" Tinha acabado de explicar
a nossa amizade como uma espécie de amor. O mesmo que
sentira pelo meu pai, um amor perfeito, que não precisava
de manifestações emotivas nem de qualquer compromisso
forçado. Ouvir Smallgods negar a existência do amor
era como dizerem-me que alguém tinha morrido. Ainda não
lhe tinha contado que tinha enlouquecido no Verão. Enquanto
ele estivera longe, tivera a certeza de que iria compreender.
Agora, na sua presença, já não estava tão
certo".
Até há pouco tempo,
de Frank Ronan tinha apenas a noção que era um
jovem irlandês, escritor de culto. Seguidamente li "
Os Homens que amaram Evelyn Cotton" e "Lovely",
dois dos seus livros que com maior pertinência exploram
a complexidade das relações amorosas.
Já em "O Melhor Anjo", o livro que aqui se pretende
apresentar, Ronan reflecte sobre um outro tipo de emoções,
aquelas que cercam a amizade. O autor escreve sobre este tema,
acreditando que a amizade deve subsistir num estado de completo
desinteresse por outras motivações que não
ela própria, isto é, livre do desejo, livre dos
interesses materiais e intelectuais, livre da hipocrisia.
Frank Ronan apresenta-nos as vidas de John Moore e de Godfrey
(Smallgods) Temple, que se conhecem no seu último ano
de ensino secundário e que estabelecem entre si uma ligação
que será acompanhada num espaço de três anos.
Este é um período de profundas mudanças
para estes dois jovens, já que se trata da época
de traçar as primeiras escolhas para os seus futuros.
Se John necessitava de um verdadeiro companheiro que o fizesse
desviar das suas fobias relacionadas com a solidão e com
a loucura, Godfrey precisava de um amigo pleno, alguém
que não fizesse caso da sua arrogância e que não
se inibisse com a sua postura citadina, que contrastava com os
mais rígidos padrões rurais. A cumplicidade que
se estabelece entre eles, é o tema central do livro, que
demostra ainda a importância que esta terá nas suas
vidas e na vida das suas famílias e companheiras. Todavia,
a narrativa não se esgota na amizade dos jovens, pelo
que nos é apresentado um retrato social e humano das várias
personagens que fazem parte das vidas de John e Godfrey.
Pelo meio há ainda espaço para reflectir sobre
outras questões, tais como a miséria material vs
riqueza intelectual (representados na figura de Smallgods) ou
sobre os vários tipos de abuso, sejam eles o incesto ou
o abuso por parte daqueles que se encontram investidos de um
determinado poder ou função.
E numa última análise, poderíamos afirmar
ainda que este é um livro em que as maiores revelações
são feitas sem quase darmos por elas e em que os dados
que julgávamos ter por adquiridos, são postos a
nu sob uma perspectiva completamente nova. |