europeus e não só, onde os investimentos no transporte ferroviário têm vindo a sofrer um incremento cada vez mais significativo, em Portugal este tipo de transporte, seja de passageiros ou de mercadorias, tem sido continuamente ostracizado, tendo-se optado por uma estratégia(?) contra-corrente reduzindo os investimentos e o desenvolvimento da ferrovia e apostando em auto-estradas, muitas delas sem qualquer interesse económico somos dos primeiros países da Europa em kms de auto-estrada por 100 mil habitantes, e dos últimos em kms de ferrovia, o que é espantoso. Não tenhamos dúvidas que a ferrovia representa um sector estratégico, bastando para isso enumerarem-se algumas das suas notáveis vantagens: o espaço necessário para o traçado de uma linha, mesmo de via dupla, é inferior a duas das faixas de uma auto-estrada; o custo por quilómetro é igualmente bastante inferior à das auto-estradas; é um sistema de transporte amigo do ambiente; as velocidades médias praticadas são muito superiores às da rodovia; a reacção (desgaste) do material circulante sobre os carris é muitíssimo inferior à que se transmite ao asfalto; é um transporte muito menos sensível às variações climatéricas; permite transportar um número elevado de passageiros e uma grande densidade de carga por comboio; os consumos de energia são significativamente inferiores aos da rodovia; os custos de manutenção e de exploração do material circulante são mais reduzidos; a segurança de bens materiais e de passageiros é notável, sendo o meio de transporte mais seguro a par do avião; para a mesma oferta de transporte, os investimentos relativos à aquisição de material circulante são inferiores aos exigidos para o material rodoviário; o ciclo de vida e a robustez do material circulante são muitíssimo superiores aos do material rodoviário; a sua fiabilidade e disponibilidade operacional são igualmente muito mais elevadas. Efectuando a comparação entre o TGV Duplex francês (veículos com dois andares) e uma lotação de 600 passageiros, enquanto que o consumo energético equivalente do comboio é de 1,5 litros de combustível por cada 100 km, o do automóvel situa-se entre 6 e 15 litros. Por outro lado, o transporte ferroviário de 600 passageiros corresponde à utilização de 400 automóveis, com uma ocupação média de 1,5 pessoas por unidade (fonte: CP). Veja-se também o caso paradigmático dos Estados Unidos da América, onde a tracção ferroviária é quase exclusivamente diesel-eléctrica. A ferrovia assegura, de costa a costa e em todo o restante território, cerca de 50 % do transporte de mercadorias, assumindo uma enorme beleza a visão, como se de enormes cobras artificiais se tratassem, das grandes composições de carga por vezes de 20 mil toneladas, com a tracção assegurada por 8 gigantescas locomotivas em comando múltiplo 3 em cada extremidade do comboio e as restantes duas a meio. Tudo isto apenas com um único maquinista. Cumpre-nos colocar a seguinte questão: quantos camiões TIR e quantos motoristas seriam necessários para assegurarem uma capacidade de transporte equivalente? Outros exemplos interessantes consistem no tráfego de mercadorias no centro da Europa, envolvendo a Alemanha, Suíça, França e Itália, assim como o transporte de minério de ferro entre as minas suecas de Kiruna e o porto norueguês de Narvik. A Suíça, que sempre foi detentora de uma indústria ferroviária de ponta a nível mundial, em 1972 pôs em circulação as locomotivas (eléctricas) mais potentes de sempre, a Re6/6, com 6 motores e uns impressionantes 10 mil cavalos (7350 kW), para o transporte de passageiros a 140 km/h assim como para o reboque de comboios pesados de mercadorias de 800 ton a 80 km/h no dificílimo traçado alpino de S. Gotardo, com gradientes de 37 por mil. Por sua vez, a igualmente desenvolvida indústria ferroviária sueca, construiu em 1960 as locomotivas (também eléctricas e para o mesmo sistema de corrente que as suíças, 15 kV e 16 2/3 Hz), para o transporte de minério a 75 km/h, que detêm o recorde de força, as Dm3, com 6 motores e que desenvolvem um fantástico esforço de tracção de 93,2 toneladas. Carlos Cabrita Por: cabrita@ubi.pt em: quarta, 23 de novembro de 2011
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